Estresse e insônia refletem falta de suporte emocional no trabalho
Especialistas indicam como líderes podem perceber sinais de alerta na equipe e reforçam: não espere o momento do 'colapso' para pedir ajuda

Têm dias que trabalhar é mais exaustivo do que o normal. Pela manhã, o celular desperta e falta força para levantar da cama. Durante o expediente, o trabalho não rende porque dormimos mal e o corpo não descansou. Além disso, o estresse parece não ter hora para ir embora. No momento de voltar para casa, o transporte público lotado ou o trânsito engarrafado acaba com o último resquício de energia.
Os problemas no ambiente profissional e nas relações interpessoais não são culpa exclusiva do trabalho em si. No entanto, pesquisas apontam que sentir estresse e insônia está diretamente ligado à ausência de suporte emocional no emprego.
De acordo com o Relatório de Tendências Globais 2025, do ManpowerGroup, 49% dos profissionais ao redor do mundo sofrem com estresse diário no trabalho, de nível moderado a elevado, enquanto apenas 21% acreditam que seus empregadores oferecem apoio para o bem-estar emocional.
Outro estudo, da empresa Onlinecurrículo, mostra que 26% dos brasileiros apontaram problemas de sono após o expediente, o que pode estar relacionado com dificuldades para descansar mentalmente – mesmo longe do ambiente profissional. A pesquisa também revela que 51% afirmaram não receber nenhum tipo de apoio para tratamento.
Com experiência em programas de bem-estar em empresas, a psicóloga Luanna Cunha explica que os primeiros sinais de que há algo de errado no local de trabalho geralmente são sutis, mas consistentes.
“Queda de motivação, aumento de conflitos, isolamento, cansaço excessivo, alterações de humor e queixas físicas recorrentes – como dores de cabeça ou insônia – são alertas que não podem ser ignorados. Quando o clima começa a pesar e o silêncio toma conta, algo precisa ser olhado com mais cuidado.”
Luanna avalia que muitas empresas ainda não enxergam que capacitar gestores é um investimento em cultura de cuidado. “O papel do líder não é diagnosticar, mas perceber mudanças de padrões e saber o momento certo de sinalizar apoio com empatia, respeito e sigilo. Cuidar sem invadir é uma habilidade que se aprende”, diz.
Diretora de recursos humanos no ManpowerGroup Brasil, Wilma Dal Col afirma que existem diversas formas de preparar gestores com o objetivo de identificar problemas de saúde mental e bem-estar emocional dos funcionários. Para começar, é fundamental ter uma cultura de comunicação aberta e espaço seguro para os colaboradores se abrirem sobre suas dificuldades.
“Incentivar feedbacks anônimos ou não, como um sistema de hotline, ajuda a entender as necessidades dos colaboradores. A criação deste sistema exige investimento tanto para o desenvolvimento do canal quanto para a preparação dos profissionais que serão responsáveis por receber e direcionar as demandas. É necessário formar uma equipe responsável, que pode ser composta por profissionais de recursos humanos e ou compliance, para garantir que todos os feedbacks sejam tratados adequadamente.”
De acordo com Wilma, treinamentos em inteligência emocional, workshops e vivências que permitam compreender e praticar a empatia também preparam os líderes para identificar sinais de sofrimento sem invadir a privacidade dos colaboradores.
Um olhar mais humano para o funcionário
Para além dos espaços seguros para escuta, outras ações simples podem ser implementadas para auxiliar os funcionários, como permitir horários flexíveis, criar espaços de descanso e fomentar a prática de pausas regulares. “Essas medidas são eficazes e não implicam em altos investimentos ou custos”, afirma Wilma.
Luanna complementa: “Pequenas ações fazem uma grande diferença. Saúde mental não exige grandes orçamentos. Exige intenção, presença e compromisso com o ser humano.”
Em 2024, o Brasil bateu recorde com o seguinte número: mais de 470 mil pessoas tiveram que se afastar dos seus postos de trabalho por problemas relacionados à saúde mental. Para se ter uma ideia da gravidade da situação, em comparação com os números do ano anterior — mais de 280 mil —, o crescimento foi de 68%.
Não espere um ‘colapso’ de estresse no trabalho
Muitas vezes, sem perceber, vivemos a vida no piloto automático. Enquanto isso, o estresse no trabalho, a insônia, a ansiedade e outros problemas se intensificam e se acumulam. Se a rotina no emprego somada à ausência de suporte emocional prejudicam sua saúde mental, o ideal é não esperar o momento do “colapso” para pedir ajuda.
Luanna alerta que “o corpo começa a gritar o que a mente silencia”. “Cansaço extremo, irritabilidade, desmotivação e dificuldade para descansar ou se desligar são sinais clássicos. A perda de prazer em coisas simples e a sensação constante de estar ‘devendo’ algo indicam que é hora de parar, olhar para si e pedir ajuda.”
A busca por auxílio pode ser tanto por profissionais da área da saúde quanto no próprio ambiente de trabalho. “Se você sente que está em sofrimento, vale conversar com um psicólogo. Já com sua o seu gestor, use dados, fale sobre impactos no desempenho e sugira soluções. É possível falar de saúde mental com assertividade e maturidade. Sem confronto, mas com coragem”, complementa Wilma Dal Col.
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