A importância do silêncio para descansar o corpo e a mente
Para além da falta de som, sentimento pode ser um caminho de reconexão consigo mesmo e com os outros ao redor

Vivemos em uma sociedade “acelerada” e “barulhenta”, com notificações que gritam urgências nem sempre reais, enquanto centenas de postagens acontecem ao mesmo tempo. Um lugar que raramente dá espaço para o silêncio. Mas, às vezes, ele chega. No começo, parece só uma pausa. Um carro que passa ao longe, depois mais nada. Sem notificação, sem alarme, sem comentário atravessando a conversa mental. Aos poucos, o tempo parece desacelerar, a tensão vai embora e o corpo percebe antes da mente: finalmente, silêncio.
Silenciar é escutar com profundidade
Neuropsicóloga e especialista em terapia cognitivo-comportamental, Juliana Bomfim propõe uma inversão importante: “E se o silêncio for, na verdade, uma forma profunda de escuta?” Escuta do outro, sim, mas também de si. “Silenciar a mente barulhenta pode nos libertar de pensamentos, medos, tensões e desejos que consomem energia”, afirma.
Segundo ela, o silêncio é uma prática ativa, que exige atenção, receptividade e acolhimento. Mais do que deixar de falar, é um convite a ouvir com empatia, a se concentrar no que o outro diz, a reconhecer os próprios estados emocionais. “Aprender a silenciar nos ajuda a poupar energia com o que não agrega e a nos concentrar mais em nós mesmos.”
Mas devemos lembrar também que o silêncio verdadeiro, aquele que acalma por dentro, não precisa da ausência total de ruído. Ele se insinua no intervalo entre um pensamento e outro, no sopro de uma respiração mais profunda, no barulho do mar ou em sons da natureza. E é nesse espaço invisível, onde não há demanda, que algo se reorganiza.
Como ter autocuidado e equilíbrio emocional com o silêncio
Com tantas vozes externas competindo pela nossa atenção, a ausência de som vira um espaço de respiro. É nesse intervalo que surge a possibilidade de refletir, sentir, tomar decisões com mais clareza. A psicóloga alerta que o excesso de ruído, especialmente no trabalho, está diretamente relacionado ao aumento de síndromes como o burnout.
Quando praticamos o silêncio, não estamos interrompendo o fluxo de palavras ou sons, mas também promovendo mudanças no nosso corpo e cérebro. “O silêncio, quando é vivido conscientemente, contribui para a redução do estresse e a ativação do sistema parassimpático, que é responsável por diminuir a frequência cardíaca e regular a respiração”, explica Juliana.
Essa desaceleração física reflete direto na mente. Menos estímulos externos significam menos cortisol (o hormônio do estresse) circulando pelo corpo, o que favorece a recuperação mental.
Além disso, o cérebro, ao ser privado do excesso de estímulos, entra em um estado de maior concentração e clareza, permitindo uma maior capacidade de processamento emocional. O resultado é uma sensação de renovação mental, uma espécie de recarga que nos torna mais equilibrados e preparados para enfrentar os desafios do cotidiano.
O silêncio não é igual para todo mundo
O silêncio, porém, não é neutro. “Ele tem significados diferentes para cada pessoa e cultura. Pode representar calma e acolhimento, mas também tristeza, solidão ou até opressão”, diz Juliana.
Em certos contextos, silenciar é um ato de resistência; em outros, uma ausência imposta. Para algumas pessoas, pode representar acolhimento e pausa, enquanto para outras, é uma tentativa de calar emoções difíceis. “Cada sujeito ou sociedade manifesta o seu silêncio de maneira única. Compreender isso é essencial para não romantizar ou generalizar uma prática tão subjetiva.”
Nas relações, exercitar a arte do silêncio é também um sinal de sabedoria: saber a hora de ouvir, a hora de calar e a hora de falar. “Não precisamos ser apáticos ou distantes. É possível estar em silêncio e, ao mesmo tempo, presente, conectado, atento”, finaliza.
Como encontrar pausas em meio à rotina
Incorporar momentos de silêncio à rotina pode ser mais simples do que parece e profundamente renovador. “Reserve momentos do dia para desacelerar, longe de telas e ruídos. Pode ser em casa ou no trabalho”, orienta a neuropsicóloga.
Não se trata de ter muito tempo, mas de escolher pausas conscientes, mesmo que breves. Para muitas pessoas, encontrar o silêncio interno não significa eliminar todos os sons, mas escolher aqueles que ajudam a desacelerar a mente.
“O som do mar, da natureza, de uma música específica ou de uma meditação guiada pode funcionar como um portal para o silêncio interior”. Esses estímulos funcionam como âncoras sensoriais que ajudam a observar os pensamentos sem julgamento e a acessar um estado de presença, mesmo em ambientes agitados.
Algumas práticas simples que ajudam a cultivar esses espaços de pausa e escuta:
- Respiração consciente: parar por alguns minutos e apenas respirar, com atenção plena, ajuda a ativar o sistema parassimpático, responsável pela sensação de calma no corpo;
- Caminhada silenciosa: andar sem fones de ouvido, com a atenção ao entorno e aos próprios passos, pode ser uma forma de meditação ativa;
- Banho sem pressa: transformar o banho em um ritual de presença, com velas aromáticas, incenso e uma música que te faça relaxar;
- Atividades manuais: desenhar, bordar, cozinhar ou cuidar de plantas convidam à atenção plena, silenciam o ruído mental e reconectam com o presente.
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