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Quer ter mais tempo livre? A resposta não está na produtividade
Firmbee | Unsplash
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Neste artigo:

A eficiência não é a saída para ter mais tempo livre. Aprenda por que você precisa dizer não para o que gostaria de dizer sim.

Na minha infância, um dos meus passatempos preferidos era imaginar como estaria vivendo hoje, aos meus 40 anos. Talvez, por influência dos Jetsons — um desenho animado da época, previ que à esta altura estaria me locomovendo por aí em um carro voador. Se você assistiu Jetsons, sabe do que estou falando. E enquanto a inocência infantil pode produzir futuros fantasiosos, não são apenas crianças que erram nas previsões.

Veja, por exemplo, o caso de John Maynard Keynes — um dos economistas mais importantes do século passado. Há quase cem anos, em 1930, Keynes dissertou sobre o que seria o problema dos nossos tempos. Segundo ele, a tecnologia já estaria dando conta da maior parte das nossas tarefas produtivas. Para Keynes, hoje estaríamos vivendo o problema do excesso de tempo. Ou seja, estaríamos debruçados sobre questões existenciais e preocupados sobre como teríamos uma vida significativa, mesmo sem precisar trabalhar.

Cheguei mais perto que Keynes. O mundo se moveu precisamente na direção contrária à estimada pelo economista.

Ao mesmo tempo em que a tecnologia nos tornou mais rápidos e eficientes, as tarefas se multiplicaram e estamos correndo mais, não menos, do que nossos avós.

Quem escreveu sobre o fenômeno de uma forma genial foi Oliver Burkeman. Bukerman é especialista em gestão do tempo e autor do livro “Four Thousand Weeks”, infelizmente sem tradução para o português. Ele também batizou de “armadilha da eficiência” essa nossa ilusão de que poderíamos dar conta da nossa agenda se fôssemos mais produtivos.

Armadilha da eficiência

Vou explicar o raciocínio do autor. Burkeman defende que, à medida que a nossa eficiência cresce, aumenta ainda mais rapidamente a nossa lista de afazeres. Por exemplo, não precisamos mais esperar dias para resolver um problema por correspondência. Mas, justamente porque a comunicação se tornou eficiente, qualquer pessoa consegue — instantaneamente e sem custos — enviar-nos um e-mail. Ou seja, agora em vez de abrir cinco cartas por dia, você precisa dar conta de centenas de mensagens. Você resolve os problemas mais rápido, mas eles chegam mais rápido também.

É como se vivêssemos a vida em uma esteira rolante, ele explica. Imagine aquelas esteiras de aeroporto em que as bagagens correm enfileiradas. A esteira despacha apenas uma mala por vez no compartimento de carga do avião. Enquanto isso, diversas malas podem ser colocadas sobre a esteira. Quanto você é eficiente na resolução de tarefas, é como se essa esteira funcionasse ainda mais rápido — ou seja, em vez de achar tempo livre, você se depara com um número crescente de tarefas.

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Entendendo o problema

Voltemos para o exemplo dos e-mails. A eficiência em respondê-los não faz com que diminuam. Pelo contrário, mais e-mails você irá receber. Além disso, maior será a expectativa dos outros sobre a sua velocidade de resposta. Ou seja, para Bukerman, aumentar a eficiência não é o caminho para resolver a exaustão. Na verdade, isso pode, inclusive, aumentá-la. Afinal de contas, chegará uma hora que o motor da esteira estragará por excesso de uso.

Motores superaquecem. Seres humanos também. O nome técnico é burnout.

Mas a eficiência não é sempre ruim. É quando você acredita que ela solucionará o seu estresse que ela passa a ser, em vez de solução, problema. Deixe-me explicar. Ficamos sobrecarregados porque temos mais tarefas do que tempo. Então concluímos que se formos mais eficientes — dando conta de mais tarefas em menos tempo — teremos mais tempo livre.

Cometemos o mesmo erro de Keynes, que fantasiou que a eficiência tecnológica nos liberaria tempo. Na verdade, quanto mais tarefas você eliminar, mais tarefas aparecerão. E mais, a sua neurose por eficiência lhe tornará extremamente impaciente com o que antes não o incomodava. Por exemplo, depois de passarmos os anos da pandemia fazendo reuniões online, não toleramos mais dez minutos de espera. Depois que você se acostuma a pedir comida por aplicativos, mais custoso é ligar para a pizzaria.

4.000 semanas

Em português claro para que você — e eu — não esqueçamos: o problema não está na velocidade com que fazemos as coisas, mas no excesso de tarefas, em primeiro lugar.

Portanto, para dar conta da exaustão, precisamos aceitar e lidar com a verdade universal que tentamos esquecer: um dia tem apenas 24 horas e uma vida – se você tiver a sorte de viver até os 80 anos – tem apenas 4.000 semanas. E Burkeman insiste que não esqueçamos isso (portanto batizou o seu livro com o título “Four Thousand Weeks“).

