Síndrome da boazinha: um pesadelo chamado necessidade de agradar
Você já se pegou dizendo "sim" quando queria dizer "não"? A necessidade de agradar pode trazer um alto custo para sua autenticidade.
Há umas semanas, num elegante evento social, experimentei o doce sabor da vitória pessoal ao pronunciar uma série de “nãos” consecutivos. Talvez à primeira vista, isso possa soar trivial. Mas para alguém – como eu – que se sente numa longa recuperação da “síndrome da boazinha”, foi uma experiência marcante de superação. Isso porque a necessidade de agradar nos faz dizer “sim” quando tudo que queremos dizer é “não” e, como consequência, pagamos um alto custo perdendo a nossa autenticidade.
Aprendendo a dizer “não”
A primeira oportunidade surgiu pouco tempo depois de chegar na festa. Convidaram-me para um jogo em grupo, quando na verdade eu precisava de um momento mais calmo. Normalmente, eu teria aceite, mesmo que não estivesse com vontade, apenas para não os desapontar. Mas naquela noite, respirei fundo e gentilmente recusei, caminhando em direção ao jardim no exterior.
Mais tarde, quando me trouxeram um pedaço de bolo da festa, novamente optei por ser sincera e recusei. Naquele momento, lembrei-me da minha infância e dos incontáveis bolos de aniversário que engoli (enjoada!), só para não fazer a desfeita. A pessoa que me fez a oferta reagiu com um sorriso compreensivo e, em vez de insistir, ofereceu a fatia a outro convidado.
A melhor parte aconteceu quando me dirigi ao grupo e disse: “Acho que está na hora de eu ir embora.” Eles prontamente responderam: “Também queremos ir, mas ninguém foi embora ainda. Vamos esperar pelos primeiros a sair.” Com um sorriso, respondi: “Não seja por isso, vou ser a primeira mesmo.” Cumprimentei os anfitriões, agradecendo a hospitalidade e simplesmente me despedi. Talvez seja difícil de imaginar, mas enquanto o barulho da festa diminuía atrás de mim, a sensação de liberdade aumentava.
Aquela noite acabou por se transformar em mais uma prova pessoal de respeito por mim mesma. Foi um reflexo da minha própria autenticidade, mostrando que a verdadeira aceitação vem quando somos fiéis aos nossos próprios limites e necessidades. Mesmo que isso signifique desafiar as expectativas alheias.
Saí daquele evento com uma profunda sensação de integridade. Como se tivesse entrado inteira e saído intacta, sabe?
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As 8 principais características das pessoas “agradadoras”
Estar disposto a ajudar, pensar nos outros em primeiro lugar, querer corresponder às expetativas, não criar conflitos e nunca dizer “não”. A sociedade frequentemente enxerga essas atitudes como dignas de elogio e modelos a serem admirados.
Afinal, qual é o mal de agradar? Nenhum. O problema acontece quando, na ânsia de construirmos relações harmoniosas, anulamos nossas vontades ou negligenciamos até as nossas necessidades mais fundamentais.
As pessoas “agradadoras” (aquelas que sentem sempre a necessidade de agradar):
- Tendem a ser extremamente atentas às necessidades dos outros. São pessoas que demonstram empatia e compaixão de forma natural. Contudo, frequentemente perdem contacto com o seu interior ao estarem demasiado vigilantes do ambiente à sua volta.
- Fingem que concordam com todos. Ouvir educadamente as opiniões de outras pessoas – mesmo quando discordamos é uma importante habilidade social. Mas fingir concordar apenas porque queremos ser gostados pode levar-nos a comportamentos que vão contra nossos valores.
- Sentem-se frequentemente responsáveis pelo que os outros sentem. É saudável reconhecer como nosso comportamento influencia os outros. Mas pensar que temos o poder de fazer alguém feliz é um problema. Da mesma forma que sentirmo-nos culpados pelo fato de nem sempre correspondermos com as expetativas alheias.
- Pedem desculpa constantemente. Seja por se culparem excessivamente ou por temerem que os outros estejam sempre a julgá-las, pedem desculpa até por sentirem o que sentem ou por serem quem são.
- Não conseguem dizer ‘não’ nem expressar desagrado. Geralmente não reconhecem os seus limites ou acham-nos pouco apropriados, como se não tivessem o direito de os expressar.
- Agem como as pessoas ao seu redor. Pessoas que sentem necessidade de agradar adequam o seu comportamento ao do grupo, deixando de fazer escolhas autênticas.
- Não assumem, mas precisam de validação para se sentirem bem. Embora elogios e palavras gentis possam fazer qualquer um sentir-se bem, os “agradadores” dependem do reconhecimento para se sentirem seguros de si.
- Esforçam-se ao máximo para evitar conflitos. Não querer iniciar conflitos é uma coisa. Mas evitar conflitos a todo o custo significa que temos dificuldade em defender as coisas – e as pessoas – nas quais realmente acreditamos.
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As pessoas que sentem necessidade de agradar demais frequentemente fogem de situações de confronto e rejeição. A maioria destas pessoas esconde-se atrás destes comportamentos na tentativa de, ao agradar, terem menos hipóteses de se sentirem excluídas, rejeitadas ou abandonadas. Elas têm também um medo profundo de serem magoadas. A compulsão por ser agradável é apenas uma forma de assegurar que os outros não os veem como ‘’inimigos’’. Para além disso, têm medo de que os outros se desiludam, frustrem ou fiquem chateados consigo.
