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Acolha sua tristeza | Ouvindo Vida Simples
Crédito: Stefan Spassov | Unsplash homem de camisa azul olhando o mar
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Neste episódio de Ouvindo Vida Simples, Sandra San faz a leitura do texto “Acolha sua tristeza”, de Nara Siqueira

Produção de áudio: Ogro | Edição do portal: Margot Cardoso | Direção geral: Lu Pianaro e Isis de Almeida.

Reconhecer a existência desse sentimento e escutar o que ele tem a nos dizer abre espaço para uma relação mais gentil com a gente mesma e com o outro.

Lembro-me de, quando pequena, abrir os olhos entristecida ao perceber que os raios de sol não atravessavam as frestas da janela em uma manhã de sábado e que, lá fora, muitas gotas de água tocavam o chão. O dia havia amanhecido chuvoso, o que significava que eu não poderia andar de bicicleta na rua, nem brincar de boneca no quintal. Ficar o dia todo dentro de casa não parece gostoso quando você tem 6 anos e se sente portadora de toda a energia necessária para dominar o mundo.

Sábados de infância tinham que ser ensolarados. A cada poucos minutos, corria para a porta de vidro da sala com a esperança de que o Sol estivesse, enfim, despontando no horizonte. Por vezes, ele realmente estava, o que me fazia abrir um sorriso tão grande que era capaz de beijar minhas próprias orelhas. Mas, em outros momentos, a chuva só cessava no dia seguinte. Nesses, cabisbaixa, voltava para o quarto, procurava algo para me distrair e esperava ansiosa pela próxima checagem. 

Véu cinzento

A tristeza é esse sentimento que faz com que algo dentro da gente fique embaçado. Ou, ainda, um “véu que envolve a nossa vida e a torna cinzenta”, como dizem Cristina Núñez e Rafael Valcárcel, autores de Emocionário (Sextante), livro infantil para ser lido por crianças de 0 a 100 anos. E, apesar de soar como algo negativo, ela pode ser uma fonte riquíssima de autoconhecimento e aprendizados importantes para o processo de amadurecimento. 

Não vamos, aqui, construir um manual sobre o que é felicidade e como alcançá-la – há milhares de pessoas se debruçando sobre essas questões mundo afora. Nossa conversa é sobre os caminhos que a tristeza percorre dentro da gente e de que forma podemos olhá-la com mais gentileza. De antemão, um aviso: revisitar lugares e situações que nos deixaram (ou seguem deixando) entristecidos pode ser dolorido. Vá no seu tempo, sem tantas cobranças. Os sentimentos, por mais que carreguem uma definição comum, ressoam de maneira única em cada um de nós. São tão – e só – nossos. 

Onde nasce a tristeza?

“Só existem tristezas por existirem questões no mundo que estão muito além do nosso controle”, diz o filósofo e escritor Matheus Jacob, que lançou recentemente o livro Coragem de Existir (Buzz). O relacionamento que acabou, a morte de alguém querido, um erro cometido no trabalho, os planos frustrados são situações que nos causam tristeza, porque escancaram a verdade de que não podemos resolver tudo. 

Você pode pensar que, então, é fácil fugir desse sentimento, tantas vezes encarado como o vilão da nossa plenitude: basta se esquivar de cenários sobre os quais não temos controle. “Nessa tentativa, perderíamos qualquer contato com outros indivíduos e, consequentemente, qualquer descoberta de nós mesmos”, pontua Matheus. “Na verdade, romperíamos o espaço para qualquer experiência.

Como me tornar algo sem nenhuma lembrança, sem nenhum repertório? A tristeza é uma das estações inevitáveis da vida. Sabedoria não é evitá-la. É aprender a viver em todas as estações da existência”, completa. É como a chuva, aquela da minha infância. Eu gostava tanto dos dias de sol porque sabia como era viver na ausência deles. Se eu não tivesse passado pela experiência de acordar em uma manhã chuvosa, talvez nunca entendesse que, para brincar ao ar livre, eu precisaria do céu azulado. A gente não vive sem chuva – nem sem tristeza. 

Continue a ler o texto “Acolha sua tristeza“.

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