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Como seria a casa do futuro? Analisamos algumas tendências
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O que chamamos de casa é muito mais do que um conjunto de pare­des, cômodos e teto. Se não enten­díamos por completo suas linhas arquitetônicas como extensão ou reflexo de nosso ser, a Covid-19 veio nos impor um questionamento.

Entre tantas coisas do­lorosas, a pandemia trouxe a necessidade de nos per­guntarmos: habito o que e por quê? Onde eu gostaria de viver? O que meu lar me conta? E o que de mim ele conhece?

A ambiguidade nessas perguntas é tão evidente que percebi que falar so­bre o futuro do morar não estava apenas conectado a tendências arquitetônicas. Mas também a como desejamos que nosso lar seja a partir de agora.

Com a pandemia, uma parcela da população passou a trabalhar no formato home office. Muitas pessoas começaram a se dedicar a atividades manuais, ocupando diferentes espa­ços da casa para isso, além da dedi­cação às hortas indoor.

E o estudo remoto também se tornou necessá­rio entre as medidas para conter o avanço do vírus. O resultado é que muitos estabeleceram, não sem atri­tos, uma relação mais saudável e de admiração com o lugar que habitam.

Como consequência desse olhar novo e atento à casa, seu morador também estabelece um maior cuida­do consigo mesmo, corpo e mente.

Quem acredita nisso é Graziela Ni­voloni, arquiteta, mestra em Design pela FAU-USP e coordenadora no Istituto Europeo di Design.

“Cuidar de si é cuidar da casa, e cuidar da casa é cuidar de si. Ocupa também um lugar de identidade, de raiz, de entendimento e subjetividade.”

Ambientes híbridos não geram frutos

Obviamente, com tantas transfor­mações em curso, as casas e as cidades precisam dar conta de atender às necessidades. Tanto as que surgem agora quanto as que serão ampliadas com a Geração Z (nascidos a partir de 2001).

Estudos indicam que as pessoas desse gru­po, por exemplo, preferem ter me­nos bens, querem alugar casas e ter poucos móveis. Equipamentos todos funcionais e leves o suficiente para que se possa transportá-los quando quiserem mudar de residência.

As casas no futuro tendem a ser menores, com ambientes híbridos, prontos a dar conta das novas rela­ções entre pessoas, trabalho e espa­ço de lazer.

E justamente por ser um formato que evidencia o home offi­ce, o arquiteto e ensaísta Guilherme Wisnik sintetiza que essa prática de atuação profissional, restrita ainda a uma pequena parcela da sociedade, melhora problemas de deslocamen­tos nas cidades, assim como ameni­za o trânsito e não sobrecarrega o transporte público.

“Mas provoca o esvaziamento de edifícios corpora­tivos, de escritórios. E isso vai cau­sar um grande impacto no mercado imobiliário, redirecionar uma série de lançamentos, esvaziar bairros e criar a necessidade de que existam nos edifícios áreas comuns de traba­lho para os moradores.”

Casas do futuro seriam bolhas herméticas?

Junto a isso, a palavra sustentabili­dade é uma obrigação nos materiais e técnicas que devem ser aplicadas nas construções, e a tecnologia ajudará na automatização do lar com preços mais acessíveis do que hoje.

Pense também em compartimentos para descontaminação microbiana por luz ultravioleta dos objetos que te­nham vindo da rua; cortinas que pu­rificam o ar e até absorvem o som, tornando o ambiente mais acústico.

Ou ainda peças modulares para adaptação dos espaços da residência; energia gerada por painéis solares ou eólica; além das hortas verticais para pro­dução de alimentos diversos.

Pois é, tudo isso é possível e provável. Mas aos que, como eu, um dia fo­ram fãs do desenho animado Os Jetsons, sinto decepcioná-los: o con­ceito do futuro do morar não poderá ser definido pelo viés estritamente tecnológico.

