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O papel das emoções na nossa vida
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As emoções podem perturbar a mente e adoecer o corpo; mas também podem acalmar e curar. Saber geri-las é a chave para a vida boa

O mês passado, enquanto fazia uma Live, comentei que não somos seres racionais. Há um esforço, há tentativas para a racionalidade. Logo na sequência recebi inúmeras mensagens. Alguns queriam compreender melhor a questão, outros buscavam “receitas” para o exercício racional e outros, finalmente, assumiam que o “eu” emocional é quem atrapalha tudo.

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Muito questionamento depois, chega-se a sua espinha dorsal: as emoções. No início do século XVII, Baruch Spinoza resumiu a questão: a vida é afetar e ser afetado. Afetamos os outros e os outros assim também nos afetam. A vida nos apresenta um determinado conteúdo, ele chega primeiro ao nosso cognitivo, a mente; depois de assimilado e interpretado, vêm as emoções. Somos afetados. E são esses afetos/emoções que medem a nossa presença no mundo e revelam quem somos. O mesmo fato pode provocar emoções diferentes, pode dar alegria ou desgosto, depende de quem sente.

Vista do corpo

Mas, apesar da origem na mente, o palco das emoções é mesmo o nosso corpo, daí estarem diretamente ligadas à nossa saúde. Todas as emoções inegavelmente acontecem no corpo. Suores. Lágrimas. Narinas dilatadas. Alteração da respiração. Tremor. Suor. Taquicardia. Alteração da postura corporal e expressão facial. Rubor. É verdade que algumas só são perceptíveis pelo próprio dono do corpo — mas a manifestação delas é sempre no físico.

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Graças à essa materialização, as emoções são alvo de inúmeros estudos científicos e hoje sabe-se muito mais sobre elas do que há 50 anos. Diante de tudo o que nos acontece, então podemos responder apenas de duas maneiras: com emoções positivas ou negativas. Há muito que se sabe do mal e das doenças que trazem a ansiedade, a raiva, a solidão. Esses estudos evoluíram e agora estuda-se também o impacto das emoções positivas; como a amabilidade, o afeto, a compaixão. Essa última é o foco da psicologia positiva— termo adotado pelo psicólogo norte-americano Martin Seligman em 1998 —  onde ela própria nasceu desses estudos.

Felicidade nas células

Essa pesquisa avançou várias casas com a neurociência. Principalmente depois do livro Molecules of Emotion, de Candace B. Pert. A neurocientista norte-americana provocou uma verdadeira revolução nos estudos sobre corpo e mente quando descobriu que toda superfície da célula tem um receptor que capta as emoções e leva-as para dentro das células. E mais: essa “emoção” tem a capacidade de alterar a frequência e a bioquímica celular. Para resumir uma história longa: as emoções não apenas alteram a nossa fisiologia e comportamento, mas também a nossa genética.

O que sentimos viaja por todo o cérebro e corpo, alterando a química de cada uma das nossas células. Para se ter uma ideia da importância dessa descoberta, Candence Pert, falecida em 2013, é considerada a fundadora da psiconeuroimunologia. Afinal, os batedores da tecla da resignificação estavam certos e têm agora o aval da ciência: quando você muda a sua percepção, você reescreve a bioquímica do seu corpo. Uma pequena mudança de ângulo e você se reinventa, se salva…

E agora?

Com essa descoberta fica tudo resolvido. A partir de agora vamos acolher, cuidar, administrar e acarinhar todas as nossas emoções? Não é tão simples assim. Habitamos demasiado tempo o país da racionalidade e fomos formatados a ignorar as emoções — e aqui é preciso dizer que os homens foram criminosamente prejudicados, muito mais do que as mulheres. Fomos ensinados que certas emoções devem ser silenciadas porque elas não são bem-vindas na sociedade. Pegam mal, são sinais de fraqueza. Uma estratégia completamente equivocada. Freud explica que as emoções reprimidas nunca morrem. São enterradas vivas e acabam vindo à tona da pior maneira — às vezes regressam triunfais pela porta dos fundos.

