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Mães também precisam de cuidados: quem cuida de quem cuida?
(Foto: Jenna Norman/Unsplash)
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O tornar-se mãe pode ser uma situação de muito crescimento pessoal para muitas de nós. E eu utilizo propositalmente o verbo “pode” como uma indicação de que nem tudo é generalizável. E também de que outras variáveis bem importantes incidem na função do maternar.

O impacto social da maternagem é uma delas. E pode ser bastante cruel com as mães e cuidadoras principais de crianças. Isso porque o contexto sócio-histórico em que vivemos carrega consigo todas as enormes exigências culturais do que uma mãe deve fazer para ser considerada uma boa mãe.

E aqui, na comparação com os pais, homens, fica muito claro que a régua para a medida não é a mesma. As feministas vêm chamando isto de “duplo padrão sexual”.

Como a sociedade enxerga as mães

Mulheres mães, principalmente de crianças com menos de 7 anos, raramente saem para um chopinho depois do trabalho. Mas quando saem são bombardeadas com perguntas sobre a criança, com certa surpresa por uma mãe ter uma vida para além dela.

O pai passará batido na mesma situação, porque o senso comum entende que crianças são responsabilidade principal de suas mães, e pais são apenas cuidadores secundários. Eles também sairão ilesos da entrevista de emprego, não serão indagados sobre quem cuidará da criança quando ela adoecer, para que o trabalho não seja prejudicado.

Um pai apenas existindo dentro de casa ou outro pai que paga uma pensão mediana, mas que não cobre nem um terço das necessidades da criança, serão considerados bons pais.

Mesmo se não souberem quanto a criança calça, qual o nome dos seus amigos, das professoras, mesmo se não prepararem sua comida preferida e se não cuidarem dela quando fica doente. Uma mãe não é considerada boa mãe se a guarda fica com o pai, mas o oposto é normalizado.

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O que seria uma boa mãe?

Me arrisco a dizer que a boa mãe não existe. Faz parte apenas do imaginário social que fica muito próximo da Virgem Maria: o estereótipo de santa, abnegada, a que se deixa por último, a que se martiriza, a que não está próxima dos prazeres comuns, de realizações pessoais e nem de sua própria humanidade, com dias ruins, falhas e faltas.

É por isto que a culpa materna é vista como algo “natural” das mães, porque pouco se desnaturaliza esse nível de exigência e de performance, que obviamente ninguém consegue atingir. A mãe é muito mais lembrada quando falha, quando falta, vide a célebre frase “cadê a mãe desta criança?”.

Um exemplo duro, mas muito ilustrativo: mães que desacreditam suas filhas quando estas revelam que sofreram abusos familiares ficam famosas pela crueldade. Importante dizer que isso pode deixar marcas indeléveis.

Entretanto, não ficam famosas as mães que lutam contra os genitores abusadores, que conseguem retirar a guarda da mãe alegando “alienação parental”. Um conceito, aliás, advindo de uma pseudociência que só foi aceita no nosso país, mais nenhum outro.

O cansaço materno

Se as mães apenas “não fazem nada além de sua obrigação”, e esta obrigação está cheia de injustiça, sobrecarga e inequidade, é bastante óbvio que nem sempre será bom maternar.

Sem reconhecimento, apoio social, sem políticas públicas que as incluam na volta ao trabalho, no adoecimento dos filhos, no empobrecimento e na carga mental e emocional solitária, podemos afirmar que estamos parindo em ambiente adverso, adoecido.

Se hoje podemos pelo menos falar disso, já temos um ganho. Mas precisamos de mais, muito mais. Toda mulher merece ter escolha real sobre se quer engravidar, gestar e parir.

E toda mulher merece saber das dificuldades sociais em ser mãe, e não apenas ser bombardeada com a romantização dos aspectos subjetivos da maternidade.

Sim, a maternidade pode ser muito transformadora, mas os aspectos que a definem não têm o poder de transformar uma mulher destruída em uma mãe suficientemente boa. Quem cuida de quem cuida?

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