COMPARTILHE
Amazônia: a busca por sabores no “Mercado Ver-o-Peso” em Belém
Pattie Mitchell
Siga-nos no Seguir no Google News

Na minha jornada pela Amazônia, descrita nos dois artigos anteriores*, a passagem pelo Mercado Ver-o-Peso, em Belém do Pará, não podia ser esquecida e precisa ser descrita.

O fato é que tenho uma verdadeira paixão pelos mercados das cidades que visito. Não tenho dúvida que eles refletem boa parte da verdadeira identidade, da alma do povo local e uma fotografia bastante curiosa dos costumes. No principal mercado da capital paraense isso não podia ter sido diferente.

*Esse é o terceiro e último artigo de uma série na qual o colunista André Mafra compartilha suas descobertas sobre a Amazônia aqui em Vida Simples. O primeiro foi Amazônia: novos sabores em um novo destino e, o segundo, Amazônia: “Só valorizamos aquilo que a gente conhece”.

Patrimônio histórico

O Mercado Ver-o-Peso, localizado na Baía do Rio Guajará, é um dos mercados mais antigos do país e, sendo um ponto turístico, cultural e gastronômico, tornou-se parada obrigatória para os turistas visitantes, chefes de cozinhas, e curiosos nos sabores do Norte do Brasil, — além é claro da população local.

Portanto, se o destino for Belém, reserve algumas horas para degustar de uma experiência intensa.

Um dos destaques que me chamou a atenção foram as frutas. Por sorte, já havia passado pelo sul do Pará, visitando a população ribeirinha e quilombola de Mangabeira pelo Instituto Laurinda Amazônia, o que serviu em muito para minha iniciação no conhecimento de algumas espécies de frutas.

Pessoas, cores e sabores

Em visita a barraca da Dona Carmelita, uma das mais tradicionais do mercado, pude me deliciar com o grande acervo de espécies típicas que orgulhosamente me era mostrado (detalhe para a admoestação prévia que educadamente recebi sobre as “boas maneiras no trato das frutas e no tirar das fotos”. Achei justo! Turista precisa ser colocado em seu lugar, não é mesmo?)

Barraca Dona Carmelita (Foto: Arquivo pessoal / André Mafra)

Barraca Dona Carmelita no Mercado Ver-o-Peso. (Foto: arquivo pessoal/André Mafra)

Quanto perfume vindo daquelas delícias como o inajá, o abio, o curioso ingá chinelo, as perfumadas mangas e tantas outras! Dentre as que levei, destaque para aromática banana São Tomé ou banana-do-paraíso, de casca fina e uma cor arroxeada extremamente bela, macia e saborosa.

Bouquet do Pará, Mercado Ver-o-Peso. (Foto: Arquivo pessoal / André Mafra).

Bouquet do Pará, Mercado Ver-o-Peso. (Foto: arquivo pessoal/André Mafra).

Vasculhando os corredores do mercado em busca de especiarias, fiz algumas boas descobertas, conheci um “bouquet” muito aromático, composto de coentro, cebolinha, chicória, alfavaca e pimenta de cheiro, excelente para cozidos e preparo de grãos.

Barraca do Paulo Sérgio: urucum, colorífico e cúrcuma, no Mercado Ver-o-Peso, Belém. (Foto: acervo pessoal/André Mafra)

Barraca do Paulo Sérgio: urucum, colorífico e cúrcuma, no Mercado Ver-o-Peso, Belém. (Foto: acervo pessoal/André Mafra)

Destaque também para a barraca do Paulo Sérgio, onde encontrei uma combinação muito saborosa, trata-se de um preparado com farinha de arroz, dendê (óleo de palma) e sal. Essa mistura possui uma vibrante cor avermelhada e uma leveza dado ao preparo dos pratos que a versão com fubá não tem. Recomendo.

Um encontro, muitas dicas

Ao lançar o livro “Sabores & Destinos”, tive o prazer de ter grandes amigos que confiaram no projeto e me ajudaram a divulgá-lo para pessoas que eles julgassem que se interessariam pelo meu projeto. Para minha surpresa, Luiz Pimentel, amigo e também profissional do DeRose Method, comentou sobre o início das minhas pesquisas em território nacional para um dos seus mais ilustres alunos que, muito solicitamente, se ofereceu para uma conversa sobre os sabores da Amazônia.

