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O que os esquimós podem nos ensinar sobre propósito
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Em sua coluna, Patrick Santos compartilha lições da cultura esquimó sobre a morte e o que elas podem nos ensinar sobre propósito e pertencimento.

Existe um provérbio que diz: “A sociedade avança quando os velhos plantam árvores em cuja sombra eles sabem que nunca vão se sentar”.

Recorro a ele na abertura desta minha coluna de hoje em Vida Simples porque sinto, mais do nunca, que precisamos resgatar o sentido mais profundo da nossa existência, algo que foi se perdendo à medida que transformamos nossa jornada na corrida em busca do nada.

Às vezes, tenho a sensação de que estamos vivendo como hamsters, correndo feito loucos dentro de uma roda e nos esforçando cada vez mais para não conseguir sair do lugar.

Vivemos uma grande crise de sentido.

Ainda bem que alguns povos estão aqui para nos mostrar que existem outros caminhos e outras formas de se relacionar com a vida. Como já mencionei em outras ocasiões, o futuro pode estar no passado.

Bom, deixa eu explicar o porquê dessa abertura tão reflexiva.

O papo de hoje vai te levar a um dos lugares mais remotos do planeta e conhecer uma cultura com valores bem fortes e, o mais importante, com muito propósito. Vamos nessa?

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A vida no Polo Norte

Terminei de ler, recentemente, o livro “No País das Sombras Largas”, de Hans Ruesch, uma ficção sobre a vida no Polo Norte baseada em fatos antropológicos reais.

Confesso a vocês que fui capturado pela história, um tanto violenta, é verdade, mas cheia de ensinamentos de um povo que é capaz de viver nos limites da resistência humana e, ainda sim, buscar sentido em tudo que fazem.

No livro, o autor descreve os hábitos sociais, sexuais, alimentares, crenças religiosas e práticas médicas dos esquimós. É um relato sobre viver em uma comunidade que, com a chegada do homem branco, se afastou para as regiões mais distantes, a fim de manter a sua identidade e a sua eterna aliança com a natureza.

Tudo numa descrição bem detalhada, afinal, não estamos familiarizados com a região e seus costumes, sua maneira de pensar, de viver e sobreviver. E aqui está a beleza da história que, em muitos momentos, nos leva a repensar as leis que regem a moralidade atual, trazendo muitos questionamentos. E olha que o livro foi escrito em 1950.

Relação com a morte

A relação dos esquimós com a morte pode ser chocante aos nossos olhos (e de fato é), mas tem uma mensagem simbólica com a natureza e o princípio de pertencer a algo maior que mexe com a gente de alguma maneira.

Eles nos ensinam que somos parte da natureza, não estamos separados dela, como nos fizeram acreditar desde que o homem se fechou em si. Nunca, ao longo da nossa história, estivemos tão distantes da natureza como nos dias de hoje.

No livro, Hans Ruesch nos conta que quando a pessoa fica idosa e perde a “vitalidade” – a vitalidade está muito atrelada à capacidade de fazer e produzir a sua utilidade na comunidade – ela “caminha” para a morte. Caminha literalmente.

Estão preparados para o que vem a seguir?

Numa das cenas, uma senhora, mãe de Ernenek, um dos personagens, sai do iglu (local onde residem) num determinado momento do dia (não tem despedida alguma) e caminha em direção ao nada até ser comida por um urso. A razão foi o fato de ela ter se tornado incapaz de ajudar no dia a dia, pois já tinha perdido todos os seus dentes. Os dentes, na cultura esquimó, eram fundamentais para mastigar o pelo do urso, para costurar e cortar tudo nos serviços domésticos.

Cumprir a missão

Na cultura dos povos do ártico, ela “cumpriu” sua missão, entrando no ciclo da natureza. Assim como os esquimós abatem o urso para se alimentar, os ursos também se alimentam de humanos.

Tudo é consciente, não tem sofrimento, choradeira ou sentimentos de perda. O idoso, na cultura dos esquimós, se vê também como uma oferenda, entregando sua vida à comunidade. O urso vai ficar forte e depois dará cria e, em algum momento, servirá de comida para a família.

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Busca de sentido

Sim, eu sei que você deve estar chocado com a cena descrita acima. Também fiquei durante a leitura e não pude deixar de refletir.

Vivemos outros tempos, o mundo mudou e dificilmente se poderia encontrar hoje, mesmo no mais remoto trecho dos gelos eternos do Polo Norte, alguém como Ernenek e os esquimós. O que é uma pena, eu diria. Os homens destes tempos globalizados teriam muito a aprender com eles.

Claro que não estou dizendo que precisamos chegar ao final da vida e nos oferecermos para ser presa de alguém. Mas podemos, sim, chegar ao fim da nossa jornada entregando o nosso melhor.

E sabe qual é o melhor caminho?

Viver a vida de acordo com nossos valores mais profundos, de modo que, quando chegarmos à velhice, tenhamos algo a acrescentar ao outro.

E aí, vamos plantar uma árvore?

Leia todos os textos de Patrick Santos em Vida Simples.


PATRICK SANTOS (@patricksantos.oficial) é jornalista, escritor e apresentador do podcast 45 Do primeiro tempo que semanalmente traz histórias de pessoas que se reinventaram. É autor também do documentário “Pausa”. Depois do sabático em 2018, tem tentado ser o mais coerente possível em sua vida.

*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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