Viver e sonhar na República Tcheca
Praga, a capital tcheca, representava a porta de entrada para um mundo do desconhecido, do algo a ser explorado, de um país e uma cultura a ser desvendada.
Praga, capital da República Tcheca, representava a porta de entrada para um mundo desconhecido, a ser explorado e uma cultura a ser desvendada.
Muito antes de tomar a decisão de sair do Brasil, passei alguns anos sonhando e pensando em como eu faria isso. Tudo começou quando fiz minha primeira viagem para a Europa. Mas ainda antes disso, preciso voltar muito no tempo para contar sobre meu fascínio por viagens.
Desde pequena, viajar me fascinava. Minha família costumava fazer viagens longas de carro, principalmente entre São Paulo e Santa Catarina, onde era o estado natal da minha avó materna. Então, sempre que a viagem era planejada, eu ficava em êxtase. Sentia aquela sensação de embrulho no estômago, nervosismo, misturado a uma grande expectativa de algo que você quer muito e que finalmente está prestes a acontecer. Sentir isso era o máximo para mim.
Com esse sentimento no coração e essa ideia na cabeça, fui crescendo sempre pensando e sonhando com viagens. Fazia coleção das seções de turismo do jornal, assistia programas de viagem na TV e cheguei a pagar o maior mico – hoje quando penso, não acredito que fiz isso, em uma virada de Ano Novo na praia.
Mala com ondas?
Toda virada de ano é cheia de simpatias e resoluções de Ano Novo. E eu tinha lido em algum lugar que se eu pulasse as sete ondas no momento da virada com uma mala na mão, era certo que durante o ano iria viajar muito. E foi o que fiz. Na época, tinha 16 anos e meu avô Alcides, me acompanhou também com uma mala na mão, virando o ano e pulando ondas. Imagine a cena…
Certamente, meu avô, sem ele saber, foi a maior inspiração para mim quando o assunto é viajar. Pois ele, sempre que podia, pegava o carro e viajava muitos quilômetros para conhecer um lugar. E como minha família é pequena, minha mãe é filha única. Nós, eu e meu irmão, sempre estávamos juntos em todas as viagens.
Pensava que essa vontade imensa de viajar iria se acalmar com o tempo, porém só aumentou cada vez mais dentro de mim. Até chegar a viagem que mudaria a minha vida: o primeiro mochilão para a Europa, em abril de 2009. Eu, junto com meu marido, Felipe, percorremos nove países em 36 dias com um mochilão nas costas. O sonho, que permeava minha cabeça desde adolescente, tinha se tornado realidade.
De volta a realidade
Ponte Carlos (primeiro plano) uma das atrações de Praga. Crédito: Jeshoots | Unsplash
Perfeito…sonho pensado, sonho realizado! Mas, e depois? A essência humana nunca está satisfeita, quer sempre mais. Após essa viagem, eu buscava outro sonho. E além disso, tinha outra questão que eu estava tentando conviver: a volta para a realidade, para a vida normal de todo dia no Brasil me fazia sentir uma angústia avassaladora.
Com um sentimento constante de não fazer parte mais daquela vida e com a nostalgia da viagem só crescendo dentro de mim, eu decidi que tinha que dar um jeito de morar na Europa. O que me motivava a querer morar fora do Brasil era viajar mais pelo continente europeu, poder observar a diversidade de culturas. Misturado a tudo isso, eu sentia uma imensa curiosidade em saber como era viver em outro país. Curiosidade essa que tive que ir controlando desde a adolescência, pois eu queria muito fazer intercâmbio, mas não foi possível, pois minha família não tinha dinheiro para isso.
O destino
O caminho desde a vontade de morar na Europa até de fato o plano se concretizar foi permeado logicamente por dúvidas, incertezas e busca por respostas. Esse período durou três anos. E a resposta para minha busca veio de um simples telefonema do Felipe, que dizia que tinha encontrado um amigo de infância que era tcheco e viveu no Brasil por mais de 18 anos. Esse amigo morava em Praga, estava de passeio pelo Brasil e convidou Felipe para passar um tempo na cidade e ver como era a vida em Praga.
Até esse fatídico dia, nunca tinha considerado a República Tcheca como opção para viver. Simplesmente por acreditar que seria inviável, talvez muito mais impossível que em outras cidades europeias. Apesar de já ter estado em Praga antes, por um fim de semana, durante nosso mochilão, nem me passava pela cabeça morar lá. Mas, com a alma viajante que tenho, me lembro que a simples ideia de morar em Praga me trouxe uma empolgação imensurável. E, assim, Praga foi a resposta que eu estava procurando há muito tempo.
Propósito de vida
Raquel Rezende: “Viver fora da própria pátria traz desafios tremendos”. | Crédito: Priscila Roque
Agora, já se passaram oito anos que vivo em Praga e considero que foi uma decisão que me enriqueceu muito como pessoa. Viver fora da própria pátria traz desafios tremendos. Para passar e superar todos eles, a motivação para morar fora tem que ser muito grande ou o propósito de vida deve estar bem alinhado com essa realidade que envolve se adaptar a uma cultura bem diferente da qual você veio.
Apesar de tudo isso, gosto de viver aqui, porque a cidade oferece uma vida cultural intensa (tirando o período da pandemia, é claro), possibilidade de viajar para muitos lugares, pois o país fica no centro da Europa e também pela chance de conhecer pessoas do mundo inteiro.
Estilo de vida mais simples
Um dos aspectos que mais gosto daqui é como as pessoas em geral são simples, não se preocupam tanto com a aparência, e valorizam um estilo de vida mais despretensioso, como fazer caminhadas na natureza aos fins de semana, passar algumas horas lendo um livro acompanhado de um vinho em uma cafeteria ou simplesmente aproveitar o sol no meio do dia em uma das bem cuidadas praças da cidade.
Quando penso no Brasil, sinto falta dos programas e passeios em família, da comida (amo pão de queijo) e, claro, do atendimento e jeito de lidar com o público de forma mais amigável que só o brasileiro tem.
RAQUEL REZENDE é jornalista, mora em Praga há oito anos. Boa parte deles dedicados ao blog Praga Boêmia com foco na República Tcheca. Nos últimos anos, trabalhou para apurar informações sobre o país e entregá-las ao público em diferentes formatos de conteúdos e, assim, inspirar as pessoas a conhecer e se encantar por Praga e outras cidades tchecas. Antes de se mudar para Praga, vivia em Florianópolis (SC) e trabalhava como repórter para a revista/portal Empreendedor e vivia sonhando com viagens.
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