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É hora de refazer nossas conexões humanas
Helena Lopes | Unsplash
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Neste artigo:

Com o avanço da vacinação e a retomada da vida social se tornando uma realidade, talvez seja hora de nos perguntarmos: por onde andam nossos amigos?

Pelo menos uma vez por semana tenho visto um mesmo post circulando nas redes sociais. Um em que a pessoa diz aos seus amigos que está tudo bem se eles não deram notícias durante os últimos meses, porque todos passaram por situações difíceis durante a pandemia. Acho muito legal essa iniciativa empática – que também tem um pouco de autocompaixão – e um tom esperançoso de retomada. Algo no estilo “vamos continuar de onde paramos”, sabe?

E no trabalho? Também. Uma pesquisa da Microsoft, com mais de três mil pessoas de 31 países, mostrou que nas empresas as pessoas acabaram também se isolando um pouco mais, encolhendo as suas redes de relacionamento. Portanto, mantendo contato apenas com um pequeno grupo de pessoas que necessitavam.

Seja por ter que lidar com as situações decorrentes do escritório ter invadido suas casas. Seja porque o que parecia uma solução acabou também virando um problema: a fadiga do Zoom. Precisamos recorrer tantas vezes às chamadas por vídeo, das milhares de reuniões aos happy hours, que nos cansamos delas.   

Cansaço

Nas empresas, a falta dos encontros informais, da hora do café e das conversas de corredor teve um efeito importante: a diminuição da criatividade. A explicação é simples, nosso processo criativo depende do quanto somos expostos a outras ideias, referências e opiniões.

Se ninguém te fala sobre um tema desconhecido, te apresenta um livro ou questiona uma ideia sua, dificilmente você chegara a algo novo. Já na vida pessoal, mais do que criatividade, a ausência de conexões reais ameaça nosso senso de pertencimento.

refazer conexões

Jed- Villejo | Unsplash

Isso porque, devido a frouxidão dos laços de amizade combinada à hiperconexão, desenvolvemos um novo tipo de relação. As parassociais ou as que prefiro chamar de amizade platônica. Que assim como os amores platônicos, só são interessantes em enredos de ficção.

Um amigo

Por fim, para entender como isso acontece e nos afeta, precisamos voltar no tempo, resgatando a história da amizade. De acordo com a historiadora Brendan Mackie, a palavra amigo passou a surgir com mais frequência em livros e documentos na Europa. O início foi a partir do século XIV, pós Peste Negra e durante a Grande Fome. Foi durante esse período que tivemos famílias, tradicionalmente extensas, sendo drasticamente reduzidas. Porque até aquele momento era o núcleo familiar o mais importante espaço de pertencimento.

Todavia, com sua diminuição, novas formas de relacionamento começaram a surgir e se expandir, para dar conta da nossa necessidade de pertencer. Vemos então florescer confrarias, irmandades, clubes e sociedades (como a dos poetas mortos? Sim).

Crise

Até os dias de hoje, de acordo com Brendan, já passamos por várias crises de pertencimento. E sempre que elas vem, encontramos novas formas de criar conexão e sentido. A crise mais recente, gerada pela pandemia de coronavírus, nos fez desenvolver amizades platônicas com apresentadores de podcast e produtores de conteúdo digital em geral.

Assim, o formato de conversa, o acesso a informações da vida pessoal e até mesmo a facilidade para levar essas pessoas (dentro do smartphone) para toda parte, fez com que muita gente desenvolvesse relações significativas com elas. O problema é que elas são unilaterais, e assim, ao invés de resolver nossa necessidade de pertencer, apenas aprofunda a sensação de desconexão, pela frustração da falta de reciprocidade.

Regresso

Durante a pandemia, desenvolvemos uma espécie de relação parassocial até mesmo com nossos reais amigos. Acompanhamos posts e vídeos deles à distância, sem alimentar a troca, a não ser através de uma mera curtida. Por isso, para recuperar nossa criatividade no trabalho, expandir nosso repertório e nos sentirmos pertencentes novamente, talvez seja hora de resgatarmos nossas conexões reais.

Abrir espaço nas nossas agendas para enviar uma mensagem, fazer uma ligação ou escrever um e-mail. Saber como as pessoas importantes para você passaram pelos últimos meses. O que sentiram, como estão e o que vocês podem voltar a fazer juntos.  Amizade é necessidade básica. Deve ser por isso que o Emicida canta: quem tem um amigo tem tudo.


Tiago Belotte é fundador e curador de conhecimento no CoolHow – laboratório de educação corporativa que auxilia pessoas e negócios a se conectarem com as novas habilidades da Nova Economia. É também professor de pesquisa e análise de tendências na PUC Minas  e no Uni-BH. Seu Instagram é @tiago_belotte. Escreve nesta coluna semanalmente, aos sábados.

*Os textos de nossos colunistas são de inteira responsabilidade dos mesmos e não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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