Dismorfia corporal: até onde é normal não aceitar o próprio corpo?
Preocupação exagerada com a aparência física pode significar a presença de um transtorno de dismorfia corporal
Preocupação excessiva com a aparência, baixa autoestima e desconforto com o que se vê no espelho. Esses podem ser os primeiros sinais de que alguém está passando por um transtorno cada vez mais comum no Brasil: a dismorfia corporal.
Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, essa patologia atinge em torno de 4 milhões de brasileiros e pelo menos 2% da população mundial. No Brasil, mulheres entre 18 e 30 anos são as principais atingidas pelo transtorno. Mas os homens, majoritariamente entre 18 e 21 anos, também fazem parte desse grupo.
O que é dismorfia corporal?
Na psiquiatria, o nome Transtorno Dismórfico Corporal é usado para caracterizar uma preocupação com um defeito imaginado na aparência. É o que explica a Yara Azevedo Prandi, médica na rede Omint e mestre em psiquiatria pela FMUSP. “Mesmo que uma pessoa apresente alguma anomalia física que de fato esteja presente, a preocupação da pessoa é excessiva e incômoda”, esclarece.
A dismorfia corporal aparece geralmente associada a algum outro transtorno mental. “Geralmente depressão, mas também pode ser ansiedade, transtorno obsessivo compulsivo, transtorno alimentar ou até nos casos de psicose”, exemplifica a profissional.
Já as causas variam. Podem ser tanto genéticas, ou decorrentes de experiências de vida. Para Yara, os conceitos estereotipados de padrão de beleza estão na raiz dessa questão. “É muito frequente que a própria mãe fale para filha coisas do tipo, ‘você está muito gorda’ ou da avó falar ‘tem que corrigir o nariz dessa menina”, relata a psiquiatra.
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Tratamento pode ajudar a diminuir prejuízos causados pelo transtorno
O transtorno, além de causar o sofrimento psíquico, como tristeza ou ansiedade por conta do corpo, também interfere no funcionamento dos relacionamentos, tanto interpessoal quanto familiar ou de trabalho.
Mesmo sendo um problema psíquico, muito raramente alguém que sofre do transtorno vai diretamente em busca de ajuda psiquiatra ou psicologa: “como a pessoa está preocupada ou convencida de um defeito imaginado, procuram geralmente os dermatologistas ou os cirurgiões plásticos para correções cirúrgicas”.
Posteriormente, o encaminhamento pode ocorrer quando um médico dermato ou cirurgião plástico, ao invés de atender ao desejo da pessoa de corrigir o defeito imaginado, encaminha-a para tratamento psicológico.
É o que costuma fazer o diretor da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Alexandre Kataoka. “Em cerca de 20% dos pacientes que passam em consulta, eu contraindico a cirurgia naquele momento e peço uma avaliação da equipe de psicologia”, relata o profissional.
Ele ainda explica que pacientes com dismorfia ficam raramente satisfeitos com os resultados de uma cirurgia. “Pessoas com dismorfia quase que invariavelmente ficam frustrados com qualquer que seja o resultado cirúrgico apresentado e buscam a perfeição, algo que inexiste”, explica.
O impacto das redes sociais na dismorfia corporal
Um ponto também destacado por Yara é que o Transtorno Dismórfico não é um fenômeno atual. Ele foi descrito e reconhecido há mais de 100 anos, porque o ser humano sempre se comparou. “Nós somos seres relacionais e faz parte do psiquismo normal, a partir das relações, que exista alguma comparação”.
O problema, no entanto, aumentou a partir do crescimento dessa comparação com o uso das redes sociais. O transtorno, que antes aparecia em uma idade mais avançada, agora atinge até mesmo crianças e pré-adolescentes, com a entrada precoce na internet.
Igualmente, o uso de filtros de câmeras de celular também pode ser um problema. “O espelho hoje é a nossa tela e a pessoa vive com uma imagem irreal que é a partir do filtro”, justifica a profissional. “Se todo dia eu vejo a minha foto como um filtro aplicado, eu convivo mais com a imagem com o filtro do que com a minha imagem real”.
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Se por um lado os filtros e as falsas imagens de corpos podem gerar comparações, por outro lado, a internet também tem espaço para influenciadores que buscam trazer conteúdos positivos sobre aceitação da autoimagem.
É o caso de Laura Pace, ou Laurinha, como é conhecida pelos seus mais de 450 mil seguidores no TikTok. Em seus vídeos, ela compartilha com orgulhos partes do corpo que costumavam ser uma insegurança.
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“Comecei o meu processo na pandemia. Eu tinha muita ‘nóia’ de querer emagrecer, mas nunca tive um corpo magro, porque simplesmente não era meu biotipo. Mas durante a pandemia, acho que percebi que muitas coisas eram mais importantes do que uma aparência e uma questão estética”, recorda a jovem.
Antes disso, passou muitos anos buscando mudanças no corpo e se comparando com outras pessoas que seguia nas redes sociais: “toda meta de todo ano novo era emagrecer. Eu pensava que tinha que chegar nesse corpo ideal”.
Enxergar representatividade de corpos nas redes sociais é importante
Laura conta que sempre fez exercício e sempre se alimentou bem, então não entendia os motivos de não emagrecer. Até que seu questionamento mudou, e ela começou a querer entender outra coisa: se tinha uma rotina saudável, porque, então, ainda não estava satisfeita?
“Eu vi que o problema não era comigo, mas com aquilo que tinham me ensinado. Quando eu entendi que aprendi a me odiar, decidi tentar me enxergar de uma maneira diferente. Então decidi compartilhar isso nas minhas redes”
Logo seus conteúdos viralizaram, e vieram os comentários de outras pessoas que, a partir de seus vídeos, também mudaram sua forma de pensar. “É uma loucura! Recebo muitos comentários positivos. Pessoas que tiveram coragem de ir para a praia com biquíni curto só pelo meu vídeo”, compartilha.
Hoje, seu principal objetivo na internet é fazer com que as pessoas se sintam confortáveis. “Quero mostrar que está tudo bem e que o mundo não vai acabar porque você engordou. Existem coisas que a gente tem que agradecer muito pelo nosso corpo. Afinal, você só está vivendo porque o seu corpo existe e ele faz tudo para você”, finaliza a influencer.
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