COMPARTILHE
Saiba se reinventar
Stephen Leonardi | Unsplash
Siga-nos no Seguir no Google News

Nossos medos, crenças e forma de enxergar a nós mesmos podem  fechar portas e nos impedir de fazer as mudanças que a vida pede

Sempre que ouço a palavra mudança, sinto junto um tremendo frio na barriga. Às vezes penso: “ainda bem! É sinal de que estou viva”. Noutras, confesso, vem também um medo nem tão desconhecido que, devagar, ganha formas diante de mim. De um jeitinho sutil, a vida frequentemente nos convida a nos reinventar. Ela nos desenha caminhos novos, lança desafios entre riscos e tropeços, mostra que nem tudo na nossa jornada é permanente. E isso nem sempre vai ser ruim.

Lembro que quando fui demitida, no final de 2016, por alguns dias cheguei a pensar que fosse mesmo o fim. Entre tantos “o que é que eu vou fazer agora?”, só depois de algum tempo, compreendi que aquele era um dos vários empurrões que a vida estava me dando, já havia uma porção de meses, para me encorajar a modificar a minha rota – eu sabia, dentro de mim, que as coisas já não estavam bem.

A partir dali, percorrido um longo caminho de partidas e reencontros necessários, a saída do antigo trabalho me levou a pensar mais em mim, em meus desejos e no próprio tempo de uma maneira mais gentil. E aquela ideia de “viver mais devagar”, que já me habitava havia alguns anos, aos poucos foi me afastando das incertezas e aproximando de mim o que realmente era importante.

A primeira decisão foi deixar a capital, Belo Horizonte, e voltar para o interior de Minas Gerais, onde cresci, na tentativa de reunir partes minhas que fui perdendo ao longo da estrada. Há um ano e meio, trilho esse caminho de redescobertas. “Os fatos acontecem, estão ali, e não temos nenhum tipo de controle em relação a eles. Mas podemos controlar nossas reações. Temos sempre a oportunidade de modificar nossa forma de lidar com esses acontecimentos”, me explicou a coach e professora da The School of Life Brasil, em São Paulo, Mônica Barroso. Na chamada “escola da vida”, Mônica dá aulas sobre carreira, rumos do trabalho, insatisfação profissional e o que fazer com este sentimento sempre tão angustiante.

Além disso, há pouco mais de 15 anos, Mônica desenvolve um trabalho focado em jornadas de transformação, auxiliando gente, como eu e você, a desenvolver um olhar mais sensível e generoso diante das mudanças que, como ela diz, são a única constante em nossa vida. “Em um primeiro momento, quando uma mudança inesperada acontece, a impressão que temos é de que perdemos tudo. Entramos em um período de vazio e angústia”, conta.

Esse sentimento, tão comum a todos nós, é decisivo dentro das escolhas de nossa trajetória. Podemos optar por ficar e lamentar aquilo que se transformou, ou reagir e ir adiante, segurando firme o que sobrou. Já com a poeira mais baixa, conseguimos identificar novas oportunidades e encontrar maneiras de seguir de um jeito menos dolorido. “Às vezes, um acontecimento mais duro nos reconecta com a luz do futuro”, completa Mônica. E isso também estabelece uma reconexão com nós mesmos e com a nossa verdadeira essência.

Em um primeiro momento, quando uma
mudança inesperada acontece, a impressão
que temos é de que perdemos tudo e,
frequentemente, entramos em um
período de vazio e angústia

Em busca de nossos talentos

No entanto, nem sempre a prática vai ser assim tão simples como a teoria. Quem já passou por períodos de turbulência, de instabilidade, sabe bem disso. Às vezes é uma demissão num período de poucas ou nenhuma reserva; às vezes é a falência daquele negócio em que você acreditava tanto; às vezes é você que se sente totalmente inadequado, insatisfeito, diante dos papéis que está vivendo, seja na carreira ou no relacionamento a dois.

O tempo todo vamos nos deparar com obstáculos diante dessa busca pelo que nos é essencial e instantaneamente faremos diversos questionamentos sobre nossos próprios desejos e trajetória. Para esses momentos de tantas incertezas, Mônica sugere que olhemos para dentro e resgatemos, lá no passado, a criança que fomos, ainda sem tantos medos e rejeições. Segundo ela, é na própria história de vida que temos a chance de encontrar a principal conexão com as verdadeiras paixões, e descobrir talentos, que muito podem auxiliar em nosso processo de reinvenção e mudança.

“Quando somos crianças, nossos talentos e paixões são mais visíveis. Costumo comparar isso a um bebezinho, que nasce nu. Conforme crescemos, vamos ‘vestindo roupas’ e chegamos à vida adulta tão cheios de camadas, que esquecemos em que somos bons”, analisa Mônica.  Essas camadas muitas vezes chegam até nós por meio de influências que recebemos de familiares, da escola ou até mesmo do trabalho que escolhemos. Quando tiramos essas expectativas e cobranças que vestimos ao longo da vida, ficamos mais leves. Consequentemente, nos reconectamos ao elo que nos une à infância e temos a chance de nos aproximar mais de nós mesmos e daquilo que encobrimos por medo da decepção ou da rejeição, ficando também mais próximos ao que é a nossa verdadeira vocação e que pode realmente nos trazer alguma felicidade.

Então, tente fazer esse exercício: recorde o que gostava de fazer na meninice, o que o deixava animado, que tipo de atividade. Muitas vezes, as respostas não são diretas como imaginamos. Por exemplo, você gostava de brincar de cientista. Vá além e se pergunte: por que? O que o movia era a sua curiosidade, era a vontade de descobrir como as coisas eram feitas? Mergulhe nessas perguntas e sensações, elas podem lhe apontar um interessante caminho de redescobertas.

Foi mais ou menos assim que aconteceu com a empreendedora Talita Viza. Hoje, ela comanda a Alento, uma marca mineira de sorvetes artesanais que, com seus sabores diferenciados, ganha cada vez mais espaço no mercado e nos sonhos da produtora. Mas nem sempre foi assim. Talita me contou que, antes de cursar gastronomia, desejo guardado desde menina, o direito e suas leis passaram por sua vida e a transformaram. “Passei no vestibular para os dois cursos, mas segui pelo direito, que era o sonho da minha mãe. Meus familiares acreditavam que, nesse caminho, eu teria mais realização financeira e assim o escolhi”, conta.

0 comentários
Os comentários não representam a opinião da revista. A responsabilidade é do autor da mensagem.

Deixe seu comentário