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O bloqueio das emoções não vem apenas do aval social, vem também da nossa aptidão pelo menor esforço. Vivenciá-las dá trabalho. Envolve habilidade para lidar com os outros, com nós mesmos e com a emoção propriamente dita. Mas agora que temos a prova científica de qual é o melhor o caminho, o jeito é apanharmos a estrada. Por onde começar? A lição primeira é a clássica inscrição do Templo de Delfos: “conhece-te a ti mesmo”. Aprenda a identificar o que te perturba, o que te afeta. Pense, leia, recorra a ajuda de pessoas que convivem com você. Saiba identificar o que você sente.

Rancor e raiva não são a mesma coisa apesar de serem confundidos vez ou outra; despeito e ciúmes são diferentes. E traga a reflexão para tudo o que você sentir. Será que não é um exagero? Isso é realmente muito mau? Procure ser realista e não perca de vista que o que está em causa também é a sua saúde.

Dá-me um exemplo?

Ok. Autoconhecimento, inegavelmente, é importante. E até é uma área que você domina. O problema é mesmo os outros. Há dias que está tudo perfeito, mas sempre aparece algo dissonante e lá se foi o seu equilíbrio. Aprenda a identificar o que e quem tira você do sério e trabalhe para neutralizá-los. Um exemplo: alguém menciona que os seus óculos são medonhos. Possíveis reações: 1 — Literalmente você pode ser reativo e devolver a crítica. Emoção negativa contra emoção negativa; 2— Fingir que não escutou e bloquear a crítica; 3 — Engolir a emoção, ficar ressentido e assumir o papel de vítima; 4 — Afirmar que gosta dos óculos, que eles combinam com você. Nem tudo precisa ser harmonioso, às vezes podemos optar pela irreverência.

Portanto, qual dessas é a resposta mais saudável para o corpo e para a mente? Vejamos: a primeira você aumenta os seus níveis de adrenalina e arruma discussões. As números 2 e 3 são a tentativa de bloquear ou silenciar o que se sente, o clássico “engolir sapo”. Péssimo. A melhor é mesmo a 4.

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Ok. Nem sempre conseguimos reagir da melhor forma. Ou por nossa personalidade, ou pela circunstância ou simplesmente porque tivemos um dia mau. Segredo? Treino. Manter a serenidade e não se deixar dominar pela emoção do outro não é fácil; a conquista da assertividade — aprender a dizer o que se sente sem agredir e sem se transtornar — leva tempo. E para muitas pessoas essas são conquistas da maturidade.

Sem cafeína?

Espera! Então terei de ser menos combativo, morno? Não. Não se trata de arrumar uma versão descafeinada de si próprio, trata-se de trazer para a cena emoções positivas que neutralizam as negativas. A ideia, certamente, é ter o hábito da ponderação. Você não precisa estar sempre na ativa. Outro exercício que ajuda imenso: aprenda a identificar aqueles que tem o poder de despertar em você emoções ruins — também conhecidas como “pessoas tóxicas”. Identifique-as  e implemente um ato muito simples: fuja delas.

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Após a gestão de si próprio e do outro está tudo resolvido? Não. As emoções negativas fazem parte do kit de viver. E você não precisa estar sempre armado para combatê-las. Às vezes, devemos mesmo sentar-nos e tomar um café com as nossas emoções menos boas. Sentir desgosto, tristeza, abandono, frustração e ressentimento pode ser muito saudável. A vivência de emoções negativas alerta-nos para o que não está bem à nossa volta, aponta-nos o que não serve mais,  mostra-nos o que é preciso mudar, o que é necessário para retomar o equilíbrio. Ouça-as, converse com elas. Elas podem, de fato, ser fonte de aprendizados, novos caminhos e lindos recomeços.

Margot Cardoso (@margotcardoso) é jornalista e pós-graduada em filosofia. Mora em Portugal há 16 anos, mas não perdeu seu adorável sotaque paulistano. Nesta coluna, semanalmente, conta histórias de vida e experiências sempre à luz dos grandes pensadores.

*Os textos de nossos colunistas são de inteira responsabilidade dos mesmos e não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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