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Estrada que segue
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Talvez um dia, quem sabe, agradeça por essa experiência que tem acelerado a vinda dos meus fios brancos, e por entender que a vida tem seu próprio fluxo

Por mais de 90 dias esperei o 31 de julho com o coração de uma criança à espera do Papai Noel. Há pouco mais de 3 meses essa data seria, para mim, uma linha demarcatória entre a primeira (e intensa) parte do 2020 e a segunda. Claro que, na minha otimista concepção, seria mais leve.

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Não sei exatamente o que projetava ao imaginar um período leve. A questão é que, lá por meados de março, impossível seria imaginar que qualquer planejamento de vida seria total desperdício de tempo. Nas primeiras semanas da quarentena, usei a  expressão “vai passar” como mantra. Mas confesso a você, se hoje alguém me disser isso com ares de seriedade, eu não respondo por eventual atitude inesperada ou desprovida de educação. Se minha mãe ler essa coluna certamente puxará minha orelha, mas faço aqui um breve e super sincero desabafo: essa história de limitações físicas, emocionais e mentais já perdeu a graça. Isso se, em algum momento, alguém acredita que houve algum encanto nesse contexto de pandemia.

A ficha, infelizmente, caiu

Mas voltando ao calendário, comecei a quarentena riscando os dias. A cada risco, ao menos, um suspiro aliviado. Diariamente, sem cansar nem esquecer, traçava um rabisco a mais na “folhinha do mês”. Na sequência,  veio a contagem regressiva: “faltam x dias para o 31 de julho”. Segui riscando o calendário na expectativa real de que, quando julho acabasse, tudo estaria melhor. Projetei na minha criativa, romântica e inquieta mente uma viagem de carro sem nenhum destino certo ou luxuoso. Apenas imaginava sair por aí e parar onde tivesse vontade, sem a necessidade de passar álcool gel nas mãos a cada 5 minutos.

Até que, pelos últimos dias de junho, numa concepção singular de que a expectativa estava totalmente desajustada à realidade, a ficha caiu: quando o julho acabar, nada acontecerá além do mês de agosto iniciar. Lembro bem, esse pensamento me invadiu numa noite de domingo, acompanhado de um choro quase infantil de perceber com clareza a lacuna entre a fantasia do que gostaria que acontecesse e a verdade do que acontecia.

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Infelizmente meu sentimento não se enganou. Julho acabou, agosto começa e cá estamos da mesma maneira que há meses atrás: imersos em incertezas, em medos e na realidade da qual não se pode fugir. Seguimos correndo riscos de contágio do vírus, seguimos limitados ao ir e vir, saudosos aos encontros, aos abraços e ainda seguimos dando louvores diários às conexões virtuais que têm nos salvo em momentos de saudades profundas e possibilidades seguras de trabalho a distância.

Tempos difíceis para sonhadores

Não pense, querido leitor, que estou triste ao compartilhar essas palavras, muito pelo contrário. Se há algo que a pandemia me ensinou foi a enxergar o mundo de uma maneira mais realista, e mesmo assim entender que tá tudo bem. Se estivermos com saúde, estará melhor ainda!

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As coisas simples da vida, os relacionamentos sinceros e a permissão de me aceitar imperfeita e vulnerável, como sempre fui e sempre serei, se tornaram meu maior tesouro da pandemia. Então, quem sabe, talvez um dia, agradeça por essa experiência que tem acelerado a vinda dos meus fios brancos, e por entender que a vida tem seu próprio fluxo, a gente apenas dá um empurrãozinho pra conduzir frações desse caminho. Como disse a doce musa da ficção e do meu coração, Amelie Poulain, “São tempos difíceis para os sonhadores”.

Dessa forma, seguimos a estrada juntos, combinado?

Beijos meus

Lu Gastal trocou o mundo das formalidades pelo das manualidades. Advogada por formação, artesã por convicção. É autora do livro “Relicário de afetos” e participa de palestras por todos os cantos. Desde que escolheu tecer seus sonhos e compartilhar suas ideias criativas, não parou mais de colorir o mundo ao seu redor. Seu Instagram é @lugastal.

*Os textos de nossos colunistas são de inteira responsabilidade dos mesmos e não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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