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Sobre mudança, ritmo e menos autocobrança
(Foto: Javier Allegue Barros/Unsplash) Achamos que devemos funcionar como o fulano ou o beltrano. E deixamos de respeitar quem a gente é
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Enquanto você lê essa news, eu provavelmente estou encaixotando os itens finais da minha mudança. Aquela que eu já contei por aqui algumas vezes, que fui “mudando aos pouquinhos”. Domingo passado, conversava com a minha mãe, que estava muito curiosa para saber como eu havia resolvido os muitos detalhes – o que fica e o que sai do apartamento, o que eu venderia ou doaria, etc. Até que ela veio com uma frase clássica: “Ah, você já devia ter terminado isso”. Esse “você já devia…” por muito tempo ecoou dentro de mim como um certo sinal de incompetência. Afinal, eu devia, mas não fiz. E ali, naquele momento, algo havia mudado em mim. Com um coração leve e sem culpa, eu disse “É, mas não deu”. E tudo bem.

Se você já internalizou alguma cobrança, sabe o alívio que é quando tiramos dos ombros o peso da culpa. Especialmente quando compreendemos que cada um é de um jeito. Nem certo, nem errado, só diferente. Minha mãe resolve tudo de forma pragmática. Ela é rápida, objetiva, desapegada. Eu, não. Me demorei entre os infinitos livros que eu tinha para encaixotar. Relembrei muitos, separei alguns que ainda não havia lido. Me vi sem espaço para guardar na nova casa aquela quantidade que parecia infinita. Pensei em me desfazer. “Mãe, esses livros são parte de você”, disse o Ben, do alto da sabedoria de uma criança de seis anos de idade. Me despedi de objetos que não me cabiam mais. Encarei o meu apego (tinha guardado as agendas dos últimos dez anos!), e doei muitas coisas, inclusive roupinhas do primeiro aninho do meu garoto. Viajei no tempo, na minha história. Na história de vários objetos que agora vão viver novas histórias na casa de outras pessoas. 

Sim, fiz tudo bem mais devagar do que poderia (e sim, isso me rendeu um baita prejuízo financeiro ao ficar com o imóvel parado por esse tempo…). Mas não lamentei. Fiz como deu. Como eu pude. Sem cobranças rigorosas e irreais comigo mesma. Respeitando os momentos da vida. Hoje, contei isso para uma amiga querida. Ela me disse “Uau. que alívio é se reconhecer no seu próprio ritmo”. E sim. A gente vive num tempo em que tudo precisa ser rápido, ágil, veloz. Em tempo recorde. Esquecemos da suavidade. Das pausas. Do decantar de sentimentos dentro de nós. Achamos que devemos funcionar como o fulano ou o beltrano. E deixamos de respeitar quem a gente é. 

Enquanto você lê essa news, talvez eu ainda tenha muito a encaixotar. Não sei. Com mais essa mudança (essa é a minha sexta, quando me refiro a trocar de casa…), o que aprendi é que ser rápido não necessariamente significa ser melhor – e isso, para qualquer coisa da vida. Que a gente “não devia” nada, a não ser respeitar um pouco mais quem a gente é. Em todas as mudanças do viver.


Conteúdo publicado originalmente na newsletter da Vida Simples. Cadastre-se para receber semanalmente em seu email a newsletter Simplesmente Vida, com cartas exclusivas de Débora Zanelato, diretora de conteúdo de Vida Simples.

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