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Disciplina positiva ou educação permissiva?
Disciplina positiva traz perspectiva de relacionamentos mais saudáveis no futuro das crianças. Ricardo Maruri/ Unsplash
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Neste artigo:

A disciplina positiva, abordagem socioemocional baseada nas teorias dos psicólogos humanistas Alfred Adler e Rudolf Dreikurs, só recebeu esse nome depois que Jane Nelsen e Lynn Lott resgataram os conceitos e escreveram um livro sobre o tema.

De uns anos para cá, muitos pais se apoiaram nessas ideias para tentar oferecer aos filhos uma educação diferente daquela que a maioria de nós recebeu.

No entanto, como a disciplina positiva envolve mais cuidado com as palavras e os gestos, além de uma participação maior da criança nos acordos, não é difícil que ela seja confundida com a permissividade.

No fim das contas, parece insano pensar que adultos estão reivindicando o direito de desrespeitar seus filhos e alunos.

Quando humilhamos e desrespeitamos nossos filhos e alunos, seja com agressões físicas ou psicológicas, e nos convencemos de que estamos agindo assim para “educar”, estamos apenas ensinando a eles que os abusos são justificáveis.

Assim, contribuímos para que crianças e adolescentes cresçam e se envolvam em relacionamentos amorosos abusivos, amizades tóxicas e manipuladoras e até mesmo em relações de trabalho abusivas.

“Meu marido grita comigo porque me ama e só queria me provar que eu estava errada”, “minha amiga falou mal de mim porque eu errei” ou “meu chefe grita comigo porque quer que eu evolua na minha carreira” são pensamentos comuns de pessoas que cresceram sofrendo abusos por parte de seus cuidadores.

Leia mais: Parentalidade positiva é tendência nas novas gerações

O equilíbrio nas relações da educação positiva

Nos últimos anos, muitos pais têm buscado uma forma de educar diferente daquela que receberam. A Disciplina Positiva, que ganhou popularidade com Jane Nelsen e Lynn Lott, pareceu ser a resposta perfeita: uma maneira de criar filhos com base no respeito mútuo e na empatia.

A ideia é linda, mas o desafio de colocá-la em prática trouxe dúvidas. Como estabelecer limites sem ser autoritário? Como criar um ambiente respeitoso sem cair na permissividade?

Essa linha tênue entre a educação respeitosa e a permissiva é motivo de críticas. Críticas são bem-vindas — quando geram reflexão — mas em tempos de redes sociais, os extremos aparecem com muito mais frequência.

Não faltam vídeos de pais dizendo que a Disciplina Positiva não funciona, já que seus filhos tornaram-se mimados, arrogantes e desrespeitosos.

Na verdade, se isso aconteceu, há grandes chances de que o método tenha sido aplicado equivocadamente. Muitos pais, na tentativa de adotar os princípios da Disciplina Positiva, acabam se perdendo no equilíbrio. Sendo assim, sem querer, vão deixando de lado os limites necessários e, acima de tudo, desejados por seus filhos.

Como quase toda discussão nas redes, a coisa escalou de tal forma que virou uma guerra entre os vídeos defendendo ou atacando a Disciplina Positiva.

E, no fim das contas, acabamos esquecendo as razões que fizeram muitos de nós repensarmos a educação que oferecemos aos nossos filhos.

Disciplina positiva promove respeito dentro de casa

Não é incomum, quando eu mesma falo sobre a importância de orientar crianças e adolescentes com base em uma educação respeitosa, que eu veja pais e educadores torcendo o nariz.

A sensação que muitos ainda têm, infelizmente, é a de que só existem dois extremos: educar com violência e rigidez ou com permissividade e negligência. Entre uma e outra, parece mais confortável reproduzir o que já conhecemos.

Um exemplo bem famoso que sempre uso nas palestras é o da jarra de suco. Se você está almoçando com seu filho, ele vai se servir de suco e sem querer derrama tudo na mesa, a maioria dos cuidadores tem uma reação de raiva: “Sempre isso! Não presta atenção em nada!”.

Por outro lado, se tem uma visita na sua casa e ela faz o mesmo, qual costuma ser a reação? “Não se preocupa, irei pegar um pano,  acontece!”.

Por que tendemos a ser respeitosos com as pessoas em geral e violentos com os indivíduos que precisam de nós para se desenvolver?

Muitos diriam que o mundo é cruel e que as crianças precisam estar preparadas para enfrentar essa crueldade. À primeira vista parece fazer sentido, mas não seria mais inteligente agirmos para diminuir a crueldade do mundo a cada geração?

Quando desrespeitamos nossos filhos, a que ensinamos é a ideia de que pessoas podem nos desrespeitar se for para nos “corrigir” ou “educar”.

Dessa forma, ajudamos a construir pessoas que se envolvem em relacionamentos abusivos, que fazem amigos manipuladores e até mesmo pessoas tolerantes à exploração profissional.

Além disso, elas podem tornar-se submissos e inseguros diante de chefes, por exemplo. O que parece muito óbvio, uma vez que cresceram acreditando que podemos ser violentados, se houver um objetivo plausível.

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Educação positiva fortalece crianças

Quando reflito sobre as consequências, me parece inacreditável que alguns de nós estejamos questionando o limite da violência que podemos usar contra nossos filhos.

Tendo a acreditar que o medo do julgamento motiva muitos pais. Pessoas que educam crianças com respeito escutam com muita frequência que deveriam ser mais autoritários ou que estão sendo “moles” demais.

É isso mesmo que deveria estar em pauta? Quantos de nós já nos arrependemos de uma explosão de raiva? Por que nos parece mais fácil lidar com a eventual culpa do que com o julgamento de pessoas aleatórias?

No final, queremos  o mesmo: criar filhos que se sintam seguros e amados, mas também preparados para os “nãos” inevitáveis da vida.

Não importa a linha ou educadores que você seguirá; se você entender que não pode abrir mão do respeito, o caminho já foi bem percorrido.

Educar respeitosamente não significa abdicar da autoridade, mas sim usá-la de forma que fortaleça, em vez de ferir.

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