Beleza natural: por que aceitar o próprio corpo é tão difícil?
Embora os padrões de beleza sejam sufocantes, é possível manter uma relação afetuosa e saudável com o corpo praticando a beleza natural.
Os padrões corporais e as pressões estéticas são fenômenos culturais e políticos conhecidos já há bastante tempo. As capas de revista com mulheres magras e a exigência, até pouco tempo atrás, para que as modelos apresentassem um peso padrão, são marcas recentes da presença desse problema.
Recentemente, o tema voltou ao debate público de forma intensa a partir da participação da cantora Sandy no programa 50 & Tanto (Globo), apresentado por Angélica. Na entrevista, a artista reconhece que sente receio em aparecer sem maquiagem, além de ter dificuldades em se olhar no espelho de “cara limpa”. “Não me sinto à vontade para que as pessoas me vejam nua e crua”, disse à apresentadora. Segundo Sandy, ela não anda sem maquiagem. “Em casa, depende. Eu não me acho bonita e não me sinto confortável”, afirmou.
A declaração de uma cantora reconhecida nacionalmente provocou muita repercussão sobre a fala. Isso porque a pressão estética está presente de forma muito mais forte nas mulheres. É frequente a busca por dietas restritivas, procedimentos cirúrgicos e remédios para emagrecer. Dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBPC), por exemplo, mostram que, entre 2014 e 2019, o número de harmonização facial cresceu de 72 mil para 256 mil ao ano.
Como assumir a beleza natural?
Apesar de ser uma questão generalizada, os problemas de aceitação podem afetar com maior impacto as pessoas negras, LGBTQIAPN+ e PCDs. No passado, por exemplo, quem tinha o cabelo crespo e cacheado sofria preconceito e carregava o desejo de utilizar as ‘chapinhas’ ou produtos químicos, mascarando a beleza natural e a diversidade desses corpos.
Aceitar as marcas, cicatrizes, ausência ou presença de massa corporal, além de um incômodo ou outro com o cabelo, é parte do trabalho em assumir a beleza natural. O corpo, diferente de um produto no mercado, é um organismo vivo, repleto de histórias, vivências e características: sociais, culturais e genéticas. Para a sexóloga Bárbara Bastos, o caminho inicial é buscar o autoconhecimento e a aceitação. “Quando há segurança e confiança em si, dificilmente você sentirá necessidade de se produzir até para ir à padaria de manhã”, explica a especialista em Terapia Cognitiva Sexual. Segundo ela, é preciso reconhecer os pontos fracos e fortes, mas usá-los a seu favor.
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E é claro que não há problema algum em se cuidar. Praticar rotinas de autocuidado e realizar consultas periódicas com especialistas é fundamental para manter o corpo saudável. “O autocuidado deixa de ser seguro e se torna patológico quando alguém de 50 anos quer ter a aparência de uma pessoa de 20”, destaca Bárbara.
Ter rugas e marcas de expressão, gorduras no corpo e assumir o cabelo grisalho se tornou um ‘defeito’ ou desleixo. “Esse comportamento é nocivo, desnecessário e irreal”, complementa.
Por que envelhecer incomoda tanto se é um processo natural?
O envelhecimento não pode ser pincelado com eufemismos. O corpo já acumula muitas experiências e não tem mais a mesma maestria dos 20 anos. Há, de fato, limitações. Para Monica Machado, psicóloga e fundadora da clínica Ame.C, utilizamos o corpo para viver e sobreviver, por isso que, naturalmente, ele irá se desgastar. “O que buscamos por meio desses procedimentos no corpo são histórias que queremos manter, que já foram vividas e não poderão ser eternas”, destaca a especialista, pós-graduada em Psicanálise e Saúde Mental.
Segundo Monica, alguns caminhos são necessários para praticar o acolhimento e autocompaixão. Ela sugere, por exemplo, deixar a idealização de lado e assumir quem somos, mesmo que existam imperfeições.
