Paternidade solo após divórcio desafia estereótipos na criação de filhos
A paternidade solo exige uma compreensão do que é ser homem e pai, mas também demanda uma rede de cuidado e auxílio com a saúde mental.
Embora o número ainda seja o pequeno, a quantidade de pais solo no Brasil cresceu ao longo dos anos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 3,6% das famílias eram mantidas por pais solteiros, de acordo com o último levantamento, realizado em 2015. Embora seja uma vivência que exige atenção e cuidados, a paternidade solo também é uma oportunidade de conexão maior com os filhos.
É comum que o período do término de uma relação ou o rompimento brusco possa trazer prejuízos não só para o casal, mas também para os filhos. Por isso, assumir a paternidade e o cuidado integral exige não só preparo, mas uma rede de apoio disposta a contribuir para o crescimento da criança.
Para a psicóloga Mariah Theodoro, há construções culturais que definem o papel e atuação do homem na relação familiar. Frequentemente, ele se torna responsável pelos provimentos financeiros e, por isso, as tarefas de cuidados são historicamente associadas às mulheres, que ainda são vistas a partir de um discurso que recorre à feminilidade e aos dons naturais do corpo feminino.
“Dependendo do meio em que ele (pai) foi criado e do repertório que tem dentro do ambiente familiar e cultural, torna-se impedimento ou até mesmo uma lacuna de fonte paterna no cuidado dos filhos“, diz a especialista, que é mestre em Ciências pelo Departamento de Medicina Preventiva da Universidade de São Paulo (USP).
O que é a paternidade solo?
Essa pergunta vai de encontro também com o que é ser homem, especialmente com todas as mudanças culturais nos últimos séculos. “O que é ser homem, assim como o que é ser pai, são construções culturais e não uma determinação biológica“, explica o psicanalista Guilherme Facci, apresentador do podcast A loucura nossa de cada dia. O especialista comenta também que o discurso de que a mulher veio ao mundo para cuidar, e o homem para prover, não se sustenta mais há algumas décadas.
Para ele, há novas possibilidades de compreensão para entender o que é ser pai hoje. “As novas paternidades tornam possíveis uma divisão mais equilibrada dos cuidados de um filho”, diz Facci. A preocupação passa então a ser não só as compras e responsabilidades financeiras, mas também os cuidados afetivos.
“Tudo o que uma mãe é capaz de fazer, um pai também é (com exceção da gestação), e, mesmo assim, isso não quer dizer que ele não possa participar de maneira ativa e próxima, que é quando o campo do desejo dos pais em relação à criança que vai nascer está sendo construído”, diz o psicanalista.
Outro ponto de virada é a noção de responsabilidade e autoridade que vai sendo ressignificada ao longo do percurso. Por isso, a autoridade masculina vai dando lugar ao compartilhamento de atividades.
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Saúde emocional de pais solo
O cuidado dos filhos gera uma sobrecarga para os pais, o que é ainda maior no caso das mães e pais solo. “Exige demais de quem ampara, de quem provém e de quem deseja uma relação baseada em amor, respeito, saúde e dedicação”, diz Mariah Theodoro.
A psicóloga explica que, por isso, a saúde mental dos pais exige uma maior atenção. Há um sentimento de solidão, além de outras questões impulsionadas quando não há um apoio coletivo. Nesse contexto, uma rede de apoio se torna fundamental para que as relações de cuidado sejam mais leves.
“Criar uma rede de pessoas em quem se possa pedir ajuda e confiar os cuidados do seu filho em momentos em que não esteja disponível será fundamental para a aquisição da autonomia da criança e da saúde física e mental desse pai”, diz Mariah Theodoro.
Essa rede de apoio inclui amigos, familiares, vizinhos e equipamentos públicos como creches e organizações que proporcionam atividades infantis. “Serviços de saúde mental, de psicoeducação e conscientização dos pais sobre como se amparar, pedir ajuda e educar seus filhos também são necessários“, diz a psicóloga.
Por uma paternidade solo saudável
A paternidade solo pode trazer desafios, mas com o apoio certo e algumas estratégias, é possível encontrar equilíbrio entre as responsabilidades parentais e o autocuidado. A psicóloga Mariah Theodoro lista algumas estratégias para que esse percurso não seja tão difícil.
- Dinamize as tarefas importantes no início do dia: aproveite a energia e a disposição da manhã para realizar as tarefas mais importantes do dia. Pode ajudar você a reduzir o estresse e proporcionar um começo mais tranquilo para o restante do dia;
- Busque escolas com suporte adequado: procure escolas que ofereçam suporte adicional, como atividades extracurriculares ou serviços de assistência à infância. Isso ajuda a equilibrar suas responsabilidades como pai e profissional. Além de poder permitir que você trabalhe com mais tranquilidade, sabendo que seus filhos estão em um ambiente seguro e estimulante.
- Peça ajuda e delegue tarefas: não hesite em pedir ajuda a familiares, amigos ou vizinhos. Delegar tarefas como buscar as crianças na escola ou ajudar com as compras pode aliviar sua carga. Isso permite que você tenha mais tempo para si mesmo.
- Reserve um tempo para atividades revigorantes: faça questão de reservar um momento do dia para uma atividade que lhe traga prazer e relaxamento. Alguns exemplos são exercícios físicos, um encontro com amigos ou simplesmente desfrutar de um bom livro ou série. Isso é essencial para recarregar suas energias e evitar o esgotamento parental.
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