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É realmente a maternidade que nos suga as energias?
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Desde cedo somos submetidas a uma grande lavagem cerebral sobre o quão romântico e lindo será quando tivermos um filho. Somos incentivadas, desde crianças, a entender que ser mãe é nosso destino, e ele é parecido com um comercial de margarina da década de noventa. O que acontece na realidade é que sofremos um grandiosíssimo tombo por conta da distância entre essa idealização e a realidade que se coloca frente a nós quando a criança vem.

E a coisa vai além: individualizam nosso sofrimento, quando sentimos a dor desse tombo e nos sentimos autorizadas a falar dela. Nos fazem acreditar que existe algo de errado conosco por não conseguir sentir essa plenitude materna e dar conta da criança e de todo o resto, ou que existe algo de errado com a criança que não está nos oportunizando essa plenitude ou não ameniza a situação toda pra nós.

Nunca é sobre um sistema que explora o trabalho não pago de mulheres no lar e as sobrecarrega a ponto delas, por exemplo, aceitarem soluções violentas para fazer com que a criança de dois meses durma 8 horas seguidas e assim sigam cuidando de todo o resto.

Nunca é sobre as leis patriarcais que não permitem que haja paridade no cuidado da criança, que não permite que a mãe tenha nem seis meses pra aleitar sua criança em casa, nunca é sobre a falta de apoio de creches para quando ela precisar voltar, nunca é sobre abandono paterno e nem sobre divisão de carga do trabalho doméstico. É unicamente sobre sua dificuldade individual. Sobre sua criança que não se adequa ou sobre sua maternidade que precisa ser consertada.

Uma pergunta que muda tudo

Se o trabalho fosse só (só?) cuidar da criança, sabendo que o trabalho formal estaria garantido daqui um ano, que a grana não iria sumir, que a casa, roupa e a comida seriam cuidadas por alguém que te apoia, que teria vaga disponível com horários decentes na creche quando precisasse, que daria pra você cuidar da tua saúde emocional e física, sabendo que poderia confiar em outras pessoas pra cuidar da criança sem medo de abuso e de negligência, será que ainda nos sentiríamos tão sugadas por essa criança e essa maternidade?

Nos sentimos assim porque cuidar de uma criança enquanto cuidamos do trabalho físico e mental de deixar uma casa organizada, resolvendo nossas próprias questões íntimas, e, pra muitas, fazer isso enquanto trabalha formalmente e sem rede de apoio é uma missão impossível, mas nos fazem acreditar que não só é possível, como é a norma.

O que nos suga não é apenas a maternidade, é estarmos inseridas num contexto em que a maternidade é idealizada, explorada e solitária, e ainda sermos responsabilizadas por resolver tudo isso individualmente.

Eu não acredito no mercado materno que não atravessa raça e gênero no seu discurso, e por isso não compro nem a ideia da maternidade que suga a mãe, e nem da mãe que somente precisa “se auto cuidar ou se autoconhecer um pouco mais” pra conseguir não sofrer tanto com tudo isso.

Cuidemos de nosso autoconhecimento e do nosso cuidado num contexto crítico, integrado, para que não sigamos reforçando uma cultura opressora sobre nós e para que nossas crianças não levem a culpa sobre o nosso cansaço, falta de liberdade e sobrecarga.


Thais Basile é mãe da Lorena, palestrante e consultora em inteligência emocional e educação parental, eterna estudante. Apaixonada por relações humanas e por tudo que a infância tem a ensinar. Compartilha um saber para uma educação mais respeitosa no @educacaoparaapaz. Escreve nesta coluna mensalmente.

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