A gente não precisa se reinventar
Consumimos tanto e a todo momento que em algum momento da história passamos a nos confundir com os produtos.
Só tenho esta explicação para o fato da gente querer fazer um relançamento de marca, uma versão reformulada do produto ou uma faixa de “sob nova direção” de nós mesmos. No início do ano então, sinto que essa onda vem mais forte. Tem gente que parece que está até reencarnando numa nova vida. Muda tudo – casa, amigos, país e conta no Instagram.
Longe de mim criticar ou avaliar o comportamento de alguém. Cada um sabe de sua história e suas motivações. Eu só quero propor um outro olhar. Será que quando nos propomos uma reinvenção, é porque queremos apagar a história pregressa e costurar uma nova perfeitinha? Sem furos, remendos ou amarrotados. É que meu medo é me concentrar em produzir uma nova versão de mim mesmo e perder duas coisas preciosas: o tempo e a noção de valor.
O tempo, porque a vida não para de acontecer enquanto eu estou aqui criando uma nova forma de ser. Corrigindo, para sim. Para pra mim, que deixo de aproveitar a vida que eu tenho. Já me peguei diversas vezes querendo começar de novo. Do zero. Mas nenhum recomeço parte do zero e isso, acredite, torna as coisas mais interessantes. Na minha trajetória profissional eu trabalhei com tecnologia, com design e conteúdo. Dou aulas, cursos e empreendendo meu próprio negócio há 10 anos. Mas antes eu já tinha sido sócio de outra empresa e saí pra recomeçar minha carreira. Quis deixar a tecnologia para trás, depois quis deixar o design também no passado. E assim foi, por um tempo.
Até eu perceber que meu passado na tecnologia me tornam um professor melhor, um pai melhor e um marido melhor. Uso recursos nas aulas que talvez outros professores não conheçam, tento preparar minha filha para ser fluente no mundo digital sem se tornar refém da tecnologia e sou o melhor suporte 24h que minha esposa em home office poderia ter.
Aí olho para o design e vejo a mesma coisa. Nunca fui tão designer quanto agora.
Se reinventar é tentar parar, mudar e criar uma versão perfeita de si, num mundo imperfeito e numa vida que nunca é interrupção e sempre continuidade. Coisas podem ser reinventadas, nós não. E se for pra gente se confundir com algum produto, que seja com os livros. Aí, ao invés de novas versões, teremos novos capítulos, que respeitam tudo que aconteceu nos capítulos anteriores e servem de base para o que estão por vir, nas próximas páginas.
*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.
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