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Descobri que carregar um peso nas costas pode ser bom
Toomas Tartes
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A expressão “carregar um peso nas costas” é uma metáfora muito comum usada para descrever alguém que enfrenta grande responsabilidade ou pressão na vida, sugerindo que essa pessoa está lidando com um fardo emocional tão intenso que já se tornou difícil de suportar. Por isso é que fui tomada de curiosidade quando caiu em minhas mãos um livro com o paradoxal título “Meu confortável peso nas costas”, do pernambucano Jayme Fonsêca Jr. (editora Autografia).

Não que eu não tenha entendido a intenção de Jayme — um engenheiro civil/sommelier de cerveja, que é escritor de viagens e viajante inveterado não só nas horas vagas. Na verdade, entendi muito bem. Anos atrás, quando desembarquei numa silenciosa madrugada de sol nas ilhas Lofoten, território norueguês acima do círculo polar ártico, precisei caminhar 8 km por uma estrada vazia carregando uma pesada mochila até o lugar onde me hospedaria. Talvez tenha sido a sublime sensação de haver finalmente chegado ao meu destino dos sonhos, mas o peso da bagagem nas minhas costas desapareceu conforme eu caminhava. Foi como se alguém estivesse me fornecendo algum tipo de apoio. Logo, compreendi o que Jayme queria dizer, e abri o livro.

“Meu confortável peso nas costas” reúne contos de viagem de um cara boa-praça.

Jayme é alguém que, desde criança, cai hipnotizado por qualquer oportunidade de explorar o novo e o desconhecido. Quando adulto, aproveita as muitas viagens a trabalho para dar vazão ao desejo de explorar cada canto para onde é enviado, mesmo que por poucas horas.

Em nenhum momento, ele menciona “largar tudo para viajar”, como é comum se ouvir hoje. Jayme consegue equilibrar perfeitamente as obrigações de uma vida fixa com as aventuras de sua personalidade naturalmente nômade. E, por causa de uma “bateria social” de alta durabilidade, acaba colecionando histórias inusitadas, cheias de sensibilidade, informação e presença de espírito.

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Lições para ler e refletir

Até conhecer as histórias de Jayme, eu achava que vivia plenamente a cultura e os costumes dos lugares que visito.

Mas não.

A disposição desse viajante para se transfigurar de turista a habitante local é tão maior que a minha e a da maioria dos viajantes que conheço que, em alguns momentos, nota-se que ele chega a colocar coisas importantes em perigo, seja o direito de voltar para casa de avião ou a própria vida. Vide o momento em que ele se posiciona no melhor dos ângulos para assistir a uma das festas mais famosas da Espanha, San Fermín, conhecida pela polêmica e ameaçadora corrida de touros pelas ruas da cidade de Pamplona.

Apesar das ousadias nas quais se mete e das passagens em que experimenta grandes perdas emocionais, na maior parte do tempo, tudo o que acontece nas viagens de Jayme acontece de um jeito engraçado. Então, a leitura é leve.

De toda vivência fora da cidade ou do país natal, nosso viajante extrai uma lição gostosa de ler e para refletir. Mas não pense que ele se esforça para isso. As lições no caminho viajeiro de Jayme aparecem muito naturalmente, bem como aquelas situações com as quais muita gente vai se identificar, como: desentender-se com a namorada por um motivo bobo no meio de uma viagem dos sonhos; ser enfeitiçado por algum vendedor esperto e ter vergonha de se esquivar da situação; aceitar fazer algo que nunca se pensou em fazer antes por medo ou constrangimento e, de repente, descobrir que se arriscar em experiências inéditas é uma das graças da vida…

Paranoias de viagem

Como todos nós, o autor também se depara com quem coloca caraminholas na nossa cabeça, quase que numa tentativa inconsciente de nos fazer desistir do caminho escolhido. Parece que sempre vai existir gente assim, que, ou quer dividir um medo por esse ser um fardo pesado para se carregar sozinho, ou pretende nos arrancar um pouco da coragem que tínhamos no início.

Jayme, ao que parece, nunca teve cisma de avião. Até que no capítulo “Desventuras Longe do Chão”, acaba contaminado por uma passageira que insiste na ideia de que a asa da aeronave está balançando além do normal. Pronto, a semente da paranoia começa a germinar na mente de um cara que talvez nunca tenha voltado a voar confiante como antes. Leitores influenciáveis, cuidado aqui!

Divulgação

Dicas de um viajante experiente

Prepare-se para um pouco de sentimento ao viajar com Jayme em sua primeira experiência como passageiro no ar — o que, aliás explica seu grande amor por aviões — e ao acompanhar seu encontro com um misterioso personagem que o espreita, nos fazendo imaginar se viajantes não teriam realmente amigos invisíveis que os acompanham jornadas mundo afora.

Eu poderia escrever uma lista do que aprendi nessa leitura. Mas aproveitar cada hora que se passa no relógio; enxergar cada esquina dobrada como mais uma oportunidade  de experimentar a vida; e usar todos os sentidos (especialmente o paladar) para conhecer os lugares onde for já são lições suficientes, embora às vezes arriscadas, para moldar um bom viajante.

A volta para casa, no final do livro, é uma cereja em cima do bolo. Nesse ponto, o leitor talvez gargalhe e, com certeza, queira virar amigo do Jayme.

Um spoiler: na página 54, o experiente viajante-escritor nos dá uma dica (quase) infalível de como manter o equilíbrio emocional quando se tem medo de voar de avião ou durante os solavancos da aeronave.

Se você quiser mais informações sobre o livro, pode entrar em contato diretamente com o autor neste link.

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