“Criar padrões irreais fazem com que as pessoas não consigam mais se enxergar no espelho e se perceberem como de fato são”.
Já o especialista Luís Maatz, cirurgião plástico pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC/FMUSP), destaca que manter uma rotina de autocuidado nem sempre é sinônimo de se tornar refém de padrões e procedimentos cirúrgicos. Por isso, explica que as pessoas podem buscar rotinas alimentares mais saudáveis, suplementação – quando indicado por um profissional -, além de uma prática de exercícios físicos constante.
Assumir a beleza natural me proíbe de fazer procedimentos estéticos?
Essa tem sido a pergunta que Luís Maatz tenta responder aos pacientes ao longo do tempo. O médico cita que, historicamente, a humanidade sempre buscou corpos musculosos, fortes e atléticos. “Se relacionam, em última instância, com saúde, fertilidade e capacidade de resistência física”, explica. Por outro lado, destaca que procura reeducar as pessoas que o procuram durante a ida ao consultório. “Eles devem procurar a melhor versão de si, não essa beleza inalcançável.”
É o que também acredita a sexóloga Bárbara Bastos, que reafirma a defesa do autoconhecimento. Segundo ela, isso traz segurança, descobertas sobre quem é e autonomia para decidir o melhor para si, se esquivando de influências e orientações do mercado. “Se essa pessoa decidir fazer algum procedimento estético, provavelmente será por um desconforto pessoal, e não por modismos e pressão social”, completa.
Embora não se deva pressionar alguém para adotar um padrão estético, o mesmo não pode ocorrer para que ela se aceite. “Precisamos ter bom senso e não criar rótulos. Na dúvida, espere a pessoa se manifestar, deixar claro suas escolhas e preferências”, orienta.
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Inspire-se com esses influenciadores da beleza natural
1. Cris Pàz (@eucrisguerra)
Nascida Cris Guerra, concluiu a graduação em Comunicação e adorava contar histórias, mesmo que fossem de 30 segundos. Um dia, num impulso, tirou a primeira foto de uma série que chamou de Hoje Vou Assim, o primeiro blog de looks do dia do Brasil. Seis anos e 1200 looks depois, nascia o segundo livro, Moda Intuitiva, sobre como o vestir pode ser uma expressão para viver melhor. Centenas de colunas, crônicas, palestras, podcasts e postagens nas redes tomaram o lugar da publicidade. Colaborou com diversas revistas e publicou 8 livros, três deles best-sellers. Com 53 anos, é uma das vozes brasileiras quando o tema é longevidade e combate ao etarismo, no comando do podcast 50 Crises.
Foto: Divulgação/ Cris Pàz
2. Rafael Brunelli (@rafabrunelli)
Rafael Brunelli, também conhecido como Rafa, é um influencer e produtor audiovisual que se destaca por sua abordagem inclusiva, abraçando identidades como pessoa com deficiência (PCD), não-binária, pansexual e pisciano. Com uma carreira iniciada em 2008, Rafa migrou para a internet em 2018 e começou a criar conteúdo próprio em 2020. Ele desafia padrões corporais e promove debates inclusivos sobre relacionamentos, destacando a complexidade das experiências das pessoas com deficiência. Seu conteúdo busca criar um espaço inclusivo e empoderador, especialmente para aqueles que, como ele, enfrentaram desafios em relação à aceitação e amor-próprio.
Foto: Reprodução/ Instagram
3. Nátaly Neri (@natalyneri)
Nataly Neri é um fenômeno no YouTube, onde, desde 2015, compartilha sua “jornada em busca de autonomia intelectual, mental e de consumo”, como destaca na descrição de seu canal. Transitando por temas que abrangem sociedade e questões de gênero, ela compartilha sua experiência como seguidora do slow beauty. Com formação em cosmetologia natural, Nataly aborda frequentemente esse tema em seus vídeos, oferecendo tutoriais sobre como criar maquiagens e produtos de cuidados com a pele em casa.
Foto: Divulgação/ Instagram
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