Livremo-nos das relações tóxicas
Relações tóxicas não se limitam a relacionamento amoroso, às vezes outras relações podem ser pautadas pela agressividade
Relações tóxicas não se limitam só a relacionamento amoroso, às vezes outras relações familiares ou até mesmo aquelas com nossos próprios sentimentos podem ser pautadas pela agressividade
Vários e-mails chegaram para mim, compartilhando experiências de relações abusivas. Nesta semana, uma colega me procurou para conversar sobre um trabalho que está realizando sobre esse tema; num grupo de discussão que participo, esse assunto apareceu, assim como num caso que supervisionei;. um paciente o trouxe também… Sem dúvidas, esse é o tema da semana.
Quando me refiro a relações tóxicas, digo de relações marcadas pela violência e pela restrição, ou seja, pela diminuição do acesso à liberdade e pela opressão.
Muita gente pensa isso imediatamente ligado a relações românticas, mas são muitas as possibilidades. E as relações familiares são as grandes campeãs.
Elas são costumeiramente o espaço violento e agressivo primeiro que experimentamos. Se a sua família não é desse tipo, acredite, você é privilegiado.
Mas temos outras relações tóxicas diferentes para analisar. Outro dia percebi a relação tóxica que temos com a ansiedade. Parece estranho, mas a ansiedade funciona como uma bad trip. Se você faz uso de qualquer substância psicoativa, pode ter uma bad trip, que é uma sensação desagradável, fisiológica ou psíquica.
Neste caso, a recomendação é relaxar o máximo possível, agarrando-se na lembrança de que isso vai passar e, se der, aproveitar essa produção fantasiosa e registrá-la por escrito ou como puder, para depois aprender mais sobre si mesmo através dela.
Bom, mas o fundamento da bad trip é justamente a dificuldade em relaxar e ter a lembrança de que vai passar: com medo de ter medo ou dor, a gente se desespera e produz mais medo e dor. E isso é o que também fazemos com a ansiedade.
Muitos relatos de crise de ansiedade falam que o medo de a crise aumentar opera como um disparador para o aumento da crise. Sim, porque a gente esquece de ficar “no vai passar” e, na hora em que precisamos atravessar as dores, insistimos em tentar nos livrar delas a qualquer custo e da forma mais rápida possível.
Atravessar a dor não é estabelecer uma relação tóxica com ela, e há uma grande distância entre essas duas coisas. Aliás, justamente abrir mão da toxidade, deixar ela ir, é que possibilita nossa travessia. E isso, muitas vezes, implica aceitar a necessidade de atravessar a dor e de aprender com ela.
Essas relações tóxicas podem se dar com várias coisas: pode ser o crack, a mãe, o trabalho, o álcool, o açúcar, a internet, os filhos, o amor, comigo mesmo… No final, a questão não é o quê, mas como me relaciono com as coisas ou com as pessoas, qual a qualidade de afeto que dá sentido para determinado encontro, ou desencontro. E isso nunca depende de apenas um dos envolvidos na relação.
Por isso, fazer um “detox” – afastarmo-nos da toxidade de uma situação – nos ajudar a identificar a dimensão dos barulhos que estamos vivendo e do silêncio que está nos faltando, para podermos sair de uma bad trip, e nos focando em relações não violentas e pautadas pela liberdade.
Myrna Coelho é psicóloga clínica, professora e doutora pela USP. Decidiu recomeçar a vida do outro lado do oceano, onde segue atendendo seus pacientes e dando supervisão online. Por aqui, semanalmente, reflete sobre como podemos viver com mais liberdade de ser. Mande sua mensagem para: [email protected].
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