Sitah participa da exposição “Xingu: contatos”, em cartaz no IMS Paulista
O projeto autoral Mulheres do Xingu propõe um novo olhar para as líderes xinguanas e ressalta o protagonismo das mulheres indígenas na luta pela preservação da floresta e manutenção das tradições, rituais e saberes ancestrais, e consolida o trabalho da artista especialista em Amazônia.
Em cartaz até abril de 2023 no IMS Paulista (Instituto Moreira Salles), a exposição Xingu: contatos propõe um diálogo entre imagens históricas e as produções contemporâneas realizadas no Território Indígena do Xingu. Primeiro grande território indígena demarcado no Brasil, em 1961, o Xingu é a casa de povos originários que enfrentam há séculos diversas formas de intervenção e violência. Ainda alvo de ameaças, o território, localizado no estado do Mato Grosso, é habitado atualmente por mais de 6 mil indígenas, de 16 etnias.
Essa trajetória de lutas e resistências é revisitada na exposição, cuja curadoria é do cineasta Takumã Kuikuro, diretor de documentários como As hiper mulheres (2011), e do jornalista Guilherme Freitas, editor-assistente da Serrote, com assistência de Marina Frúgoli. Com entrada gratuita, a mostra tem como destaque principal a produção audiovisual contemporânea de artistas e comunicadores indígenas. Também são exibidos imagens, reportagens e outros documentos produzidos no território por não indígenas desde o final do século 19 até hoje.
Entre os artistas participantes, está a fotógrafa Sitah, autora de uma série de retratos de lideranças e articuladoras femininas atuais do território do Xingu. Especialista em antropologia visual e Amazônia, Sitah inova ao propor uma reparação histórica da imagem das mulheres indígenas dentro e fora das aldeias, retratando-as como lideranças, criando e compondo este ensaio à maneira que elas escolheram ser fotografadas. Movidas pelo desejo de igualdade, as mulheres vêm quebrando paradigmas e assumindo o protagonismo, em defesa de seu território.
Sitah apresenta um outro olhar fotográfico de mulheres indígenas no Xingu com uma perspectiva contra-hegemônica. Foto: Divulgação
Coletividade e união no Xingu
Sitah atua junto ao Movimento de Mulheres do Xingu desde 2018. Historicamente, a maneira como as mulheres indígenas foram fotografadas ao longo dos séculos sempre foi motivo de incômodo e debate para toda a comunidade indígena. Até então, a grande maioria das imagens retratou as indígenas sob um um prisma machista e colonizador, objetificando os corpos femininos e perpetuando uma imagem folclórica, idealizada e muitas vezes fantasiosa dos povos originários. Essas mulheres revelam que por vezes se sentiram violadas por terem suas imagens roubadas e seus corpos nus expostos dessa maneira.
“A maneira como as mulheres do Xingu querem ser fotografadas e como o mundo passa a ver essas mulheres a partir desse novo registro é fundamental e urgente, e para mim é a retratação de um erro histórico. As mulheres são as principais responsáveis por manter as tradições, os rituais e os saberes ancestrais, e lutam pela preservação da Floresta dentro e fora das aldeias. ” ressalta Sitah.
O projeto fotográfico, idealizado em comunhão com as indígenas, retrata lideranças mulheres, cacicas, pagés e jovens em formação TIX (Território Indígena do Xingu). A liderança xinguana Watatakalu Yawalapiti e a pagé Mapulu Kamayurá são algumas das personagens retratadas na mostra. Watatakalu é coordenadora do departamento de mulheres da Associação Terra Indígena Xingu (Atix) e membro do Movimento Mulheres do Xingu, que desde 2003 reúne mulheres de diversas etnias com o objetivo de resgatar o protagonismo feminino. Ela também integra o conselho consultivo da exposição e participa do catálogo da mostra, que será lançado em breve, com um depoimento.
Iré Kayabi, Mapulu Kamayurá e Watatakau Yawalapiti, mulheres fotografadas por Sitah. Foto: Sitah
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Importância da liderança feminina
Nos últimos anos, é crescente o número de mulheres ocupando posições de liderança dentro e fora das aldeias, inclusive no Congresso Nacional. Dentro do território, as anciãs treinam as novas gerações e estimulam a participação na tomada de decisão e o estudo da língua portuguesa, por exemplo.
“Isso vai ficar pra história, as mulheres que vão estar lá na exposição são mulheres que lutaram, são mulheres que conquistaram espaços dentro da política indígena do território indígena do Xingu junto de muitos homens, alguns não estão mais aqui como meu pai e meu tio, mas que conquistaram muitos direitos que nós temos hoje dentro da cultura não indígena. Por muitos anos foram feitos vários trabalhos sobre o Xingu, e pouco se falou sobre a mulher até então e quando falava era pra mostrar a nudez. Sempre dessa forma, sempre a mulher calada, sem mostrar a importância do papel dessas mulheres na organização do Território. Sem elas a luta, a resistência, o movimento indígena e a preservação da cultura não seria possível. Somos nós que herdamos a cultura , somos nós que aprendemos isso das nossas mães, das nossas avós e hoje nossos filhos aprendem isso com a gente, sem o território não existe a cultura indígena.”, ressalta Watatakalu Yawalapiti, retratada pela artista e coordenadora do departamento de mulheres da Associação Terra Indígena Xingu (Atix) e uma das líderes do Movimento Mulheres do Xingu.
Atualmente, existem duas fortes lideranças femininas para as 17 etnias xinguanas dentro da base do TIX (Território Indígena do Xingu), a pagé Mapulu Kamayurá no Alto Xingu, e Wisió Kayabi no Baixo Xingu, que trabalham para que as mensagens sejam levadas adiante pelas mais jovens e mais mulheres possam se unir a essa luta.
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