Por que tantas pessoas sentem um vazio emocional na vida?
Já sentiu que algo estava faltando na sua vida, mesmo sem motivos aparentes para isso? Qual será a verdadeira causa? E como curar essa dor?
A sensação de vazio emocional pode manifestar-se de diferentes maneiras e variar na sua intensidade. Às vezes, instala-se através de um cansaço contínuo ou de uma rotina em que os dias parecem todos iguais. Em outros momentos, é descrita através da falta de emoções positivas, como alegria ou entusiasmo. Ou ainda como um sentimento de ausência de significado ou propósito de vida. A verdade é que esse estado de desconforto emocional acaba tantas vezes por ser subestimado por nós e pelos outros. A falta de clareza sobre o que exatamente está faltando torna desafiador explicar ou saber o que fazer com essa carência.
Acontece que, em termos psicológicos, esse vazio interior não é apenas uma falta superficial, mas uma lacuna emocional profunda. Ele está muitas vezes ligado a uma desconexão entre áreas do cérebro responsáveis pelas emoções (como o sistema límbico) e o pensamento lógico (representado pelo sistema pré-frontal).
Compreender essa dinâmica ajuda-nos a entender que o sentimento de vazio precisa ser encarado de um novo modo. Não como um problema a ser combatido, mas como um mensageiro que precisa ser escutado.
5 possíveis causas do vazio emocional
Fases de transição
Essa sensação de vazio geralmente surge em fases de transição de vida. Pode acontecem com a passagem da adolescência para a vida adulta ou da vida adulta para a velhice. Nessas circunstâncias, as pessoas costumam se sentir um pouco perdidas diante do mundo. Com uma sensação de já não serem quem eram, mas também de não saberem ainda quem são. Tornar-se mãe/pai, mudar de cidade, de emprego ou até de relação pode também abrir espaço a esse sentimento de desnorte interior.
Lutos e perdas
Outro momento de vida em que esse vazio emocional pode manifestar-se é quando um ente querido se afasta ou morre. A ausência física ou emocional daqueles que amamos pode criar um vazio profundo, como se parte de nós também se perdesse nesse processo. Nesses momentos, é comum sentir-se desconectado do mundo, questionando o significado e a razão por trás dessas perdas. A dor da separação pode ser avassaladora, fazendo com que o futuro pareça incerto e desprovido de propósito.
Excesso de estímulos e foco no exterior
Pode parecer estranho, mas quando estamos imersos num mar de estímulos externos, podemos sentir-nos paradoxalmente vazios. A constante busca por atender às expectativas externas – como “eu preciso de…”, “eu tenho que…”, “eu deveria fazer tal coisa…” – muitas vezes nos afasta do nosso eu interior autêntico. Ouvimos tantas vozes externas que a nossa própria voz interior fica abafada. Essa desconexão pode resultar num vazio emocional, onde nos sentimos perdidos e distantes da nossa verdadeira essência.
Escolhas insatisfatórias e falta de autoconhecimento
O vazio emocional também pode surgir quando percebemos que as escolhas feitas em diversos aspetos da vida não nos trouxeram a satisfação desejada. A constatação de uma vida que não reflete nossos verdadeiros anseios pode gerar uma sensação de desencanto e desorientação. Ao mesmo tempo, a ausência de uma compreensão profunda de quem somos, de nossos valores e necessidades fundamentais, pode criar um vácuo emocional. Quando nos encontramos presos em trajetórias que não nos preenchem, é como se um abismo se formasse entre o que somos e o que aspiramos ser.
Experiências traumáticas
O vazio emocional também pode se manifestar após passarmos por eventos traumáticos, independentemente da sua dimensão. Muitas vezes, para nos proteger de situações dolorosas, o corpo dissocia-se para reduzir a dor emocional imediata. É como se criasse uma espécie de “distância” psicológica do evento traumático. Contudo, se o trauma não for processado, pode criar uma sensação de dormência, impotência ou desamparo permanentes. Como se o mundo perdesse sua cor e significado. Como se nos desligássemos não só da dor, mas também do prazer.
SAIBA MAIS: Entenda na prática o impacto dos traumas emocionais da infância
Todo excesso esconde uma falta
Independentemente das possíveis causas, o sentimento de vazio é semelhante a estar “oco” por dentro. Como se algo ou alguém tivesse arrancado todo o nosso conteúdo interior. A dor dessa falta cravada no peito, pesa-nos no corpo e leva-nos a procurar formas de preencher esse vazio.
Algumas pessoas buscam desesperadamente um parceiro afetivo na esperança de encontrar nesse relacionamento o complemento que falta. Outras recorrem à compulsão por comida, álcool, trabalho, compras ou até mesmo exercício físico, tentando preencher o vazio com distrações ou gratificações momentâneas.
Esses excessos podem agir como uma espécie de cortina de fumo, obscurecendo a verdadeira origem da falta que sentimos. Contudo, eventualmente, a sensação de falta retorna.
Precisamos então olhar para o sentimento de vazio com mais curiosidade e menos aversão. Entendê-lo mais como um sintoma e ser capazes de examinar em profundidade as necessidades e anseios que lhe estão subjacentes. Geralmente se há um sentimento de vazio, é porque algo nos falta. Mas o quê exatamente?
Não é vazio, é desconexão
Se observarmos de perto, as situações que nos conduzem ao sentimento de vazio são aquelas que sobrecarregam o nosso sistema nervoso. São as que dificultam nossa capacidade de gerir emoções e processar nossas experiências. Quer seja durante fases de transição que demandam adaptações significativas. Quer seja enfrentando perdas que desafiam nossa compreensão da realidade. Ou até diante de um excesso de pressões sociais e profissionais.
