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Educação financeira para crianças vai além de cofrinho e mesada
Educação financeira para crianças começa com habilidades que vão além do dinheiro. Annie Spratt/ Unsplash.
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Pode-se pensar que dinheiro é uma questão (ou problema) apenas dos adultos, e que crianças não precisam se preocupar com isso. Mas aprender a lidar com finanças desde cedo pode ser uma forma de ter uma relação mais saudável com os recursos lá na frente. É aí que entra a educação financeira para crianças, uma forma de introduzir práticas e comportamentos para lidar melhor com o dinheiro.

Entretanto, a educação financeira não ensina somente a gerir melhor o dinheiro. Para Thiago Godoy, educador financeiro e escritor, a prática vai além. “É uma questão de gerenciamento de recursos de forma responsável e para isso é necessário desenvolver habilidades”, diz.

De acordo com ele, essas habilidades dizem respeito à capacidade de tomada de decisão, de compreensão sobre economia de recursos e investimentos, e também a capacidade de planejar a longo prazo. As crianças precisam aprender que, algumas vezes, é preciso “deixar de se beneficiar no presente para conquistar algo em um momento futuro”, exemplifica.

Assim como outros tipos de educação, a financeira também deve começar em casa. “A criança precisa de modelos de comportamento e os principais vão estar no dia-a-dia da família”, declara.

Além disso, o processo deve ser feito de modo consciente. “Um equívoco que às vezes é inconsciente está no fato de os pais discutirem de forma negativa com a criança, brigar, dizer ‘não’ para todos os desejos dela sem explicar a causa do não.

Também acontece o contrário, de a criança pedir e os pais vão atender e comprar tudo que ela deseja”, aponta. “Isso tudo pode ensinar lições erradas sobre o valor do dinheiro, sobre a questão do consumo.”

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Dinheiro é emoção

“Mudar o comportamento de adultos é muito mais difícil do que praticar um relacionamento saudável com o dinheiro já na infância”. Foi esse pensamento que moveu a jornalista Paula Andrade a focar sua carreira na educação financeira para crianças e, assim, começou a escrever livros infantis sobre a temática.

Para ela, é importante educar as crianças financeiramente para que elas entendam como o dinheiro funciona, assim como as emoções que aparecem quando se lida com dinheiro.

“Dinheiro é emoção. Ter um bom relacionamento com dinheiro é uma eterna frustração, porque a gente está se frustrando diariamente para conseguir ser feliz lá no futuro. Mas o nosso cérebro não entende isso, ele quer a felicidade agora. Então nós temos que educar os nossos filhos para que eles aprendam a lidar bem com isso”, explica.

Cinco habilidades com dinheiro que podem se desenvolver na infância

Nesse sentido, ela identificou cinco habilidades comportamentais que podem servir de exemplos para crianças desenvolverem uma boa relação com as finanças e as emoções que elas geram. Elas são:

  1. Disciplina. “A disciplina de você poupar todo mês, de seguir o orçamento planejado, de não cair em tentação de consumo.”
  2. Perseverança. “Continuar e não parar até você obter o resultado que você quer. É você não deixar a criança desistir.”
  3. Resiliência. “Ensinar para a criança que, por mais que a gente faça um planejamento lindo, a chance de dar zebra é grande. E quando isso acontecer, você vai jogar o seu planejamento todo fora? Não, você vai lá, enfrenta a tempestade, se apruma e retoma o seu caminho, continua.”
  4. Relação de causa e consequência. “É muito importante que nós ensinemos às crianças que vivemos as consequências das nossas escolhas, para que elas façam escolhas conscientes em relação às probabilidades do futuro.”
  5. Paciência. “Nós vivemos no mundo do imediatismo. A gente não precisa esperar por nada. Assim como nós, adultos, as crianças também precisam trabalhar o exercício da paciência. Conquistar sonhos demanda paciência, a gente tem que aprender que é tudo um processo.”

Ferramentas para educação financeira de crianças, além do dinheiro

Segundo Paula, é possível ensinar e desenvolver habilidades financeiras nas crianças com ferramentas que não envolvem o uso do dinheiro. No caso da disciplina, ela recomenda planejar uma rotina e segui-la.

“Quando você estipula uma rotina e é sempre tudo do mesmo jeito, você traz previsibilidade para a criança, que se torna mais calma, porque sabe o que vai acontecer. Com isso, você consegue trabalhar disciplina e mostrar que é importante a gente fazer sempre a mesma coisa para que tenhamos um certo controle da nossa vida”, explica Paula.

