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Como escolher o melhor destino?
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Nossos roteiros de viagem são mais do que momentos para conhecer um ponto turístico; eles também vão ao encontro da nossa jornada interior, aquilo que nos transformamos ao voltar para casa. Por isso, conhecer nossos anseios mais profundos nos ajuda a decidir por um lugar que nos traga conexão com quem somos e podemos vir a ser

Não é de hoje que o ato de viajar representa, para muitos, a chave para a liberdade e a felicidade. A válvula de escape da rotina. Uma oportunidade de nos rendermos a experiências que deveriam mudar nossa vida. Já no século 19 o inglês Thomas Cook, considerado o pai do turismo moderno, acreditava que as viagens proporcionavam não apenas uma pausa para descansar das tarefas rotineiras mas oportunidades para ampliar a mente por meio de novos confrontos culturais. Segundo ele, viagens poderiam ir além e criar a “fraternidade universal” entre os povos. No entanto, os trajetos podem dar errado e não proporcionar a satisfação esperada. Compreender as razões pelas quais isso pode acontecer é transformar o ato de viajar na arte de viajar. Ou seja, ao escolhermos roteiros que se pareçam mais com a gente poderemos experimentar o seu real poder transformador. Mas, afinal, por onde podemos começar?

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Gosto de uma frase de Sócrates que diz que “a vida não examinada não vale a pena ser vivida”, que nos provoca a nos perguntarmos se estamos vivendo a vida que queremos viver ou a vida que outros querem que a gente viva. Olhando pela lente da arte de viajar, a pergunta que deveríamos nos fazer é bem parecida: “Estou viajando realmente do jeito que eu quero ou conforme os outros (família, amigos, sociedade) esperam que eu viaje? As expectativas em relação às minhas viagens são de fato minhas ou dos outros?”.

O roteiro pode acolher

Uma forma de olhar para essa questão é relembrar algumas de suas experiências mais recentes, e as razões que o levaram a este ou aquele lugar. Será que foi a ocasião de uma boa promoção? Ou porque o destino fazia parte de sua lista de desejos? Ou simplesmente foi um convite irresistível? Em algum momento você parou para pensar em como essa viagem poderia torná-lo uma pessoa melhor, além do alívio imediato do estresse ou da realização de uma vontade? É para essa jornada que eu gostaria de convidar você.

Mas por que isto deveria ser tão importante? Porque, em tempos de intensos questionamentos existenciais, por trás de nossos hábitos de viajar está uma poderosa fonte de autoconhecimento e realização pessoal. Assim como escolher um trabalho que a gente ame ou um parceiro que nos preencha exige de nós uma boa dose de autodescoberta, escolher trajetos que possam nos engrandecer e transformar nossa vida de fato também requer uma conexão com nossos anseios mais profundos. Caso contrário, corremos o risco de nos frustrarmos ao traçarmos objetivos e criarmos expectativas que não são nossos de fato.

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Ao encararmos o ato de viajar por essa ótica, nossos roteiros podem proporcionar o reconhecimento e acolhimento de nossos valores pessoais e aspirações mais profundas. Quem nunca se sentiu “fora de lugar” durante uma viagem, percorrendo lugares sem saber muito bem por que, visitando monumentos e igrejas sem o menor interesse, e ao mesmo tempo deixando de fazer coisas que realmente gostaria, como explorar um bairro que não consta no guia ou simplesmente passar um dia no quarto do hotel descansando? É justamente essa ousadia de desafiar a tirania dos guias de turismo e as expectativas de amigos e familiares ao voltarmos que nos torna muito mais autênticos e felizes.

Variados destinos nos fazem mais felizes

As jornadas exteriores também podem contribuir com nossa jornada interior à medida que aprendemos a identificar os viajantes que nos habitam e assim fazer melhores escolhas do que apontar o dedo no mapa e colecionar países. Afinal de contas, viajar não se trata exatamente dos locais que visitamos, mas sim da nova pessoa que nos tornamos ao voltar para casa. Nunca voltamos os mesmos. Como bem disse o escritor moçambicano Mia Couto, “a descoberta de um lugar exige a temporária morte do viajante”.

É partindo de peito aberto, prontos para novas descobertas e livres das imposições sobre o que deve ser visto e vivido que de fato nos entregamos às experiências que tocarão  nossa alma mais profundamente. E nem sempre essas experiências serão plenamente agradáveis ou conforme a imagem criada em nossa mente. Assim como a vida, as viagens também são feitas de altos e baixos, conquistas e desafios, e tudo merece ser aproveitado intensamente.

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Dentro de nós existem diferentes tipos de viajantes, que se alternam ao longo da vida. Em seu livro Sobre a Arte de Viver, Roman Krznaric caracteriza quatro deles: o peregrino (a viagem não é um meio para o fim, mas um fim em si mesmo) o turista (que não perde os principais pontos dos guias), o nômade (que aprecia a liberdade e simplicidade de um acampamento) e o explorador (aberto para abraçar as diferentes formas de viver e pensar naqueles lugares a que visita). Identificá-los e respeitá-los nos variados destinos também nos torna viajantes mais felizes, e nos ajuda a evitar situações como topar um acampamento em família quando o que você realmente precisa ou quer é passar um tempo sozinho.

A escolha do destino

Ao nos tornarmos viajantes mais conscientes, conseguiremos identificar os destinos ideais para curar nossa alma e desenvolver novas virtudes. Conhecer novos lugares abre oportunidades valiosas de fazermos pequenos experimentos sobre nós mesmos. Vencer a timidez em um país de idioma desconhecido, fazer novos amigos em regiões inusitadas, mudar de perspectiva na imensidão de um deserto ou acalmar a mente durante longos percursos. Portanto, para que possamos identificar que tipos de jornada têm mais probabilidade de transformar nossa arte de viver, ao considerarmos nosso próximo destino deveríamos nos fazer as seguintes perguntas: “Por que exatamente quero ir para esse lugar? Como esse destino pode me tornar uma pessoa melhor? Que virtudes vou exercitar? Que aprendizado pretendo aplicar na minha vida cotidiana ao retornar para casa?”.

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É através dessa conversa corajosa com nós mesmos que conseguiremos ter mais clareza sobre nossas necessidades e anseios, e encontrar nas nossas viagens oportunidades de atendê-los. Escrevo este texto durante uma esperada semana de férias com a família no sul da Bahia, em busca de um pouco de desconexão digital, contato com a natureza e tempo com quem amo. Digo que a experiência tem ido além. Por trás desses objetivos se revelam virtudes que busco para minha vida, como calma interior, confiança, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. As pequenas escolhas do dia a dia, da localização da praia às refeições do dia. Isso, além dos pequenos prazeres e desprazeres, me confrontam com quem sou e quem não sou. São esses experimentos que vão nos transformando, pouco a pouco, até que nos vemos outros.

Mônica Barroso é professora, coach e curadora de programas da The School of Life Brasil, onde ministra a aula “A Arte de Viajar”. Desde 2002 desenvolve e facilita viagens de propósito e transformação.

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