Tive o privilégio de um encontro no qual pude desfrutar de uma longa conversa com um dos maiores estudiosos de tradição gastronômica brasileira e também um dos mais prestigiados chefes de cozinha de todo o mundo, o profissional Alex Atala.

No dia da nossa conversa — entre garfadas do rubacão na versão deliciosa sem carnes do seu restaurante Dalva e Dito —, ele nos contou sobre seus espetaculares projetos e sua busca em dar luz aos diferentes povos, aos tantos anônimos que habitam este Brasil e que são detentores de muito conhecimento.

Após falarmos sobre muitos ingredientes — entre eles a perfumadíssima priprioca e o cipó d’alho —, entramos em uma interessante discussão filosófica do que pode ou não ser considerado especiaria. Entre muitas histórias já vividas por ele em muitos anos de viagens ao Norte do país, em um momento ele enfatizou:

— Você precisa conhecer as senhoras erveiras do Mercado Ver-o-Peso!

Logo, era para lá que precisa ir.

As senhoras erveiras

O Ver-o-Peso, na verdade, é um grande complexo que inclui uma enorme aérea com distintas edificações das quais, em um dos corredores, temos as populares “senhoras erveiras“. Ao chegar por lá, fui conhecer a barraca da estilosa e divertidíssima, Beth Cheirosinha.

"Rua das erveiras", Belém, Mercado Ver-o-peso. (Foto: acervo pessoal/André Mafra)

“Rua das erveiras”, Belém, Mercado Ver-o-peso. (Foto: acervo pessoal/André Mafra)

Com uma enorme simpatia e paciência, a especialista em ervas medicinais respondeu a todas as minhas infindáveis perguntas e revelou alguns segredos de seus preparos para um curioso viajante paulistano. Entre minhas compras, estavam suas garrafadas e uma das minhas paixões, folha de canela.

Beth me contou um pouco de sua trajetória, relatou que faz mais de 40 anos que trabalha no mercado e que quando criança vinha com sua mãe e avó trazendo as ervas colhidas na floresta.

Ela detalha ainda que na época não havia a estrutura de hoje e que expunha as ervas trazidas no chão mesmo, apenas sobre um tecido similar daquelas tramas dos sacos de batatas. Em resumo, trata-se uma mulher guerreira, uma batalhadora que como muitas outras daquele mercado lutam para ter uma vida digna.

O que faz você gostar de um destino?

Você já percebeu que, o que nos fazer gostar deste ou daquele destinos, não é o lugar, mas, sim, as pessoas? Os guias de viagem, blogs, vlogs e tantos outros nos mostram locais de tirar o fôlego são os “must-see”, locais imperdíveis dotadas de belezas naturais ou museus, restaurantes, templos, parques…

Entretanto, imagine você ir no restaurante dos seus sonhos, de “não-sei-quantas-estrelas-de-um-guia-de-fabricante-de-pneus”, e eventualmente, passar por uma experiência ruim com um atendente ou dar o azar de se estar ao lado de um outro cliente mal-educado.

O fato é que a qualidade das relações interpessoais que tivermos em viagem é que irá definir nossa percepção de como foi a experiência.

Que tal colocar como item nos seus próximos destinos uma visita aos mercados municipais?

Tenho certeza que você não vai se arrepender, mas lembre-se que mais importante que os lugares são as pessoas especiais que por lá você irá conhecer.

LEIA TAMBÉM: Todos os artigos de André Mafra em Vida Simples.

*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

A vida pode ser simples, comece hoje mesmo a viver a sua.

Vida Simples transforma vidas há 20 anos. Queremos te acompanhar na sua jornada de autoconhecimento e evolução.

Assine agora e junte-se à nossa comunidade.

0 comentários
Os comentários não representam a opinião da revista. A responsabilidade é do autor da mensagem.

Deixe seu comentário