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Por que não?
Aditya Saxena | Unsplash
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Entender o motivo pelo qual você faz o que faz, do trabalho às conquistas pessoais, é essencial para dar mais sentido à nossa existência

Quando comecei a escrever este texto, me veio a velha incerteza do uso dos porquês. Afinal, pode ser “porque” junto ou separado, e ainda podem, ambas as formas, receber ou não acento. Não tive dúvida: liguei para um amigo que sabe dessas coisas, o professor Pasquale. Com seu jeito calmo e simplificador, ele me deu a primeira lição: separado é pergunta, junto é resposta. O “por que” sempre esconde a palavra razão ou motivo. Então, se seu filho pré-adolescente pergunta “por que eu tenho que comer salada?”, ele espera, como resposta, uma razão lógica, um motivo que faça sentido para ele. De pouco adianta responder “porque sim”.

Eu sei… O exemplo não foi bom, porque há fases na vida em que a razão não é soberana, e a pré-adolescência é uma delas. Mas deu para entender: “por que”, separado, pede uma razão. O “porque”, junto, indica a razão, explica o motivo, que tanto pode ser, nesse caso, “porque faz bem para a saúde”. O relevante aqui é a explicação clara do grande professor de português. O “por que” embute a busca de uma razão, e nós precisamos de razões para fazer coisas na vida. O “porque” explica, esclarece, dá o motivo, cria movimento. Trata-se de uma conjunção subordinativa causal ou explicativa. Isso mesmo: causal, de causa, razão, lógica.

Existem ótimos exemplos do bom uso da linguagem na comunicação, incluindo os porquês e seus assemelhados. Um deles é do inglês Simon Sinek. Advogado de formação, com especialização em antropologia social, ele tem se dedicado a entender como a comunicação mobiliza as pessoas. Sinek já havia lançado alguns livros sobre liderança quando resolveu se dedicar a compreender como os grandes líderes falam. O que ele percebeu é que os líderes, na verdade, respondem às perguntas que nós gostaríamos de fazer, antes mesmo que as façamos. A consequência é uma sintonia imediata.

Mas ele foi além. Tratou de descobrir quais eram as perguntas clássicas que esses líderes respondiam, por acreditar que eram as que realmente mobilizavam as pessoas. Essa busca o levou a criar um modelo extremamente simples de comunicação, que ele chamou de Golden Circle, ou círculo de ouro. O nome pode parecer um exagero, mas tem o impacto de comunicação que todas as boas ideias têm.

Quando lhe pedem para explicar, ou quando dá uma palestra, ele utiliza uma ferramenta banal: em um pedaço de papel, desenha três círculos, um dentro do outro. No menor, escreve why (por que), no intermediário how (como) e , no externo, what (o que). E então explica como acontece o processo de comunicação da maioria das pessoas e também das empresas. O padrão, diz ele, é seguir “de fora para dentro”, ou seja, dizer o que tem que ser feito e como fazer. E, só então, se sobrar tempo, explicar o “por que”.

Os grandes líderes, diz ele, fazem o contrário, se comunicam “de dentro para fora”. Começam dizendo por que algo tem que ser feito. Seja uma tarefa, uma missão, uma causa, um produto. Se entendermos “por que” fazer, “o que” e o “como” serão consequência naturais.

Pensando bem, faz sentido. As pessoas estão em busca das razões, dos significados, dos motivos que realmente nos mobilizam a fazer qualquer coisa, seja um trabalho, uma mudança, um deslocamento ou uma compra. Se soubermos o motivo real, faremos. Se não entendermos, talvez façamos, mas sem o mesmo empenho.

Essa seria a verdadeira motivação por trás das grandes realizações. Colombo descobriu o novo mundo, não porque gostava de navegar e sabia como. Ele estava convicto de que havia outro lugar e queria conhecê-lo. Steve Jobs nem sequer gostava de programação, mas queria mudar o mundo através de computadores simples e acessíveis. O “por que” é poderoso. “Quem tem um bom ‘por que’ suporta qualquer ‘como’”, teria dito Viktor Frankl aos companheiros de infortúnio em Auschwitz, fazendo com que eles sobrevivessem à condições sub-humanas, apenas mirando o futuro, o fim da guerra, a retomada de sua vida. Essa postura firme e positiva salvou muitas pessoas. Seu pequeno livro Em Busca de Sentido é sensacional.

Sim, o significado é poderoso. Os professores sabem disso. “Educação é um acontecimento social, em que alguém chamado professor compartilha significados com alguém chamado aluno”, disse o educador americano Bob Gowin. Ele subordinou o conhecimento ao significado. A ideia de mobilizar as pessoas através do significado já é bem conhecida entre os educadores e entre os profissionais de recursos humanos. A empresas adotam, com frequência, a definição de uma missão, para que os funcionários estabeleçam uma relação entre a tarefa que realizam e algo maior. Mas eis que surge um complicador nessa equação linguística-psicológica. Mesmo sabendo por que, o que, e como, ainda temos que enfrentar as chamadas “forças contrárias”, que existem, e são de vários tipos.

Eu posso estar convicto de que algo deve ser feito; mesmo assim, titubeio. E isso acontece pelo fato de que, para fazê-lo, terei que tirar muitas pedras do caminho, e nem sempre me sinto capaz ou forte o suficiente. É quando surge uma variante dos porquês: o “por que não?”. Pode parecer sutil demais, mas o simples acréscimo do “não”, na pergunta, aumenta a convicção do “sim”. Se alguém o convida, por exemplo, para passar um final de semana na praia ou para ir a uma festa. Se você recebe uma proposta para mudar de emprego. Se você tem a ideia de abrir seu próprio negócio. E, se alguém, como Vinicius, lhe disser: “Você quer ser minha namorada / ai que linda namorada / você poderia ser…”, o que você pensa?

Se você, como propõe Sinek, valer-se do why, terá uma boa chance de encarar tudo isso. Mas, se ainda acrescentar o why not, a chance aumenta consideravelmente. Por que não mudar de postura, livrar-se de carmas indesejados, de hábitos destrutivos, de um trabalho sem sentido, de medos irracionais, de coisas que atrapalham? Por que não viver uma vida mais leve, mais solta, mais alegre, com mais significado? Por que não fazer crescer a vida simples que existe dentro de si mesmo? Pergunte-se. Talvez você se surpreenda ao descobrir que o “não” pode ser controlado, quando não for uma ficção.

 

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