O apanhador de sonhos
O catador de recicláveis já fez filmes premiados sobre os problemas da favela onde vive e criou uma cooperativa para gerar oportunidades.
O catador de recicláveis já fez filmes premiados sobre os problemas da favela onde vive e criou uma cooperativa para gerar oportunidades.
Gente Incrível: Cristiano Gonçalves Cardoso (36 anos, coletor de materiais recicláveis)
Em vez de brincar como qualquer menino de 7 anos, Cristiano Gonçalves Cardoso precisava ajudar o pai nas despesas de casa. Na volta da escola, ia trabalhar numa oficina mecânica ou vender guloseimas em semáforos. Assim, o garoto que sonhava ser policial só foi se divertir por volta dos 12 anos, quando começou a jogar bola, videogame e andar com amigos na rua.
Mais tarde, já adulto, era camelô quando integrou o grupo de dez jovens da Favela da Vila Prudente, selecionados para a Jornada Mundial da Juventude, evento da Igreja Católica que iria acontecer na Alemanha.
Grande potencial
O ano era 2005. Lá, o padre que o convidou disse que Cristiano tinha potencial para fazer grandes coisas no Brasil. Assim, inspirado por essas palavras, o rapaz fez um curso de economia solidária assim que voltou de viagem.
Posteriormente, Cristiano teve algumas ideias que não foram para frente até que — na época em que trabalhava como carroceiro de madrugada — encontrou um grupo de catadores no Viaduto Grande São Paulo. O grupo tinham recebido uma ordem de despejo da prefeitura e, juntos, criaram a Recifavela em 2007. O começo foi difícil. Por exemplo, não havia caminhonete, nem lugar para armazenar o que coletavam.
Crédito: Rangga Cahyanugraha | Unsplash
Catadores unidos
Enfim, o projeto deu certo. Hoje, 40 catadores — com idades entre 20 e 68 anos — trabalham na cooperativa. Desses, 30 são mulheres chefes de família. Há brasileiros, migrantes e refugiados. Entretanto, mesmo depois de tanto tempo, Cristiano e os outros três administradores da Recifavela ainda enfrentam dificuldades.
Principalmente, por conta da pandemia, que fez disparar a concorrência. Antes coletavam 190 toneladas de resíduos por mês, hoje são apenas 50 toneladas. Além disso, também precisam lidar com o preconceito. “Um catador tem que colocar todo dia uma máscara de autoestima para fazer o seu trabalho. A gente é invisível”, lamenta.
Porta-voz
Por outro lado, essa realidade fez Cristiano mudar de sonho. “Hoje quero ser um dos porta-vozes da categoria e criar um espelho para as pessoas que estão numa área deficitária da periferia. Mostrar que não é só o crime que pode ser um espelho, que pessoas de bem também podem criar vários espelhos”, ressalta.
Por último, oferece a elas uma oportunidade sem prazo para acabar. “A Recifavela resgata sonhos. Assim, pode acontecer o que for que o catador não vai ser demitido, porque ele também é dono da cooperativa.” Portanto, ele segue sabendo que cada etapa do seu sonho inclui muitos outros.
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