O Universo fecha uma porta e abre cinco

Como é desesperador ver o resultado de um trabalho que exigiu muito esforço, com tudo para ser bem-sucedido, ruir de uma hora para outra. Você olha para a frente e para os lados e vê todas as saídas bloqueadas, sem nenhuma fresta de esperança para continuar avançando. E quando tudo parece perdido, surge uma luz para iluminar o caminho que deve ser trilhado. Essa é uma história pessoal de crença e superação.

Em 2003, aceitei um grande desafio. Fui convidado pelo IOB (Informações Objetivas) a produzir uma obra em cinco módulos. Era um TPD (Treinamento Programado a Distância). Os livros todos ilustrados eram comercializados em fascículos. No final de cada matéria havia exercícios de fixação, de autoavaliação, propostas de trabalho e testes. Os próprios leitores mediam o aprendizado e realizavam as provas. Aos aprovados era fornecido certificado de conclusão. No final, recebiam também uma pasta plástica muito bonita para encadernar os módulos.

A proposta era que eu escrevesse livros diferentes daqueles que já havia publicado e também distintos dos que estavam no mercado tratando do mesmo tema. Foram meses de intensa tarefa, fazendo, refazendo, revisando, corrigindo, aprimorando, até ficar pronto com o título de “Técnicas e segredos para falar bem”. Um resultado bem acima do esperado por mim e pela editora.

Para o seu lançamento, foram programadas palestras nas 27 maiores cidades do país. Um enorme sucesso. Como os gerentes das unidades se dedicavam à divulgação do evento, as plateias estavam sempre lotadas, algumas até com 1.500 pessoas. Um dia antes de me apresentar, participava de entrevistas em emissoras de rádio e televisão com o objetivo de pôr mais gente ainda no auditório. No final, os representantes da empresa cuidavam das vendas. 

Sucesso de vendas, mas por pouco tempo

Com essa inciativa bem-sucedida, a primeira edição se esgotou rapidamente. Assim como a segunda. Animados com o resultado, novos exemplares foram impressos. Aí ocorreu um fato surpreendente e preocupante.

Houve uma mudança na administração da empresa, e resolveram desativar o departamento que cuidava desses treinamentos à distância. Os mesmos vendedores das assinaturas dos boletins que atualizavam as modificações na legislação fiscal e tributária passaram a vender também os cursos. Um fracasso. Enquanto uma assinatura dos boletins custava, por exemplo, 100, o curso era vendido por 30. É evidente que a motivação para oferecer o TPD desapareceu.

Aconteceu até um caso curioso. Uma aluna que havia comprado o curso quis outro para dar de presente para um gerente da sua empresa. Chamou o representante para fazer o pedido. O vendedor se dedicou só a falar do boletim. No final ela comprou o produto mais caro e acabou por não adquirir o curso.

Por esse motivo, as vendas despencaram, chegando quase a zero. Uma pena, pois já estava provado que com uma ação comercial eficiente o resultado era bastante positivo. O que fazer? Se deixasse a situação seguir o próprio curso, a obra desapareceria. Por outro lado, como interferir nas operações da empresa? Afinal, eu era apenas um autor, como muitos outros.

Fiquei sem chão. Tanto trabalho, tanta dedicação, tanto cuidado, tudo dando certo, e na hora de colher os frutos, morrer na praia. Algo precisava ser feito.

Um plano para salvar a situação

Bolei um plano. Conversaria com o presidente da empresa, que me fizera o convite para escrever. Mostraria a minha frustração com o resultado. Provavelmente ele diria que havia ocorrido mudanças na grade de produtos e, naturalmente, as vendas não estavam indo bem. Sem muita esperança de reverter. Eu sabia que eles estavam com um estoque de aproximadamente dois mil exemplares. Esses livros poderiam ser muito bem utilizados como material didático nos meus cursos. Se o preço fosse razoável, valeria a pena adquiri-los.

Fui lá com a minha filha Rachel. Eu queria que acompanhasse todo o processo. Pressentia que, com o interesse que ela demonstrava pelo meu trabalho, possivelmente seria a minha sucessora.

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O encontro aconteceu exatamente como havia planejado, semelhante a um filme, com começo meio e fim. Como os livros ficariam encalhados e até poderiam estragar com o tempo, eu propus comprar todo o estoque pelo preço de custo, desde que me transferissem o direito de publicar a obra por outra editora. Topou na hora. O distrato já estava pronto comigo, bastava apenas a nossa assinatura. Saí de lá com tudo resolvido. No dia seguinte me enviariam todos os exemplares. Bom para eles e bom para mim. Todo mundo ganhou.

Novas portas pelo caminho

A Editora Saraiva, que publicara meus outros livros, ficava próxima do IOB. O então gerente comercial, Nilson Lepera, com quem eu mantinha estreito relacionamento, estava de férias. Por isso, sem mesmo marcar, eu me dirigi até lá para falar com o grande chefe da editora, Wander Soares. Apresentei a obra e mostrei que seria possível publicar cinco novos livros com aquele material. Eu faria rapidamente as adaptações necessárias. Ele nem precisou de tempo para pensar. Concordou ali mesmo, durante a nossa conversa. Eu e a Rachel fomos a um restaurante comemorar o resultado.

Dois desses livros entraram para as listas dos mais vendidos do país. Um deles serviu de base para a edição da obra “Oratória para advogados”, o livro de oratória para advogados mais vendido na nossa história. Alguns deles estão hoje em 39 países. 

Pois é, essa é uma história de uma porta que se fechou, mas que o Universo conspirou para que outras cinco se abrissem. Acredito muito nessa sequência da vida. Quando tudo parece estar bloqueado, com uma ou outra inciativa e determinação, o futuro acaba por se apresentar de maneira bastante promissora.

*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.