Maternidade Antirracista: o que é isso?
Exercer a maternidade antirracista é ter conversas desconfortantes sobre privilégios. É ter um olhar com amor e carinho. Prepare-se porque pode te trazer desconfortos.
Como exercer uma Maternidade Antirracista?
“Mãe é tudo igual”. Quem nunca ouviu isso? Com certeza muitas de nós já ouvimos e é bem provável que muitas também falaram essa frase em algum momento.
Começando pelo básico sobre como exercer uma maternidade antirracista: ser uma mãe preta não é como ser uma mãe branca.
Hoje, espero ter uma conversa desconfortante com você. Porque enquanto se preocupa que seu filho use um casaco com capuz para se proteger do frio e da chuva, uma mãe preta implora ao filho para não usar o capuz para não ser confundido com um bandido pela polícia.
Uma mãe preta implora ao filho para não cantar alto ou dançar na rua para não ser tratado como um baderneiro; uma mãe preta pede aos filhos não tocarem nas vitrines e prateleiras para não acharem que estão roubando; uma mãe preta pede ao filho para não dar muita opinião para não ser expulso da sala de aula; uma mãe preta pede a filha para não usar o vermelho, para não ser confundida com uma prostituta.
Maternidade Antirracista – ter conversas desconfortantes.
Não existe um passo a passo. Não existe uma técnica ou método para exercer uma maternidade antirracista.
O Antirracismo é uma conversa desconfortante com o seu próprio passado diante de conceitos e histórias diferentes da sua realidade, fora da sua zona de conforto e dos seus privilégios.
Exercer uma Maternidade Antirracista é intencionalmente trazer para o âmbito familiar diferentes culturas, diferentes visões, é colocar dentro da sala o “diferente”.
Pense nas pessoas mais próximas que você convive, amigos, vizinhos, colega de trabalho, professora, psicólogo, quem quer que seja que você conviva. Você já reparou o que essas pessoas têm em comum?
Segundo a teoria do escritor americano Jim Rohn, nós somos a média das cinco pessoas com quem passamos mais tempo. Em outras palavras, o meio em que vivemos inevitavelmente influencia nossas ações, pensamentos e sentimentos, e isso reflete em todas as áreas da vida: pessoal, profissional e familiar.
Portanto, colocar o diferente dentro da sala é passar a frequentar, usufruir, dialogar com pessoas, lugares e coisas que não estão dentro desse círculo de conforto.
A inseparabilidade da Pessoa e do Ambiente (princípio Budista Esho Funi)
O Budismo coloca que as pessoas e o ambiente que as cerca são partes divisíveis, porém inseparáveis. Em outras palavras, as pessoas e o ambiente são dois fenômenos independentes, mas são correlacionados e são aspectos de uma mesma entidade.
Não temos como imaginar um ser humano sem o ambiente em que pertence e vice-versa. Repare, é bem possível imaginarmos o ambiente que uma pessoa vive se olharmos e analisarmos vários aspectos dela.
Nas relações humanas, os opostos não se atraem. Nós somos “atraídos” por aquilo que nos deixa em nossa zona de conforto, somos atraídos por aquilo que nós conhecemos e sabemos lidar.
Nesse sentido, começar o caminho da Maternidade Antirracista é olhar ao seu redor, é identificar se a cultura e referência preta está presente na sua vida.
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A Maternidade como pivô de uma revolução social e do Antirracismo
Alguns dias atrás recebi essa mensagem no meu perfil do Instagram:
“Reparei que não tem nenhuma criança preta na escola da minha filha, também não há professores pretos. Não tenho amigos pretos e no meu condomínio também não tem. Como posso educar meus filhos para não serem racistas?”
No Brasil, mais da metade da população se autodeclara preta, pelos dados do IBGE. Mas, para encontrar referências, é preciso muito esforço. Refiro-me a médicos pretos, advogados pretos que discutem a solução de um problema na TV, a analistas políticos pretos discutindo o futuro do país e a tantos outros exemplos.
Nos programas de TV, rádio e internet, onde estão os pretos como essas referências, essas autoridades em assuntos importantes para a sociedade?
“O racismo de criança para criança é um reflexo do que a sociedade faz“, diz a ativista Luciana Bento.
