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O que é positividade tóxica? Saiba como evitar essa armadilha
(ILUSTRAÇÃO: TIAGO GOUVÊA) Não há equilíbrio em escolher só um lado...
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“Oi, tudo bem?”, “Tudo bem. E com você? Tudo bem!” – Você já deve ter ouvido ou falado al­guma vez. Ou, talvez, todas as vezes.

Isso por­que, desde cedo, somos habituados a pensar e falar que “está tudo bem”. A não compartilhar aquilo que realmente sentimos. A não acolher sentimentos não aceitos socialmente – como raiva, tristeza, inveja, ansiedade…

Só que esse tipo de comportamento pode nos trazer diversos problemas: atrapalhar nosso autoconhecimento, evolução, relações inter­pessoais e outras áreas da vida.

Pois algo que parece ser simples – uma resposta ingênua ou automática – é apenas a superfície de camadas que nos acompanham e alimentam um círculo vicioso. Nele, parece ser preciso estar sem­pre “positivo e operante”, apesar de tudo.

O que é positividade tóxica?

Positividade tóxica. É como algumas pesso­as chamam. O lado positivo é que temos re­cebido cada vez mais notícias sobre os peri­gos “dessa positividade toda”.

Na contramão, há quem não concorde com o termo (!), ache impossível que algo “positivo” seja ruim ou tóxico – o que denuncia a própria positivida­de tóxica.

Sempre que falo sobre isso nas mi­nhas redes sociais, a polêmica é certa. Tenho aprendido bastante com o ponto de vista de outras pessoas, e minha intenção aqui é orga­nizar os pensamentos.

Então, antes de continuar, vale explicar o con­ceito que vai embasar esse texto:

Positividade tóxica é quando agimos sem reconhecer ou aceitar (em nós ou nas outras pessoas) emo­ções ou ações “negativas” que existem, inde­pendentemente do que é positivo, impondo uma atitude forçada ou falsamente positiva.

Isso não impede ou não vai contra o conceito de “pensar positivo” – também falarei sobre essa diferença, mas primeiro veremos alguns dos perigos da positividade tóxica.

Os perigos da positividade tóxica

Para a terapeuta e psicóloga britânica Sally Baker, “o problema com a positividade tóxica é que ela pode representar a negação de todos os aspectos emocionais que sentimos diante de qualquer situação que nos represente um desafio”.

Com isso, ela pode se tornar uma fonte de alienação do sentir. Ao tentar anular processos emocionais complexos – e ineren­tes ao ser humano – como dor, raiva, mágoa, por serem considerados moralmente negativos, nos desconectamos de quem so­mos.

Ou, na tentativa de “não sofrer”, pode­mos acabar sofrendo ainda mais.

Uma forma de se alienar do problema

positividade tóxica … afinal, alegrias e adversidades compõem quem somos (Ilustração: @TGOUVEA)

Você já deve ter contado algo de “ruim” so­bre sua vida e ter ouvido “mas pense pelo lado positivo!”.

Olhar pelo lado positivo para as diferentes situações pode ser muito legal e até construtivo, mas há um risco em olhar apenas para esse lado.

Ele não deve negli­genciar ou ser maior do que nossas pró­prias emoções ou até mesmo os problemas estruturais da nossa sociedade, nos levando a crer que somente o olhar positivo irá re­solver ou superar qualquer problema.

Criar uma realidade mágica na qual tudo é lindo e não encarar problemas de frente reduz bas­tante as chances de superá-los.

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A positividade tóxica nas relações

Nas relações interpessoais é preciso haver espaço para manifestar descontentamen­to, insatisfação, tristeza… Somente assim será possível construir uma relação inteira.

A transparência é fundamental, e para que haja transparência é preciso se abrir para reconhecer todas as emoções em torno da relação.

Além da falta de inteireza, não re­conhecer problemas nas relações, ou focar somente “no positivo”, pode, algumas vezes, “justificar” relações abusivas e uma sé­rie de violências (às vezes nem tão óbvias).

Positividade tóxica é ferramenta de opressão

Há um risco também de pensarmos que nossos problemas são frutos de “crenças limitantes” ou “escolhas”.

Tais generali­zações podem, muitas vezes, nos fazer perder a autonomia. E não nos deixar per­ceber verdadeiramente tempos e movi­mentos importantes para a nossa vida.

Ou o extremo: o discurso de que somente “a força do pensamento positivo cons­trói a nossa realidade” pode ser extrema­mente opressor para pessoas que vivem realidades mais duras, como consequ­ência de papéis de classe, raça e gênero.

Positividade tóxica impede a mobilização

Focar sempre somente no lado positivo pode impedir que mudanças importantes sejam feitas. Vivemos um momento no qual querer “ficar bem” é quase mandatório.

E não temos como negar essa vontade. O problema é olhar somente no bem de uma pessoa ou pensar que “se está bom para um, está bom para todos”.

Esse pensamen­to pode nos impedir de ver e melhorar di­ferentes realidades. Felicidade, bem-estar e saúde mental precisam ser vistos como atri­butos coletivos, e não individuais.

Como trocar a positividade tóxica pela positividade ativa

Não posso deixar de reconhecer que pen­sar de forma positiva é legal. É importante, faz bem para a saúde (dizem alguns médi­cos) e pode nos motivar a enfrentar os de­safios do dia a dia.

Não quero te desanimar. Mas, às vezes, somente pensar positivo não vai mudar a sua vida e muito menos a sociedade.

É preciso construir realidades por meio de ações, e não somente da “força de pensamento”. Ter uma positividade ativa e assumir que existem questões estruturais à nossa volta (como racismo, machismo, homofobia, transfobia…) que impactam de forma importante a vida de muitas pessoas.

Há um tempo, a psicologia positiva, do psicólogo e escritor de The Optimistic Child, Martin Seligman, tem sido estimu­lada para auxiliar no tratamento de dife­rentes problemas e patologias.

Ela nos diz que podemos lutar contra o pessimismo e transformar nossos pensamentos negati­vos em mais positivos – e que isso pode nos fazer bem.

No entanto, Seligman também diz que, se você se sente triste, não deve se concentrar em ser feliz.

Ao fazer isso, você poderá cair na armadilha da positivi­dade tóxica.

É preciso acolher e trabalhar as emoções negativas. E, principalmente, buscar a causa de tais sentimentos.

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ANDRÉ CARVALHAL é escritor e consultor em sustentabilidade, autor dos best-sellers Como Salvar o Futuro, Moda com Propósito e Viva o Fim – Almanaque de um novo mundo. @carvalhando


Conteúdo publicado originalmente na Edição 238 da Vida Simples

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