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A vida no interior nos convida a pensar diferente
Maria Dolores/Arquivo Pessoal
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– Preciso ir, tem reunião na Joyce às cinco e meia – disse minha mãe, já com a bolsa na mão.

Depois de um ano tentando descobrir a origem de um vazamento na casa, minha tia fez o que todo mundo faz nessas horas: convocou os quatro irmãos para investigarem o problema e encontrarem uma solução.

– Por que ela não chama um pedreiro? – perguntei.

Pedreiros tinham avaliado o imbróglio sem sucesso, foi a explicação. Pode até ser, mas a verdade é que a minha família tem essa mania. Reunir por qualquer motivo e resolver tudo, em qualquer ocasião, seja um problema da construção civil, medicina ou engenharia aeroespacial. Coisas de interior.

Assim, na hora marcada, reuniram-se na cozinha afetada os irmãos especialistas. Tio dono de restaurante, tia dona de floricultura, tio fiscal da receita estadual, minha mãe fotógrafa e a tia dentista, proprietária da casa em questão. Eu estava em Três Pontas, organizando as coisas para a mudança. Foi uma boa maneira de começar.

“Bem-vinda, Maria”, pensei.

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A mesa redonda, apropriada para importante reunião, abrigava as ferramentas necessárias: uma garrafa de café recém-coado, biscoito de polvilho, manteiga e bolo de fubá, bem parecida com a mesa na foto que abre este texto (que é da casa em questão, mas em outra ocasião).

Ao redor dela os irmãos debateram, avaliaram hipóteses, resgataram causos e histórias semelhantes ocorridas no prontuário familiar da vida no interior.

Andaram pela cozinha, tatearam as paredes e a memória, recordaram as versões passadas do cômodo, quando aquela ainda era a casa dos meus avós.

Aqui ficava o fogão à lenha, aqui era o banheiro, aqui ficava o caldeirão onde o patriarca dentista-marceneiro-cozinheiro assava pernil e fervia as dentaduras e pivôs dos clientes.

Tudo ao mesmo tempo.

Uma hora depois de um debate intenso, a conclusão: “Tem que ter um cano nessa parede”. Todos de acordo? Sim, todos de acordo. Fizeram então o que todo mundo faz.

Meu tio fiscal foi na casa dele e buscou uma britadeira que, aliás, é um item comum nos lares brasileiros.

Britadeira em mãos, quebraram a parede. E lá estava ele, um cano antigo da serpentina do fogão à lenha há muitos anos inexistente.

Bloquearam o cano e deram por encerrado o assunto. Agora quero ver como vão fechar a parede. Se minha tia vai contratar um pedreiro ou se fará uma nova convocação.

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O episódio me fez refletir. Pensar no quanto nos apegamos à mesma maneira de resolver problemas, realizar tarefas ou viver a vida, quando poderíamos tentar algo diferente.

Tudo bem que convocar todos os irmãos talvez não seja uma alternativa prática nem viável para o dia a dia, mas não deixou de ser um caminho inovador e, como se mostrou, eficiente.

Troquei a cidade grande esse ano para aproveitar a vida no interior e talvez a grande oportunidade não seja estar em um lugar mais tranquilo, mas fazer as coisas de outro modo. Abrir os olhos, o coração e tentar enxergar o mundo e a mim mesma sob novas lentes.

Tentar nunca é desperdício de tempo ou energia.

Mesmo que não tivesse solucionado o problema, a Reunião de Conselho teria resultado, pelo menos, em um bom momento. Mais um para o repertório familiar e das recordações que nos fazem sentir bem e seguir adiante.

E você, já tentou algo diferente?


*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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