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Traumas emocionais: um conselho importante para quem tem filhos
Juliane Liebermann/ Unsplash
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Neste mês, assisti à peça “Lady Tempestade”, com a Andréa Beltrão. Em uma de suas falas iniciais, ela diz: “algumas pessoas não contam histórias porque querem contá-las e sim porque precisam entender o que aconteceu”. É como vejo os traumas emocionais: precisamos falar para entender e nos curar, com o objetivo principal de não repetirmos com nossos filhos as mesmas dores que nos foram causadas.

Toda história guarda sentimentos contraditórios que nem sempre são fáceis de lidar

Eu e meus seis irmãos crescemos em um lar marcado pela violência doméstica e com uma educação pautada no desrespeito e no abuso: físico, psicológico, moral. Surras, ameaças, tratamento de silêncio e humilhações são memórias comuns em nossas vidas. E hoje só é possível escrever essas palavras porque foram muitos anos de terapia.

Além disso, trabalhar como professora de adolescentes me trouxe a consciência de que poderia acolher pessoas em situações parecidas. Se contasse o que aconteceu e estudasse muito para entender como esse cenário poderia deixar de se repetir em tantas famílias. Ainda assim, não é fácil.

E é difícil porque, apesar da violência inesquecível, também temos boas memórias que, mesmo sendo boas – ou talvez justamente por isso – doem tanto quanto a violência em si. É possível – e justo – sentirmos amor por quem nos violentou.

Não tenho nenhum arrependimento pela distância que tomei do meu pai assim que foi possível. Não sinto nenhuma necessidade de perdoá-lo pelas atrocidades que reverberam até hoje. Só a ideia de vê-lo ao vivo já me embrulha o estômago. Por mais que tenha todas essas certezas, sei que ele foi abandonado pelos pais ainda criança, que viveu anos na rua ou em lares em que foi torturado, sei que reencontrou o pai depois e sofreu abusos ainda mais severos e conheço algumas histórias da vida dele que são de entristecer até os mais brutos.

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Olhar para os traumas emocionais é caminho para uma relação mais respeitosa com os filhos

Não acredito na ideia de que pai e mãe são sagrados, não acho que todos os pais fazem o melhor que podem, sei que alguns fazem o pior. Seria uma heresia colocá-los em um lugar divinal. No entanto, acredito fortemente que nós temos o poder de escolher uma rota diferente, como eu e meus irmãos fizemos e como fazem tantas pessoas que precisaram lidar com a violência em suas infâncias.

Um dos meus irmãos, por exemplo, é o melhor pai que eu já conheci. Não um pai como qualquer mãe “normal”, mas um paizão mesmo. Amoroso, preocupado, paciente. Sabe de cada detalhe relacionado à filha, lê junto, sequer cogita a violência de qualquer tipo. Estimula a criatividade, é porto seguro, brinca muito e sem hora para acabar.

No primeiro ano dela, eu pensava “que alívio, é o oposto do meu pai”. Hoje, mais atenta, enxergo que a paternidade dele é recheada de boas heranças que a pessoa mais cruel que conhecemos deixou. E sei disso porque já fui a menina apaixonada pelo pai, como é minha sobrinha. Já dei gargalhadas tão gostosas quanto as dela quando meu pai fazia as mesmas brincadeiras e demonstrava amor exatamente da mesma forma como meu irmão faz.

Vejo claramente que o fato de ele escolher conversar, refletir sobre o que passou e entrar no próprio processo de cura possibilita que ele ofereça mais dignidade, respeito e amor à sua filha.

Um conselho para entender o passado e melhorar o presente (e o futuro)

Quando criança, não tive a sorte de ter pais que tomaram a decisão de olhar para seus próprios traumas emocionais, mas, como adulta e mãe, tento conscientizar os cuidadores de hoje para que eles não repitam os abusos que viveram.

Se eu puder deixar um conselho para aqueles que estão educando pessoas, é apenas (e todo) este: entendam suas feridas, encarem os traumas e escolham fazer diferente.

Escrever, conversar, fazer terapia para falar sobre o seu passado não é desrespeito à memória de seus pais, garanto. É respeito aos seus filhos, é melhorar a história, evoluir.

Que tal tentar essa transformação no ano que está começando? Feliz 2024!

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