Desânimo no trabalho pede atenção aos sinais e mudanças
Momentos de menos motivação podem revelar mais do que fadiga, mas que ajustes de rota precisam ser feitos

Tem dias que o simples ato de ligar o computador ou encarar a agenda parece demais. A motivação vacila, os compromissos perdem o brilho e a vontade de fazer o mínimo vai se arrastando ao longo do dia.
Ainda assim, muitos tentam disfarçar, repetir mantras de produtividade ou empurrar o desânimo com listas de tarefas como se fosse possível resolver um incômodo profundo com mais pressão. Só que o desânimo no trabalho costuma ter algo importante a dizer.
Em tempos em que o trabalho ocupa uma boa parte da nossa vida e ajudam a formar nossa identidade, perder o ritmo ou a motivação não é só um problema prático, mas um sintoma. E ignorar isso pode custar caro para o corpo, para a mente e até para o próprio percurso profissional.
A psicóloga Lindamar Bottega reforça que “o desânimo não é, por si só, um sinal de fracasso. Às vezes, é só uma fase. Em outras, é o modo que a psique encontra para mostrar que algo precisa mudar.”
O que o desânimo no trabalho pode revelar
Todo mundo passa por fases de tédio ou estagnação no trabalho. Mas quando o desânimo vira rotina, ele vai esvaziando o prazer de criar, de se relacionar e até de simplesmente estar naquele ambiente. É sinal de que algo merece atenção. “A vida profissional tem altos e baixos. O problema é quando essa desmotivação se arrasta, vira rotina e começa a afetar a saúde mental e as relações”, diz Lindamar.
Muitas vezes, o que parece apenas desânimo, é, na verdade, um pedido de pausa do corpo e da mente. “São muitos os fatores: ambientes tóxicos, excesso de cobrança, relações mal resolvidas com chefes ou colegas, sensação de estagnação, e também o peso de estar tentando se encaixar num modelo que não tem mais a ver com quem a pessoa é”, explica a psicóloga.
Desde o início, sabemos que o trabalho, além de garantir sustento, também funciona como uma extensão da identidade. A pressão para se encontrar e se expressar por meio da profissão tem gerado um novo tipo de sofrimento: a busca por propósito.
Em muitos casos, a sensação de fracasso não vem do que o trabalho realmente oferece, mas do que se espera dele. Afinal, quando ele se torna a principal ou única fonte de sentido, qualquer tropeço pode ser vivido como uma falha pessoal. “O trabalho vira palco de repetições inconscientes, algo que começou lá atrás, na infância, e agora aparece no campo profissional”, relata.
Sinais que pedem atenção
O corpo é sábio. E costuma ser o primeiro a sinalizar que algo não vai bem mesmo quando a mente insiste em seguir no automático. A lógica da produtividade tóxica é a grande vilã nesse cenário. Vivemos em uma cultura onde o trabalho não é apenas uma necessidade, mas um fim em si mesmo.
A pressão para estar sempre produzindo, sempre fazendo mais e mais, cria um ciclo de exaustão mental e física, e faz com que a pausa, o descanso e até o simples “não fazer” sejam vistos como fraquezas. O desânimo no trabalho afeta o corpo e a mente e sintomas como fadiga persistente, insônia, dores no corpo, crises de ansiedade, esquecimentos e até sintomas de despersonalização são sinais de que o sistema entrou em modo de alerta.
“Quando a mente começa a desacelerar à força com crises de choro, apatia e perda de prazer, é sinal de que algo precisa ser revisto. Não é frescura e nem fraqueza, é um chamado para se escutar”, afirma.
Nessa hora, comparar-se aos outros ou tentar “dar conta” pode agravar ainda mais o desgaste. Afinal, a ideia de que precisamos estar sempre motivados e disponíveis é uma armadilha. “Essa cobrança por produtividade constante é desumana. Não somos máquinas.”
Quando considerar uma mudança profissional
A partir do momento em que o trabalho passa a roubar energia, minar a autoestima e sufocar a criatividade, talvez seja a hora de encarar uma pergunta mais difícil: “Esse ainda é o meu lugar?”. A psicóloga reforça que recomeçar sem culpa é um ato de coragem e de cuidado. “É preciso escutar o próprio ritmo, aceitar os momentos de pausa e entender que valor não se mede só por performance”.
A resposta, claro, nem sempre é sair imediatamente. Mas pode ser o início de uma reavaliação sincera sobre o que se está sustentando e a que custo. “Quando o corpo adoece, o prazer desaparece e tudo vira obrigação. Quando a pessoa percebe que está apenas sobrevivendo, ou quando o ambiente impede o crescimento, anula quem se é. Mudar de emprego pode ser, sim, um ato de saúde”, reforça.
Antes da ruptura, o caminho pode passar por negociações, pausas estratégicas, novos acordos internos. E também por um mergulho em questões como identidade, pertencimento e expectativas. “As vezes, a resposta está na necessidade de reconhecimento. Outras, no medo da mudança. E tudo bem desde que a escolha não venha do piloto automático. Uma relação saudável com o trabalho não é feita de perfeição, mas de lucidez.”
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