No fundo, este é o medo de não serem gostados. Essas pessoas temem igualmente o erro e a falha, especialmente porque isso afeta o seu autoconceito. Geralmente, personalizam os erros de tal modo que sentem aversão à sua própria imperfeição. No final das contas, pessoas agradáveis e boazinhas demais fogem de tudo que as obrigue a posicionar-se na frente do outro. Temem ser vistos e, essencialmente, temem julgados.
A origem da necessidade ou compulsão por agradar, geralmente, está enraizada na infância. E ainda que hoje ela possa representar um “problema”, no passado, ela foi um mecanismo de defesa.
Muitas pessoas que sentem necessidade de agradar aprenderam desde cedo que o amor e aceitação estavam condicionados ao seu comportamento agradável. Quando agiam de maneira obediente e gentil, eram recompensadas com carinho e aprovação. Já qualquer sinal de desobediência ou discordância resultava em punições ou rejeição. Essas vivências moldaram não apenas sua visão de si mesmas, mas também de como enxergavam os outros, criando um ciclo incessante de busca por aprovação.
Por outro lado, há aqueles que sentem sempre necessidade de agradar não exatamente por experiências diretas de rejeição, mas porque tiveram essas referências em suas vidas. Quando cuidadores ou figuras significativas na infância recorrem a esse comportamento para lidar com seus relacionamentos, a criança absorve essa estratégia. Assim, a ideia de desagradar torna-se associada à dor e ameaça emocional, reforçando ainda mais o hábito de agradar a todo o custo.
Esse foi o meu modelo. Minha mãe sempre se esforçou ao máximo para agradar a todos ao seu redor. Ela raramente expressava suas próprias necessidades ou desejos, sempre colocando os outros em primeiro lugar. A princípio, isso parecia admirável, mas com o tempo, percebi o quanto afetava sua saúde e bem-estar.
Ela frequentemente se sentia sobrecarregada e exausta. Lembro-me de vê-la negar a si mesma momentos de descanso e relaxamento para atender às demandas alheias. Seu sacrifício constante a deixava emocionalmente drenada e, eventualmente, começou a afetar sua saúde física.
Foi quando, um dia, a observei cuidando dos outros enquanto ignorava suas próprias necessidades básicas que tive um momento de clareza. Olhei para minha mãe e percebi que estava vendo minha versão futura. Eu caminhava na mesma direção: tentaria agradar a todos e, no caminho, iria certamente perder-me de mim.
A necessidade de agradar a todos pode custar nossa própria essência. E não sei quanto a você, mas, para mim, esse é um preço demasiado alto.
Essa visão do meu futuro foi impactante. Eu não queria chegar ao ponto em que minha saúde e bem-estar fossem sacrificados em nome da validação externa. Não queria enfrentar a exaustão física e emocional que minha mãe estava vivenciando e muito menos ficar prisioneira das agendas dos outros…
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“A arte de desagradar” ou, em outras palavras, como exercitar sua autenticidade
Poderia dizer-te que existem mil e uma formas para aprender a desagradar, mas já sei que a pergunta que se seguiria seria: “certo, mas como fazê-lo sem sentir medo ou culpa?”
A verdade é que não tem como fazer isso sem tolerar esses sentimentos. Se você cresceu acreditando que ser autêntico poderia te ferir ou quebrar seus vínculos… você terá medo. Se você cresceu se sentindo responsável pelo que os outros sentiam… você sentirá culpa. Não tem jeito. Acredito que o ponto central não é encontrar uma forma de colocar limites sem sentir isso, mas antes, aprender a fazê-lo mesmo que esses sentimentos venham. Pelo menos, foi essa a única forma que encontrei de começar a colocar os meus. Em vez de tentar dizer “não” sem culpa, eu precisei abrir um espaço seguro dentro de mim para esse sentimento.
É paradoxal, mas precisei aprender a tolerar o meu próprio desconforto a curto prazo, em prol do meu bem-estar a longo prazo.
Precisei aprender a conviver com o sentimento de medo e culpa ao dizer “não”, para conseguir dizê-lo com cada vez menos aflição.
Pode experimentar coisas simples: dizer “não” a um bolo de aniversário ou sair mais cedo do que todos os outros numa festa, seria um bom começo. Quando isso começar a gerar algum senso de libertação, passe para situações mais complexas. Há um enorme poder em exercitar sua autenticidade dizendo: “não posso”, “não quero”, “não gosto” e não vou”.
A verdade é que o resultado de colocarmos limites é geralmente muito menos dramático do que aquilo que imaginamos ser. Quando colocamos os nossos limites de forma assertiva as pessoas tendem até a respeitar-nos melhor. Ainda assim, mesmo que a pessoa te respeite não significa que não se frustrará. Afinal, é normal sentir desconforto quando nossas necessidades não são correspondidas. O fato de ser legitimo o outro sentir desconforto, não significa que você é culpado ou fez algo de errado. Agora: se no limite, as pessoas à nossa volta não respeitarem nossos limites e necessidades, talvez a decisão não seja mais deles. Se o outro só nos ‘aceita’ se nos anularmos, ele está invalidando partes importantes da nossa autenticidade. Pois em vez de tentarmos corresponder com suas expetativas, talvez tenha chegado a hora de rever esses vínculos na nossa vida, não concorda?
PARA SABER MAIS:
Confira o livro “A síndrome da boazinha: Como curar sua compulsão por agradar”, best-seller de Harriet B. Braiker.
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