Atividade física e propósito: caminhos que se cruzam
A Vida Simples conversou com pessoas que tiveram um ponto de virada em suas vidas a partir da prática da atividade física. Entrar em movimento pode contribuir positivamente para mudanças na rotina, no trabalho e na própria forma de enxergar e viver no mundo.
É costume que a gente ouça sobre a importância da prática de um exercício físico regularmente. Os benefícios apontados não são poucos. Vão desde a melhora do condicionamento físico, passando pelos impactos positivos na saúde mental e na prevenção de doenças como diabetes e hipertensão, comuns na vida dos brasileiros.
Assim, estar em contato com um esporte ou atividade física regular nos traz bons resultados – físicos e psicológicos – e também nos conecta com o mundo e com a gente mesmo. Isso acaba se tornando um caminho para alinhar seus objetivos ao seu planejamento do cotidiano.
Apesar das vantagens, 47% dos brasileiros são sedentários, e esse número cresce na faixa etária mais jovem, pois apenas 16% das pessoas nesse grupo praticam algum tipo de exercício.
Se você está nesse grupo – assim como eu, admito (faz três meses que não pratico atividade física regularmente) – te convido a conhecer e a se inspirar em histórias de pessoas que tiveram suas vidas transformadas pelo esporte.
Que tal “virar a chave” e sair daqui com os planos para 2023?
O corpo no mundo
Conviver com excesso de peso é a realidade de muitas pessoas e não é sinônimo de doença. De fato, é uma situação que precisa ser interpretada da forma mais saudável e empática possível, até porque não queremos nos entregar ao que diz a chamada “ditadura da beleza” e, incansavelmente, corrermos em busca de um corpo perfeito.
Além disso, nosso corpo é um organismo vivo que é perpassado pelas emoções, sentimentos, épocas do ano e momentos da nossa vida. Naturalmente ele irá engordar ou emagrecer, e isso vai alterar a qualidade da pele, dar sinais de que algo não está tão bom assim em nossa saúde ou o contrário, mostrar que estamos saudáveis e a plenos vapores.
E foi em um desses momentos que Nalva Martinz, uma corredora de 59 anos, percebeu que chegou em uma linha decisiva. Ou enfrentava sua situação da maneira que precisava ou ali seria o fim da linha. Moradora da cidade de Natal, Nalva chegou a pesar quase 130kg, o que a levou a ter dores nas articulações, inchaços, dificuldade de locomoção, mas também muitas questões psicológicas, como o desânimo, a insatisfação com aquele quadro de saúde e a desesperança.
Determinada, Nalva decidiu procurar um médico e buscar caminhos possíveis para chegar a um peso saudável para as suas condições físicas e que a possibilitasse viver com melhor qualidade de vida. Mas não foi tão simples assim. “Eu iniciei na atividade física pela dor, porque quando você começa pelo amor é diferente”, conta. Isso porque foi muito difícil todo o início, que primeiro ocorreu nas aulas de hidroginástica durante três meses, momento em que Nalva perdeu seus primeiros 10kg, e foi avançando em outras atividades, como a corrida e exercícios na praia.
“Chegou uma hora que eu nem pensava em emagrecer. Quando eu perdi 40kg eu passei a pensar ‘não, agora eu quero saúde’”, explicou durante a entrevista. Não deu outra, incentivada pelo filho, Nalva passou a participar de eventos de corrida na cidade, como a Meia Maratona do Sol, um dos percursos mais conhecidos de Natal que atrai corredores de todo o país.
A partir daí, enxergou a prática da atividade física não apenas como uma necessidade ou obrigação, mas algo que havia se apaixonado e trazido para a sua vida de forma a não mais colocar em segundo plano.
Com perfil de líder, como ela mesma se descreve, Nalva foi influenciando outras pessoas e montando um grupo para praticar exercícios físicos na praia, que acabou se desfazendo por causa da pandemia, embora a corredora tenha encontrado outras formas de estimular os amigos.
“Tudo isso que eu faço é para motivar as pessoas”, explica Nalva, que utiliza o Instagram e Tik Tok para compartilhar sua rotina, exercícios físicos e convidar as pessoas que a seguem a fazerem o mesmo. E dicas não faltam para isso. A natalense convida a todos para irem até à praia, mas se na sua cidade não tem, que tal frequentar a academia, fazer pequenas caminhadas, ir a um parque, praças ou academias públicas?
https://www.instagram.com/p/ChDoeiOLycW/
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Corrida como meditação
Enquanto algumas pessoas procuram meditar e relaxar a mente em um quarto com pouca luz, um tapete no chão e alguns aromas, outros fazem isso… correndo! É o que Hugo Amano conta ao entrevistá-lo. O corredor de 44 anos encontrou a corrida assim como a maioria das coisas que acontecem na nossa vida, nos acasos entre as diversas vivências que acontecem e se cruzam.
Hugo sempre praticou exercícios desde quando ainda era criança. “Na minha infância fui muito ligado ao esporte, então desde pequeno fiz judô e o futebol esteve presente desde sempre”, conta. Mas, durante a faculdade, em uma das partidas com os amigos, o paulista machucou o joelho e precisou ficar afastado durante três meses, período que se dedicou à recuperação e às sessões de fisioterapia. No entanto, voltar para algo em que você ficou sem praticar, mesmo que por pouco tempo, não é fácil, “o fato de você ficar parado três meses, eu fiquei muito pra trás, fisicamente“, relembra.