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– Perceba suas emoções para construir pontes com seus filhos
O que fazer? Como sair da zona de conforto?
Imagino que, se você chegou até aqui, existe uma faísca dentro de você para iniciar esse processo de desconstrução, então, já temos um bom ponto de partida. Mas, para que a gente saia da nossa zona de conforto, gostaria que você respondesse às seguintes questões:
1- Você se relaciona com pessoas pretas no âmbito privado, sem uma relação laboral?
Por mais genuína que possa ser a relação laboral, se existe uma hierarquia naturalmente a relação de poder é construída.
2- Você já contou para as crianças a verdadeira história da escravização Africana?
Crescer sem receber informações históricas, geográficas, sociológicas completas acerca da população preta impacta todas as crianças, porque naturaliza uma ideia sobre quem tem ou não valor, quem construiu ou não a história, quem deve ou não ter respeito.
3- Você consome e compartilha com suas crianças entretenimento preto (músicas, livros, desenhos, filmes e arte)?
Produtos da indústria cultural tem um impacto enorme no imaginário infantil, a partir dela que as crianças constroem o seu senso de raça, classe, etnia e gênero. Como nossa raça é humana, é muito importante mostrar e conviver com a diversidade da Humanidade.
Lázaro Ramos tem produzido muitos livros sobre o tema, e também para crianças. Você já leu?
4- Você tem conversas sobre privilégios pela cor com sua criança?
Conversas que podem ser desconfortáveis precisam existir ao ponto de assumirmos o quanto o branco é privilegiado em inúmeros aspectos da vida e não tem a ver com competência e sim com a desigualdade que teve início na escravidão.
5- Seja exemplo
As crianças não aprendem somente com o que falamos, mas muito mais com o que veem. Portanto, se queremos fazer diferente, “não basta não ser racista, é preciso ser antirracista”, como diz Angela Davis.
Ser antirracista é se colocar em ação, é estar disposto a sair da zona de conforto para estar em situações e diálogos desconfortáveis, é preciso discutir o racismo na infância e assumir que eu e você temos um mundo de privilégios que escancaram em nossa porta já que temos a pele branca. E sim, não é mimimi, é realidade.
Seja sempre sua melhor amiga. Seja a pessoa fantástica que você é! Eu acredito em você, acredite em você também. Você consegue ser Antirracista, você tem essa coragem.
Dicas de Séries e Livros
Racionais: Das Ruas de São Paulo para o Mundo
Não era rap. É o principal veículo de comunicação do preto e moradores da preferia. Sem a mensagem deles, a voz do preto pobre não teria chegado no asfalto branco como chegou.
Qualquer programa da Oprah já é uma aula universitária. Assista ao diálogo com o Professor e bestseller Ibram X. Kendi sobre Como ser Antirracista.
Conversas Desconfortantes com um homem preto, do Emmanuel Acho
Emmanuel Acho foi jogador de futebol americano até 2015 e passou a ser analista esportivo na TV. Ele era muitas vezes questionado por amigos sobre como lidar com o tema racismo e isso gerou um alerta despertando um interesse pelo letramento racial. Assim, ele começou a fazer conversas desconfortantes com diversas pessoas, de policiais até famosos.
Livro | Tudo sobre o Amor, da Bell Hooks
A incrível Bell Hooks, em plena pretitude, ensina sobre a supremacia do. Ensina sobre o poder das pequenas revoluções dentro de cada núcleo familiar. É como construir uma atitude e postura amorosa capaz de edificar toda a sociedade.
Livro | Mamãe&Eu&Mamãe, da Maya Angelou
É um autorrelato e encontro filosófico da ativista e poeta preta Maya Angelou. Ler seus textos é um mergulho em que nos faz ser humano. O amor cura tudo, até as cicatrizes mais profundas de uma relação conturbada entre mãe e filha.
Livro | Por um feminismo afro-latino-americano, da Lélia Gonzalez
Defensora do Pretuguês. Filósofa, antropóloga, escritora, professora e preta. Uma das principais militantes do movimento contra o racismo estrutural e na articulação das relações entre gênero. Um dos maiores, senão o maior, ícone para o feminismo negro.
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