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Não se acostume com a dor
Dino Reichmuth uma pessoa está em um campo aberto com os braços levantados para cima, o céu está um pouco enevoado e a grama está seca.
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Neste artigo:

Para Ana Paula Borges, ao minimizarmos as dores que sentimos e as que causamos aos outros, perdemos a capacidade de nos comprometer de verdade com a própria vida


Quantas e quantas vezes ultrapassamos os nossos limites com falta de amor-próprio, de autorrespeito e autocuidado? E quantas vezes também maltratamos, desrespeitamos e ferimos os outros?

Em muitos casos, parece que vivemos alienados e inconscientes dos estragos que fazemos a nós mesmos e às outras pessoas. Minimizamos o sofrimento e começamos a nos acostumar com uma vida com pouco amor e bem-estar.

Comemos mal, dormimos mal, trabalhamos com o que não queremos, vivemos em cidades que não nos satisfazem, temos amigos que não nos nutrem e relacionamentos que não nos dão oportunidade de exercitar o amor e a troca. Por quê? Por que permitimos e fazemos isso?

Será que estamos nos tornando insensíveis à dor?

É verdade que todas as dores passam de certo modo e que, de uma forma ou de outra, encontramos uma forma de lidar com elas. Mas, isso não diminui o impacto que as perdas, rupturas, traições, ofensas, atos desrespeitosos e constrangimentos têm em nossas vidas. Banalizamos as palavras menos agradáveis, insistimos na falta de afeto e carinho em situações em que é fundamental que eles estivessem lá, somos desleixados com a gentileza, ignoramos a importância da nossa presença em nossa vida e na vida dos outros. Vivemos como se pudéssemos nos dar ao luxo de não expressar e receber amor.

Eu sei que a vida é criativa e ela sempre encontra novos caminhos quando a dor se faz presente. E que tudo pode ser visto como aprendizado e fazendo parte de nosso processo evolutivo. Mas será que precisamos receber e oferecer tanto desamor para crescer? Há dores absolutamente inevitáveis, mas a grande maioria, a gente poderia remediar.

Talvez, o que nos falte seja compromisso e autorresponsabilidade para isso.

A vida em meio à rapidez

Como cada vez mais olhamos a vida a partir de uma esteira acelerada de posts, tiktoks, notícias e acontecimentos, também podemos começar a achar que tudo é descartável, sem tanta importância e fugaz. Se passarmos a acreditar nisso, realmente tanto faz. Medo ou amor. Dor e alegria. Tanto faz.

Se magoarmos um amigo, outro aparece. Se perdermos a oportunidade de ser cordial com alguém no metro, teremos uma nova oportunidade lá na frente. Amores em época de aplicativos podem ser repostos à velocidade de um clique. Tudo se torna líquido, como já dizia o filósofo Bauman.

Mas, será que o vier a seguir será sempre melhor e mais bonito do que o que deixamos para trás? Ou será que sempre teremos uma nova oportunidade? A ideia de que as coisas sempre acontecem para o bem é verdadeira se entendermos tudo como aprendizado e a partir da noção de eternidade. Mas, no nosso dia a dia, no aqui e no agora não é exatamente assim.

Nossa falta de amor sempre deixa estragos e marcas e muitas delas podem demorar vidas inteiras para se curarem. Outra ideia difícil de aceitar e entender em sua plenitude é a que “tudo vai ficar bem”. Não, nem sempre as coisas vão ficar bem. Há vacilos sérios, que podem causar muitos estragos.

Muitas vezes, falamos frases feitas como mantras para apaziguar o que sentimos e continuarmos avançando. Além das já conhecidas, “Deus sabe o que faz”, “isso foi livramento”, “vai dar tudo certo”, “há males que vem para o bem”, há também a necessidade frequente de racionalmente abafarmos nossa raiva, tristeza ou indignação, tentando justificar que não foi tão ruim assim.

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Como lidamos com nosso comportamento?