Para estimular a perseverança, a saída é não deixar as crianças desistirem de algo que gostam porque falharam. O mesmo vale para situações em que estão aprendendo algo importante mas que não gostam, como uma matéria da escola ou natação, por exemplo.

Paula defende também que as crianças devem entender que suas ações têm consequências. Por isso, os pais não devem protegê-las demais e devem deixar que os filhos sintam as consequências para que as associem com as ações de origem.

“A gente tem que deixar as crianças viverem as consequências das escolhas delas. Claro que você não vai deixar a criança pular de um abismo. Estou falando de pequenas escolhas como ‘eu não quero comer agora’, ou ‘eu não vou levar meu casaco’, exemplifica.

Entra então a resiliência. Nesse caso, ela é ensinada estimulando as crianças a pensarem em soluções para possíveis problemas que enfrentam. “É importante a gente desenvolver esse mecanismo de autonomia na criança. Ela deve saber que é capaz de resolver problemas sem necessariamente precisar de um terceiro. É muito importante que ela tente resolver sozinha”, explica. E quando isso não acontece, os pais e tutores podem interferir.

É preciso ensinar a esperar

Para aprender paciência é preciso aprender a esperar. Para isso, Paula apresenta algumas ferramentas e ações muito simples, como cozinhar com as crianças e jogar jogos de tabuleiro. Cultivar plantas em família, especialmente hortaliças e frutíferas, também é uma boa estratégia para desacelerar o tempo e estimular a paciência.

Outra ferramenta é o calendário, que segundo ela “traz o tempo para o mundo real”. A ideia de usar esse instrumento é ensinar a criança a acompanhar o tempo, o que pode ser feito riscando os dias conforme eles forem passando. Também é uma ótima maneira de informar à criança o que ela irá fazer nos próximos dias. “Ela começa a ter controle da vida dela, e fica muito mais paciente porque percebe o tempo que está passando.”

Mesada e cofrinho

Tendo esses princípios mais consolidados, pode-se partir para ferramentas de educação financeira para crianças voltadas para o dinheiro. O cofrinho é um instrumento muito famoso, ideal para crianças a partir de 3 anos. Para Paula, o cofrinho ideal deve permitir que a criança manipule o dinheiro com facilidade. Além disso, essa pequena poupança deve ter um propósito.

“Com o cofrinho, mostramos para a criança que ela pode sonhar e ela pode conquistar os sonhos dela”, explica. Para iniciá-lo, a especialista aconselha a primeiro perguntar o que a criança quer, e com isso estabelecer com ela quanto dinheiro vai ser necessário e por quanto tempo se vai poupar para ter esse objeto.

Outra dica é pedir para a criança fazer um desenho e colocar próximo ao cofre, para que ela visualize seu objetivo e não esqueça o motivo de estar guardando dinheiro.

Para introduzir a mesada, é importante que a criança saiba as quatro operações básicas: soma, subtração, multiplicação e divisão. Isso vai ocorrer entre os seis e oito anos de idade.

Segundo Paula, quando se inicia a mesada, ela deve ser dada em períodos curtos porque a criança pode não conseguir dimensionar o tempo de espera. Pode-se começar semanalmente, como uma semanada, e depois ter prazos maiores conforme os filhos forem crescendo.

Além disso, essa ferramenta deve ser pensada de acordo com a realidade financeira de cada família. Essencialmente, ela deve servir para que as crianças “tenham um mínimo de gestão financeira.”

O empreendedorismo na educação financeira para crianças

Por fim, há o empreendedorismo para crianças, uma ferramenta que pode empoderar e trazer muitos aprendizados. Essa ferramenta está relacionada com estimular os filhos a encontrarem meios de transformar recursos e tempo em dinheiro. Mas atenção, a ideia não é que seja um trabalho, e sim uma experiência para que ela entenda as dinâmicas que envolvem o dinheiro.

Paula explica que isso deve ocorrer dentro do universo infantil e pode ser realizado dentro do ambiente familiar. A ideia é permitir que os filhos criem e negociem com parentes pulseirinhas e desenhos, por exemplo. “A partir dos cinco anos, ela já começa a entender melhor como funciona o consumo, os gastos, as relações de compra e venda, e já aprende a negociar com outras pessoas”, aponta.

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