Pelo contrário, a me­lhor maneira de imaginá-lo é pensar em multiplicidade. As expectativas de cada ser humano em relação à sua própria existência determinará as características do local em que for viver, de uma tiny house sobre rodas com 18 m2 a um apartamento mais confortável.

Pandemia alterou relações de convívio em casa

Guilherme reflete sobre como va­mos nos relacionar depois do perí­odo de distanciamento social. Pois o não convívio é, como atesta, um ato antiurbano. Pois isso rompe o en­contro entre pessoas de diferentes origens raciais, étnicas, culturais e religiosas.

“Com a pandemia, as pes­soas são forçadas a se distanciar e vivem em bolhas isoladas, refluindo para dentro do seu núcleo familiar, criando uma vida antiurbana, indivi­dualista e exclusivista. O receio é que isso instaure de forma mais definiti­va essas práticas, por uma cultura da proteção, por medo de outros vírus e pandemias que possam surgir.”

Já Graziela acredita que também começaremos a ter um novo enten­dimento do que é estar fora de casa, conviver com o diferente e ocupar o espaço público.

“E espero que isso acarrete uma transformação de comportamento e que acabe resva­lando na forma como consumimos e como decoramos a casa.”

O habitar junto (coliving) e a velhice

O IBGE estima que até 2050 teremos no Brasil 30% da população acima de 60 anos. Portanto, se falamos do futuro do morar, estamos também falando dos espaços que abrigarão essa parcela de pessoas. São mais velhas, com famílias menores e menos po­der aquisitivo.

Pensando na popula­ção idosa, os espaços precisam ser reinventados, tanto por uma questão de ergonomia quanto de segurança.

Uma boa possibilidade que des­ponta no cenário internacional – e também no Brasil – para atender essa população é o coliving, ou seja, a moradia compartilhada.

A ideia é gastar pouco e viver em apartamen­tos confortáveis, bem localizados, com áreas comuns equipadas, mas, principalmente, formar uma rede de apoio.

As casas de repouso do futuro

Graziela destaca que esse é o momento em que o design precisa de uma abordagem ecossistêmica. “Uma das premissas da economia circular é de que as pessoas talvez não necessitem mais ter coisas, mas sim acessá-las.”

Para ela, foi isso que fizemos com o Uber, com o Air­bnb e com a Ne­tflix, por exemplo, e poderá ser repli­cado com os coli­vings.

Na Europa, essas residências compartilhadas garantem aos ido­sos fácil acesso a serviços de saúde, quando necessários, mas a ênfase é na socialização, fator preponderan­te para a longevidade e qualidade de vida.

“Dessa maneira, damos evidên­cia para essas pessoas e respostas ao que elas precisam, mas também leva-se em conta o meio ambiente, pois o impacto nele é muito menor com uma casa compartilhada”, ob­serva.

O futuro nos apresenta novas possibilidades no morar, mas, so­bretudo, ressalta o valor do humano nesse habitar entre paredes.

Sobre a série De Olho no Futuro

A proposta dessa série é investigar o que se tem pensado para temas centrais da vida humana, como trabalho, educação, alimentação, meio ambiente, moradia e sociedade. Compreendendo o passado e o presente, espiamos o futuro com olhos mais disponíveis para viver essas mudanças e criar um mundo melhor.

A SÉRIE DE OLHO NO FUTURO recebe consultoria da Oxygen (@oxygen.brasil), uma plata­forma de conteúdo em inovação. Com seu olhar apurado para a curadoria de tendências, a fundadora Andrea Janér tem como missão compartilhar conteúdos para ajudar empresas e pessoas a entender para onde cada transformação poderá nos levar.

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GUSTAVO RANIERI é jornalista, escritor, padeiro e oficineiro. Paulistano, há dois anos dei­xou a capital e migrou com esposa e filhas para o interior do estado. Hoje vive em uma casa do século 19 e tenta escutar as histórias que suas paredes lhe contam. Para ele, lar é onde seu coração está.


Conteúdo publicado originalmente na Edição 233 da Vida Simples

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