Vivemos encontrando justificativas para aceitar nosso comportamento sem amor. Culpamos nossa humanidade, imperfeição, agitação e desatenção. Quantas e quantas vezes nos comportamos de forma irresponsável conosco e, consequentemente, com as pessoas a nossa volta? É difícil não infringirmos dores e sofrimentos aos outros se não tivermos feito isso primeiramente com a gente mesmo.

A dor não é fácil e nem simples. Para sobreviver, acreditamos que ela é terapêutica e serve a um propósito maior. Mas, será que de fato temos conseguido aprender com as dores que colecionamos ou continuamos inconscientes das consequências de nossos atos, não atos, ausências e silêncios?

Ao minimizarmos as dores que sentimos e as que causamos aos outros, perdemos a capacidade de nos comprometer de verdade com a própria vida. Vida que é curta. Muito curta.

Oitenta, noventa anos. Com a escola, o trabalho e o sono no meio, sobra pouco tempo para de fato desfrutarmos dela. Perdemos pais, avós, amigos, tempo, amores e, mesmo assim, acreditamos que ainda temos tempo. Temos. Se acreditarmos em outras vidas, temos todo o tempo do mundo. Mas, ao mesmo tempo, no aqui e no agora, temos muito, muito pouco tempo.

Por isso, o que der para consertar, conserte. O que der para perdoar, perdoe. Se der para sorrir, sorria. Se der para abraçar, abrace. Se der para sair mais cedo do trabalho, só para fazer um cafuné e uma surpresa boa, faça. Não se demore para ser a expressão do amor para você e para os outros. Não se demore para ser gentil, cuidadoso, fraterno. Por outro lado, não se demore, onde não houver nada disso.

Abandone aquilo que não te faz bem

Não perca tempo em trabalhos que não te fazem feliz, em relações que não te fazem bem, em amizades que drenam sua energia, em trânsitos intermináveis, em voos que estão sempre atrasados, em objetivos vazios, em corridas malucas. Não perca tempo em diálogos intermináveis com a sua mente que insiste em dizer que viver com medo é mais seguro. Onde há medo, não pode florescer o amor.

Pare de achar que está tudo bem. Às vezes, não está tudo bem. Mas, a gente pode tentar agir para que melhore. Na verdade, é a única coisa que está sob nossa responsabilidade. As escolhas que fazemos, dia após dia.

Pare de se maltratar e, portanto, de maltratar os outros. Basta de tanto sofrimento. Reconheça sua origem divina. Vista-se de luz e de amor, que é o seu traje de nascença. Trabalhe incansavelmente na direção de sua melhoria. Encontre sempre uma brecha, mesmo que menor que seja, para ser a expressão de amor. Escolha ser um semeador de coisas boas.

Acorde

Esse é um convite para um acordar diário. Ame a si mesmo e observe, hoje, amanhã e sempre, já dizia Buda. No seu processo de viver a expressão do amor, é impossível que esse sentimento não transborde para todos que estão à sua volta. Trabalhe diuturnamente para isso. Quando não conseguir ser amor e se tornar medo, não se martirize, mas volte ao prumo. Firme, incansável.

Não adianta achar que as coisas se organizam ou resolvem por acaso. Viver o amor, a alegria e a gratidão não é algo que se possa terceirizar.

Mesmo quando estamos perdidos, confusos ou sem saber o que fazer, podemos fazer. Reze, medite, peça orientação,  coloque no altar do Criador suas dores e peça para Ele te iluminar, proteger e abençoar. Peça para Ele te relembrar como é ser amor. E seja o que você nasceu para ser. Esse é o caminho mais fácil. Não se demore. Reconcilie-se com o amor em sua vida.


ANA PAULA BORGES (@anapaula_borges1) é fundadora da FlowMind, uma instituição que ensina e promove a meditação como ferramenta de autoconsciência. Ela hoje se sente apaixonada. Perdidamente apaixonada por todas as pessoas que estão em sua vida. Hoje o seu olhar escolhe amar, sem ressalvas.

Leia todos os textos da coluna de Ana Paula Borges em Vida Simples

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