Fato é que temos um poder de imaginação que excede a nossa capacidade de realização. Primeiro, porque realizar é muito mais trabalhoso do que imaginar. Segundo, porque a vida imaginada pode ser perfeita e recheada de experiências fabulosas — ao passo que a vida real nunca será. Portanto, também é fato de que você realizará muito pouco daquilo que é capaz de sonhar. Nosso tempo é limitado, e não temos o controle de tudo. Sonhos são excludentes na vida real.

Não podemos ser tudo o que quisermos

Burkeman joga um balde de água fria nas nossas fantasias prepotentes. Mas, ao mesmo tempo, o especialista em gestão do tempo nos liberta da ilusão de que é possível fazer tudo.

É claro que a lembrança de que trilharemos apenas poucos caminhos pode trazer dor. Mas, de uma forma estranha, ela também traz o alívio e a paz necessários para escolher o que é verdadeiramente possível. E a esse respeito o autor nos alerta: a solução não é eliminar o que não é importante. Embora isso ajude, mesmo assim você ainda terá mais tarefas do que tempo.

Ou seja, para se livrar da sobrecarga você terá que escolher quais coisas importantes quer eliminar. E isso significa lidar com o desconforto de dizer não para coisas que você gostaria de dizer sim. Uma tarefa dificílima.

Porém, o esforço pode valer a pena. Quando dizemos sim para coisas demais, as tarefas se acumulam e acabamos fazendo o que é mais urgente primeiro. Por exemplo, a reunião de amanhã, o prazo estourado. Caia nesse padrão e é bastante possível nunca chegar naquilo que importa de fato. Se você assumir inúmeros projetos, não terá tempo para escrever o livro com que sempre sonhou. Ou, então, não será tão presente para sua família quanto é importante para você. Se você não encontra tempo para dedicar para aquilo que considera central na sua vida, a saída não é ser mais eficiente.

Nada libera tempo na agenda a não ser você mesmo. Para ter tempo você precisa proteger o seu tempo, bloqueando-o para aquilo que é essencial para você.

PARA OUVIR: Como ter mais tempo?

O que eliminar?

E se você está — como eu — quebrando a cabeça para identificar, entre as coisas importantes, quais valem o seu tempo, escute a seguinte orientação. Bukerman conta que a autoria é popularmente atribuída à Warren Buffett (embora não tenha encontrado a fonte). Independente disso, a orientação é:

  • Escreva as 25 principais coisas que você quer da vida.
  • Em seguida, coloque-as em ordem.
  • Os primeiros 5 itens da lista são aqueles que devem nortear a sua alocação de tempo.

Até aí, um tanto óbvio. A grande sacada é o que fazer com os outros 20 itens. Enquanto a lógica os colocaria em segundo lugar de prioridade, o autor recomenda que você os evite a todo custo. Sabe por quê?

Porque enquanto esses itens não são suficientemente importantes para merecerem o centro de sua vida, ainda sim são sedutores o bastante para distraí-lo daquilo que de fato deveria ser.

É claro que o conselho é demasiadamente literal – pode ser que seu tempo seja aproveitado melhor se você escolher cinco, três, dois ou sete itens. Mas, ainda assim, a moral da história é extremamente pertinente. É muito desconfortável dizer não, por inúmeros motivos. Mas dizer sim para mais do que conseguimos realizar nos afasta daquilo que é importante demais para nós (além de nos tornarmos impacientes e — em última medida — doentes).

Gestão de tempo no futuro

Se Keynes continuar errado, a solução para a nossa sobrecarga não está na eficiência.

Se Bukerman estiver certo, a solução também não é escolher o que nos atrai.

Afinal de contas, a evolução tecnológica continuará aumentando o nosso número de oportunidades. Seremos seduzidos por relacionamentos que não tivemos, lugares que não conhecemos e aquilo que não aprendemos.

Quando muita coisa chama atenção, só é possível construir algo significativo eliminando inclusive o que nos atrai. Até porque temos apenas 4.000 semanas.

Eu já vivi metade. E você?

Leia todos os textos da coluna de Adriana Drulla em Vida Simples


ADRIANA DRULLA (@adrianadrulla) é mestre em Psicologia Positiva pela Universidade da Pennsylvania (EUA) e pós graduada em Terapia Focada em Compaixão pela Universidade de Derby (Inglaterra), onde teve como mentores Martin Seligman, psicólogo fundador da psicologia positiva, e Paul Gilbert, psicólogo criador da Terapia Focada em Compaixão. Semanalmente fala sobre psicologia e mente compassiva no podcast Crescer Humano.

*Os textos de colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de Vida Simples.

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