Caminho da Superação
CAMINHO DA SUPERAÇÃO, de Fergus Grady e Noel Smyth (Nova Zelândia, Austrália, 2019)
Uma vez no caminho certo, você só precisa seguir caminhando
Quando ouvi o chamado pra caminhar os 800 km até Santiago de Compostela, na Espanha, pela tradicional rota do Caminho Francês, pipocaram pessoas me dizendo que conheciam alguém que já tinha ido. Fui atrás de peregrinos pra saber se haveria chance de “sobreviver” a essa aventura, se alguém em semelhantes condições físicas já tinha feito o Caminho, se eu não estava ficando louca de vez.
Passados três anos do dia em que entrei na basílica de Santiago para assistir à missa dos peregrinos, que enche o coração de andarilhos do mundo, venho ser aquela voz que busquei quando decidi caminhar. Pra quem ainda tem alguma dúvida de que caminhar é uma maneira eficiente, deliciosa e íntima de encontrar sua força interior em meio ao barulho do dia a dia, à confusão das obrigações e aos desafios da vida, pé na estrada! Se eu puder inspirar alguém – como fui inspirada por muitos relatos durante minha busca – isso também é parte da minha jornada.
Decidi, com nove meses de antecedência, fazer o Caminho. Os nove meses não foram coincidência, mas sim um sinal – que eu viria a perceber só muito tempo depois. Era o mesmo tempo de uma gestação – tempo necessário pra cuidar de mim, olhar para as minhas emoções, fazer a mochila, me encher de coragem e ter a certeza de que esse “filhote” também mudaria minha vida para sempre. Força interior, de novo, mexendo nas minhas entranhas e me impulsionando a seguir adiante.
CAMINHO DA SUPERAÇÃO, de Fergus Grady e Noel Smyth (Nova Zelândia, Austrália, 2019)
E a ouvir o coração. Foram 790 km em 31 dias. Foram dias de vulnerabilidade, de decisões, de percepção de que meu corpo pedia arrego, de humildade para parar e descansar. Nem tudo são flores, assim como na vida. Aliás, me disseram que o Caminho era como a vida: ora frio, ora calor; ora alegria, ora angústia; ora coragem, ora medo; ora chuva, ora fogo. E é mesmo. Metáfora da vida, mochila que carrega só o essencial, força interior pra fechar portas do passado, deixar pra trás o que não faz bem, carregar só aquilo que faz sentido. Tudo fez mais sentido.
Passados três anos, comemorei, novamente e silenciosamente, ao som dos meus passos que tanto encheram de música aquele meu caminhar, o terceiro aniversário dessa terceira – e inusitada – gestação. E ganhei até presente de aniversário – o cinema, sempre me dando alegrias! Parece que era hora de falar disso de novo, de recordar e compartilhar, de se emocionar com cada lembrança gravada no coração. Caminho da Superação acaba de ser lançado, acompanhando a andança de seis peregrinos da Austrália e Nova Zelândia até Santiago.
Um documentário singelo – na forma e no conteúdo, com uma bela fotografia que mostra um pouquinho do que é a natureza de Navarra, Castilla y León, Galícia. Porque é preciso dessa sutileza pra ter a essência do Caminho impressa ali. A essência e a força interior que vem junto com esse chamado. Que a gente não sabe de onde vem, nem pra onde vai – só sabe que caminhar é preciso, que uma força interna vai mover corpo, mente e alma, nos fortalecendo num só.
Pra quem já peregrinou, quer peregrinar ou só quer entrar em contato com essa experiência, assista ao filme. Ali tem um pouquinho do que é esse motor que faz mover montanhas.
Onde assistir: alugue direto no site www.caminhodasuperacao.com.br.
Suzana Vidigal é tradutora, jornalista e cinéfila. Gosta de pensar que cada filme combina com um estado de espírito, mas gosta ainda mais de compartilhar com as pessoas a experiência que cada filme desperta na mente e na alma. Em 2009 criou o blog Cine Garimpo (www.cinegarimpo.com.br e @cinegarimpo) e traz, quinzenalmente, dicas de filmes pra saborear e refletir.
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