E para retomar o condicionamento físico e se equiparar aos amigos, Hugo passou a praticar corrida no Parque da Aclimação, zona sul de São Paulo, mas o início não foi, digamos, tão fácil. “Nas primeiras vezes que eu fui ao parque mal conseguia completar uma volta, era um sacrifício“, explica. Ainda assim, Hugo persistiu, passou a treinar com maior disciplina, encontrou uma assessoria esportiva que o desse suporte durante os treinamentos e não cansou de se dedicar à corrida.
Em 2001, o corredor chegou a participar de algumas competições, sendo que a sua primeira foi encontrada de forma aleatória, em uma época em que ainda não havia celulares tão modernos. “Eu vi o cartaz colado no poste, a inscrição era em papel e formulário, e eu fui, aquilo me encantou, aquela linha de chegada, as pessoas, ‘eu quero mais isso para mim’“, conta Hugo. Além disso, ele chegou a competir na São Silvestre e na Meia Maratona do Rio de Janeiro, esta última já no ano de 2002.
Já em 2009, Hugo participou de sua primeira maratona, na cidade de Porto Alegre, embora a motivação para correr nem sempre tenha sido essa. ”
Eu gosto muito de correr por correr, eu não preciso de uma prova pra ter motivação pra treinar”, afirma. A corrida foi então se transformando em um momento precioso do dia, que acabou substituindo o futebol e o levou a conhecer diversos lugares a partir das provas em que se inscrevia.
Em muitas das viagens de trabalho o corredor aproveitou para conciliar com competições, em lugares como Suíça, Holanda, Estados Unidos, Inglaterra e Escócia. E não é só nisso que essas duas áreas da vida de Hugo se encontram. “É curioso que eu comecei lá de baixo, como estagiário, e eu faço um paralelo com a corrida. Então foi um processo de aprendizado, de desenvolvimento, dos dois lados“, explica. “Eu não sei se um ajudou o outro ou qual ajudou o outro, mas os dois se misturam na minha vida“, acrescenta.
Hugo conta que a corrida traz os elementos necessários para que a relação entre a vida pessoal e profissional estejam alinhadas, ou pelo menos traz alguns pontos de discernimento. “Eu tive bastante dificuldades no meio profissional que eu acho que a corrida me trazia o equilíbrio necessário“, explica.
E, por isso, o corredor associa a corrida a uma meditação, um estado de flow (momento em que conseguimos permanecer totalmente imersos em uma tarefa). “Eu nunca quis escutar música, por exemplo, durante a corrida, porque eu acho que isso me atrapalha. A música que funciona para mim é o barulho da passada e da minha respiração”, justifica.
“Eu só continuei a correr porque eu consegui encaixar essas coisas na minha vida, como a corrida poderia me ajudar na higiene mental, a ser mais criativo no trabalho. Acho que tudo isso foi me puxando e fazendo isso até hoje”, afirma Hugo.
Para ele, a corrida lhe dá muitos ensinamentos sobre a vida e os caminhos para alcançar seus objetivos. “Eu acredito que a corrida me deu muito essa noção de que o limite não é aquilo que você estabeleceu, você consegue alcançar resultados melhores se conseguir performar e treinar”, finaliza.
Hugo Amano durante a ASICS Golden Run no Rio de Janeiro, em julho de 2022. Foto: Arquivo pessoal
Vai um crossfit aí?
Edclea Sampaio sempre foi próxima de atividades físicas como o ciclismo, por exemplo, mas nunca conseguiu desenvolver uma rotina ou a disciplina para transformar esses exercícios em um hábito. Depois de ter tentado por algumas vezes, a pandemia acabou por limitar um pouco a rotina dela e das pessoas que frequentavam academias ou até mesmo praticavam esportes ao ar livre.
O período da crise sanitária foi também um momento em que ela mergulhou em questões internas e na insatisfação sobre seu corpo na época, o que a fez recorrer a sessões de terapia, medicamentos e apoio psicológico para lidar com toda a situação. “Eu estava com 89 kg, depressiva, fazendo terapia, tomando medicação, porque eu não estava dentro do meu normal, não me achava bonita, várias coisas que não estavam me deixando bem”, explica.
Mas, foi em uma viagem à praia com as filhas que, depois de idas e vindas no box de crossfit onde treinava, que Edclea decidiu, definitivamente, que montaria uma rotina e passaria a frequentar o ambiente todos os dias.
“Tinha três meses que eu não ia, abri mão, fingia que pedalava, mas não ia“, e toda a motivação surgiu depois de um comentário de incentivo do seu personal em uma foto que publicou no Instagram. “Eu estava sentada em frente à praia e, quando ele fez esse comentário, eu sei que eu simplesmente tinha o número do pix dele e fiz uma transferência para a conta do crossfit dizendo que estava fazendo o pagamento da matrícula e pedindo que ele me incentivasse, me motivasse”, explica Edclea.
Ao longo do tempo, a rotina do crossfit foi se tornando uma atividade cada vez mais prazerosa e trouxe motivação e mudanças na vida de Edclea, tanto é que o seu objetivo não era especialmente uma mudança corporal ou física, mas os benefícios psicológicos que passou a perceber depois que iniciou a atividade regularmente. “A cada dia que passava eu ia me apaixonando mais pelo Crossfit, eu me descobri uma crossfiteira nata”, brinca.
Edclea compara a prática da atividade física a um momento de descoberta de si mesma, de encontro com o equilíbrio necessário para a vida.
“Mesmo que seja difícil o início, eu incentivo todo mundo a fazer, porque vai ter uma identificação, vai gostar de uma coisa, e encontrar a sua atividade preferida, a sua atividade do coração e se dedicar”, conclui.
Foto: Arquivo pessoal
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