Todas essas circunstâncias podem ser avassaladoras, levando o corpo e a mente a uma espécie de autoproteção. Frequentemente, quando não conseguimos lidar com o que sentimos, ligamos o piloto automático. Desconectamo-nos. Assim, vamos varrendo as emoções dolorosas para debaixo do tapete e escolhendo (consciente ou inconscientemente) enterrar sentimentos em vez de lidar com eles.
A verdade é que fugir das emoções e ligar piloto automático pode, à primeira vista, parecer uma opção mais fácil. Contudo, o preço que pagamos por essa desconexão é significativo. Vamos substituindo sentimentos intensos por uma desagradável sensação de dormência.
Isso ajuda-nos a perceber aquilo que nem sempre é óbvio: o vazio que sentimos é, na verdade, uma falta de nós mesmos. Uma falta de ligação com o nosso mundo interno e uma ausência de presença em nossas próprias vidas. A gente sente vazio da gente! Como uma flor arrancada do próprio solo.
Reconhecer isso é um chamado para a autoexploração, para uma reflexão sobre nossa relação connosco mesmos. Sobre como é viver na nossa própria pele. Há momentos em que o encontro com o vazio nos faz perceber que ele não é um lugar ermo. Mas um lugar onde vive, por exemplo, uma tristeza não chorada. Uma frustração não processada. Uma ansiedade não regulada.
O sentimento de vazio é, afinal, uma grande oportunidade. É como um chamado para nos voltarmos a ligar. Eu sei que é contraintuitivo. Mas abrirmo-nos a conhecê-lo é um convite para enfrentarmos as emoções que fomos abandonando e desconsiderando dentro de nós.
Ora: se já percebemos que o vazio é um sinal de que estamos desconectados, é óbvio que precisamos de nos reconectar. Mas como?
O que fazer com o sentimento de vazio?
1. Observar (e melhorar) a nossa rotina
Eu sei que parece simples demais. Mas comece por parar para vivenciar o momento presente. Desde o despertar até ao início das tarefas profissionais. Ao acordar pela manhã, o que faz? E como se sente? Qual o tempo que tem entre despertar o corpo e começar a dar conta das suas obrigações? E depois do trabalho, para onde vai e como se sente? Às vezes, o vazio se instala porque estamos literalmente vivendo no “automático”. O problema nem sempre é a rotina e as atividades em si, mas a forma como estamos nelas.
2. Criar tempo para sentir
Geralmente não aprendemos a abrir espaço para perceber nossas emoções e necessidades. Para além disso, quase não temos tempo na nossa rotina para sentir e regular nossas próprias emoções. Temos um compromisso atrás do outro! Mas quando o vazio aparece, pode ser um sinal para explorar o que estamos realmente sentindo e do que estamos precisando. Procure identificar os momentos em que ele aparece e os sentimentos envolvidos. Busque formas de expressar ou dar espaço para essas emoções. Lembre-se que elas precisam fluir, tendo um início, um meio e um fim. Como vimos anteriormente nem sempre a sensação de vazio significa que não temos nada dentro de nós. Muitas vezes, temos é demasiadas emoções congeladas e não processadas e não sobra espaço para mais nada. É como se a nossa vida emocional asfixiasse. É hora de limpar e arejar essa morada interna!
3. Praticar técnicas de (co)regulação emocional
Utilize ferramentas como a atenção plena (mindfulness) e a expressão criativa para processar emoções. Construa relacionamentos que promovam conexões genuínas. A busca de apoio social, de compreensão e empatia são cruciais em momentos de vulnerabilidade. Exercícios de respiração e a busca ativa pelo autoconhecimento também são valiosos no processo de se reconectar com você. Descobrirmos quais são os nossos recursos reguladores (seja a música, a natureza, a escrita ou a arte) torna-se fundamental para que consigamos regularmos. Lembrando que um sistema nervoso regulado, é um sistema nervoso (re)conectado.
4. Se conhecer e adotar uma abordagem compassiva
Ao ser compassivo consigo mesmo, torna possível transformar o vazio em uma oportunidade para construir uma vida mais autêntica e significativa. A prática da autocompaixão envolve reconhecer que somos humanos e que enfrentar desafios, incluindo o vazio emocional. Em vez de se julgar severamente, permita-se aprender com suas experiências. Permita-se habitar esse vazio e conhecê-lo. Faça amizade com as partes em si que se sentem sozinhas ou desconectadas. Não há nada mais poderoso do que nos oferecermos aquilo que precisamos.
O vazio é um portal para o autoconhecimento
Este sentimento, muitas vezes desconcertante, atua como um guia sutil, apontando para as áreas negligenciadas da nossa vida emocional. Em vez de encará-lo como uma simples falta, podemos vê-lo como um eco das nossas emoções não processadas e necessidades profundas.
Em última análise, o vazio emocional é mais do que a ausência de algo. É um convite para uma jornada interna de autodescoberta e transformação.
À medida que nos aventuramos no terreno do vazio, descobrimos que ele é um portal para o autoconhecimento e a regeneração emocional. Em vez de procurar desesperadamente preenchê-lo com distrações externas, podemos abraçar a oportunidade de reconectar-nos com nossa essência interior. Assim, a busca por significado e plenitude torna-se uma jornada interna, onde aprendemos a acolher as partes de nós mesmos que foram esquecidas ou negligenciadas.
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