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Como lidar com o tédio da espera sem se sentir mal com o silêncio?
Priscilla Du Preez
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Recentemente, vivi uma experiência que me trouxe reflexões sobre a importância da paciência, da contemplação e da desconexão digital. Em um momento de aparente tédio, vi que estar consigo mesmo é, às vezes, mais difícil do que estar com os outros.

Decidi escrever sobre como esses aspectos podem nos ensinar a lidar melhor com o tempo de espera e com a sensação de tédio. Assim, quem sabe, podemos aprender apreciar mais o silêncio e a presença no momento presente.

O que fazer enquanto esperamos? Afinal, é preciso “fazer” algo?

Fui ao hospital acompanhar uma pessoa próxima em um exame. Podia demorar entre uma e três horas. Levei o celular e um livro. Trabalhar ou me distrair. Não havia passado pela minha cabeça ficar sentada sem fazer nada.

Tenho dificuldade em estar quieta comigo mesma. Deixar a mente tranquila, sem o turbilhão de pensamentos que me acompanha como uma criança a cutucar a cintura.

A sala de espera era ampla e vazia. Além de mim, uma mulher jovem e um senhor por volta dos setenta anos. A mulher, que foi embora primeiro, ficou o tempo todo no celular. Quarenta e sete minutos no Instagram, contados no grande relógio na parede em frente ao sofá. Como estava do meu lado, pude acompanhar o passeio pela rede social. Ela subia a tela, descia, passava para um lado, para o outro. Abria um vídeo, desistia, ia para o seguinte. Não me lembro dela ter parado mais que alguns segundos em alguma coisa. E precisei deixá-la a sós na viagem, porque o giro frenético pela tela começou a me dar tontura e enjoo. Nunca tive estômago para curvas.

Sem artifícios e, mesmo assim, confortável com o silêncio

Com a partida da mulher, ficamos eu e o senhor. Ele continuava como estava desde a minha chegada. Sentado, calado. Sem aparelho nas mãos, sem livro. Sem folheto de supermercado ou qualquer distração. No bolso da camisa, a carteira e um papel branco dobrado. De vez em quando ele cruzava as pernas. A esquerda por cima, a direita. Não parecia entediado. Nem desconfortável. Cumpria com diligência o que havia se proposto a fazer, esperar.

Abri o livro, mas não consegui concentrar na leitura. Eu tentava controlar o olhar e a mente, mas ambos caminhavam em direção ao meu colega. Quem seria ele? Por quem esperava? Um exame de rotina, procedimento simples ou cirurgia grave? Que tipo de homem era aquele, com aquela idade, ali a aguardar? A filha apareceu, quebrou o silêncio prolongado. Mas foi embora rápido, nos deixando como estávamos. Eu com a minha inquietude permanente, ele calado.

Senti inveja do homem. Aquela inveja boa que de vez em quando a gente sente. De vê-lo assim tão confortável com o silêncio, com a espera, consigo mesmo.

Sem precisar de nenhum artifício para passar o tempo. Se fosse falante, poderia dar cursos, criar um perfil na rede social que, quem sabe um dia, a mulher jovem pudesse seguir, e aprender. Eu também. Carente dessa virtude tão rara e necessária da quietude, de dar tempo ao tempo, estar aqui e pronto.

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Um pássaro grande bateu na enorme parede de vidro atrás de nós. Levantamo-nos os dois. O pássaro insistiu. Bicava o vidro. “Deve estar tentando passar”, eu disse. “Ele está brigando com o reflexo”, falou o homem. “Já esteve aqui mais cedo”. Aproveitei o canal recém-aberto e perguntei se ele estava esperando por alguém. Sim, pela mulher, procedimento simples, mas demorado. Não precisaria ficar internada, teria alta de tarde.

O paciente que eu aguardava saiu. Me levantei, despedi do senhor e entramos no elevador.

Antes de apertar o térreo, olhei para meu ex-colega de sala mais uma vez. Sentado, calado. Tinha pela frente várias horas de espera e permanecia tranquilo. Nada me pareceu tão grandioso e tão seguro. Tão inteiro e tão completo.

Estar consigo tanto tempo e não cansar de si. Estar calado e não se perturbar. Sem fugas aleatórias para tela de um celular. Ciente do seu espaço no mundo. E seu papel. No momento, esperar. Quem dera eu, um dia, chegue a ser assim.

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