Mineira de nascimento, cidadã do mundo de coração, Estefânia Moura é uma terapeuta holística e professora de dança que vive hoje percorrendo o Brasil como uma mochileira nômade, quando decidiu sair de Belo Horizonte na Menina, sua moto, que a acompanha há 10 anos. Esse foi o apelido carinhoso dado pela motoqueira, um sonho de infância que se mistura entre as viagens de família e os filmes de faroeste assistidos com o pai.
Seus pais, imigrantes, a levavam para conhecer o estado do Piauí, lugar onde nasceram e que sempre voltavam durante as férias para rever a família e os amigos que lá deixaram. Como todo o trajeto era feito de carro, as imagens da estrada e as pessoas que eram encontradas pelo caminho sempre admiraram Estefânia, que a partir dali passou a sonhar com uma rotina – ou a ausência dela – e um modo de vida que se assemelhasse a essas andanças pelo país. “Eu fui crescendo e mantendo essa vontade de manter uma vida livre nessa simplicidade da estrada“, explica a motochileira.
Além da paixão pela viagem, outro grande sonho de Estefânia sempre foi viajar em duas rodas. “Eu queria ser uma mulher que andasse de moto e desbravasse a vida”, conta ela entusiasmada, que hoje está na cidade de Touros, no Rio Grande do Norte.
“A liberdade requer esse desprendimento, de casa, de coisas, de guarda-roupa“, explica a viajante. Isso nem sempre é um processo fácil e simples, já que implica muitas adaptações, estratégias de sobrevivência e um estilo de vida bastante diferente da maioria das pessoas do país.
E logo cedo a motochileira percorreu alguns países do globo de forma nômade, mas também alguns estados do Brasil, embora ainda não imaginasse que o sonho de pilotar uma moto pelo Brasil seria reacendido e faria parte da sua vida hoje, anos depois das idas e vindas que aconteceram na sua vida.
De volta a Minas
Depois de sua primeira experiência como mochileira pelo Brasil, Estefânia decidiu se estabelecer em um pequeno vilarejo do estado de Minas Gerais, nas proximidades de Ouro Preto. “Me encantei por uma cidade no interior de Minas, parei nesse lugarejo, que é um lugar bem turístico, e me encantei por lá“, conta. “Fiquei lá morando sete anos, construí coisas, aluguei uma casa, abri um comércio”, acrescenta.
Mas, tudo era bastante diferente da rotina da grande cidade, dos horários apertados, do trânsito caótico, da pressa para que tudo ocorra da forma mais instantânea possível. A motochileira praticava diversas atividades como caminhar pela vegetação, cuidava de uma horta diariamente e trabalhava somente aos fins de semana, de forma com que ela pudesse aproveitar a região e desfrutar das pessoas que ali viviam e das belezas naturais do local.
Apesar de toda a conexão, chegou um momento de voltar à cidade natal, se reconectar com a família e organizar seus passos dali em diante – embora Estefânia acredite muito mais que o futuro é algo aberto e imprevisível.
Agora, em Belo Horizonte, e de volta ao ritmo da capital, ela tentou novamente uma vida comum, alugou um espaço, passou a trabalhar e seguia o roteiro da maioria dos belo-horizontinos. Tudo aquilo a sufocava e passou a perceber que não era bem aquela vida que a fazia feliz. Depois que surgiu um nódulo benigno na tireoide, Estefânia percebeu que o seu corpo estava demonstrando que aquela rotina já não mais a satisfazia e que buscar outros caminhos era algo urgente.
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Na estrada
“Com o passar do tempo, essa coisa que já está em mim, não se calou. Mais uma vez, eu larguei tudo”, conta ela sorridente. Estefânia percebeu que não sabia muito como voltar à vida nômade depois de tanto tempo estabelecida em um mesmo lugar.
“Eu sentia a vontade de retomar à vida na estrada, conhecer novos lugares, novas pessoas, percebi que estava sem saber como viver isso que eu fazia anteriormente. É como se eu tivesse me desconectado do meu GPS interno”, conta a motochileira.
Ainda assim, Estefânia decidiu se arriscar, montou algumas rotas e, como já havia visitado o Oiapoque, decidiu que iria de Minas Gerais até o Chuí pilotando sua moto, Menina. Ela brinca que, a famosa travessia do Oiapoque ao Chuí foi substituída pela viagem do Uai ao Chuí.
“Aquela sensação de estar na estrada é inexplicável, conhecendo os lugares, as histórias e as pessoas. Parece uma alquimia”, conta Estefânia emocionada, que, devido às restrições da Covid-19, acabou não indo até o Uruguai.
“Eu sempre recomeçava a vida em um lugar fixo, depois largava tudo e ia para a estrada de novo“, explica a viajante, e por isso novas rotas já começaram a ser planejadas, até que alguns motoqueiros começaram a falar sobre o percurso conhecido como Fazedor de Chuva.
O trajeto consiste em percorrer toda a BR 101, que vai da cidade de Touros, no Rio Grande do Norte, até São José do Norte, no Rio Grande do Sul. E assim seguiu percorrendo todos os estados do Sul, boa parte do Sudeste e os estados do litoral leste do Nordeste. “Pilotar para mim, representava essa sensação que eu tinha, do vento no rosto, estar junto com a natureza. Você tá ali, tem que tá atento, tem que estar conectado“, conta Estefânia, que também ficou conhecida como forasteira, um nome importante para ela.
Caminhos, encontros e desencontros
A motochileira associa a sua viagem com diversas histórias da vida e do cotidiano, que nem sempre é como planejamos e muitas vezes nos pega de surpresa. Para ela, os sinais do universo nem sempre estão em sintonia com que a gente gostaria que acontecesse, mas tudo bem. Cabe a nós nos readaptarmos a essas situações e seguir o famoso ditado: fazer dos limões que a vida nos dá uma limonada.
Vegetariana, defensora de uma vida simples e em sintonia com o propósito de cada um, Estefânia não se preocupa hoje com questões burocráticas – como o que fará quando ficar idosa e que tipo de aposentadoria irá recorrer.
Hoje, mais focada em se desprender das coisas que tentam nos manter no chão, a motochileira quer seguir agora para um novo desafio, percorrer todas as capitais do país. Mas antes disso, pretende ficar mais um pouco no Nordeste e percorrer o Piauí, se conectar com as suas raízes familiares e os antepassados.
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