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Saiba por que o risco e a imperfeição podem lhe cair bem
Roseanna Smith
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Pouco antes do fim do mundo tal qual o conhecíamos, na véspera da pandemia, fui contratada para conduzir um treinamento presencial para um grupo de padres. Ao chegar no evento, focado em governança e gestão de mudança, fui surpreendida pelos participantes que, na largada, conduziram um tocante ritual sagrado. Orar, contemplar e se conectar fazia parte da rotina deles que – diferentemente da minha – não havia sido corrompida por automatismos burocráticos e desalmados.

Nessa presença afetiva e efetiva dos padres, pude diluir meus pré-conceitos quanto à mistura de trabalho e espiritualidade, e experimentei confiar, que é essencialmente agir com fé no que não controlamos. E é justamente disso que os perfeccionistas mais precisam.

O perfeccionismo nosso de cada dia

Falando então em perfeccionismo, poucas frases provocam tanta alergia aos aspirantes à perfeição quanto “o ótimo é inimigo do bom” ou “o feito é melhor do que o perfeito”. Essas afirmações sugerem, em suma, que velocidade seria um valor por si só, uma alavanca para resultados impressionantes.

Fico imaginando se o Leonard Cohen, que compôs a obra-prima Hallelujah aos 50 anos de idade, depois de mais de 5 anos agonizantes de trabalho e (reza a lenda) cerca de 80 versões diferentes, teria topado editar a sua energia criativa em prol de jargões como “erre, mas erre rápido, aprenda rápido e corrija rápido”(que os startupeiros não me ouçam).

No livro O Vício da Perfeição*, a analista junguiana Marion Woodman defende que a necessidade de experimentar uma conexão sagrada com uma energia maior leva as pessoas a buscarem um ideal ilusório de perfeição.

Pessoalmente, tenho tentado combater o perfeccionismo com pouquíssimo sucesso. Escrevo um livro interminável há anos, torcendo (em vão) para que o desejo de criar se torne maior que o medo da rejeição, do fracasso, e até mesmo do sucesso.

Recentemente, tive um trabalho cancelado por motivos pessoais bem questionáveis, mas que, não por isso, me deixaram menos arrasada. Na mesma semana em que isso aconteceu, recebi os elogios mais contundentes de toda a minha carreira. No que acreditar então, afinal? Em nada, conclui, já que o sucesso e o fracasso são dois grandes impostores.

Somos possibilidades ilimitadas: para além da perfeição

Ao acompanhar carreiras em transição, e até mesmo vidas profissionais que estão apenas começando, noto que há uma ansiedade generalizada para se fazer as coisas “corretamente”, escolhendo o curso “correto”, a empresa “correta” e o setor “correto”. Minha observação revelou, contudo, que o que mais costuma trazer realização é a busca da coisa certa – e não “correta” – a ser feita, considerando o entusiasmo e o risco honesto como setas genuínas, apesar de incertas.

A propósito, a palavra “perfeito” vem do Latim PERFECTUS, e significa “completo”, “sem faltar nada’. Será que é justo esperar isso de algo ou de alguém, incluindo nós mesmos?

Acima de tudo, somos possibilidades ilimitadas, mas o perfeccionismo acaba se apegando à uma realidade chapada, sem nuances, com a crença equivocada de que é preciso ser perfeito para ser reconhecido, o que inibe movimentos verdadeiramente criativos e sublimes.

Curiosamente, quem busca admiração irrestrita através da perfeição acaba atraindo justamente o oposto: a desconexão. Basta lembrar da popularidade do CDF da escola em oposição ao bagunceiro da turma. Quem tinha mais amigos mesmo? Em suma, nada nos conecta mais do que a imperfeição e a vulnerabilidade. Brené Brown que o diga:

Encontre a sua melhor forma possível

Por muito tempo, acreditei que a frase “arrumar é encontrar a melhor forma” – escrita por Clarice Lispector em A Paixão Segundo G.H.* – falasse do possível alcance da forma ideal. Pensando melhor hoje, do alto da minha latejante imperfeição, me parece que encontrar a melhor forma é simplesmente adotar a forma possível (na carreira, nos afetos, nas palavras, na roupa íntima, e por aí vai), lembrando-se de que o Self mais profundo tem obras-primas a realizar.

Ao falar sobre a sua música icônica, Leonard Cohen afirmou que nosso mundo está cheio de conflitos e de coisas que não podem ser reconciliadas. Mas há momentos em que podemos acolher toda essa confusão. E foi isso que ele quis dizer com “Aleluia”. Acho que os padres iriam gostar disso. Mas tudo bem se não gostarem. Críticas e aplausos são sempre temporários.

Dicas para combater o perfeccionismo – e o tédio

  • Pense pequeno: através de pequenas atitudes, gestos e passos, permita-se sentir – mesmo que temporariamente – o poder e o frescor da liberdade de quem não cultiva grandes planos e metas.
  • Celebre seus erros: tome consciência de que perfeição não existe e verifique se os objetivos que fixa para si são realistas, e de fato desejados. Se (ainda) não estiver convencido, leia As Virtudes do Fracasso*, de Charles Pépin.
  • Confesse seus pecados: descubra como a cura pela fala veio bem antes da Psicanálise. Conversar sobre medos, culpas e angústias com estranhos, dando nome ao que lhe pressiona, pode ser libertário e regenerativo.
  • Ouça ‘Hallelujah: inspire-se na música que se tornou hino pop depois de ser considerada uma ‘abominação’.
  • Aja como Jack: corte tudo em pedaços menores para simplificar a execução, concentrando-se no processo e no progresso gradual. Se não consegue concluir o livro interminável que está escrevendo, produza uma coluna mensal. 😅

Convite: novo curso de Liderança Criativa

Convido vocês, queridos leitores, a conferirem – virtual ou presencialmente – o meu novo curso de Liderança Criativa para Gestão de Equipes Inovadoras, em parceria com a ESPM.

A partir dos fundamentos da liderança criativa, será abordada uma nova forma de pensar sobre liderança, e de gerir equipes e negócios criativos, para transformar a realidade de forma inovadora e consistente.

Saiba mais aqui

O curso terá aulas nos dias 2, 4, 9 e 11 de outubro, às segundas e quartas-feiras, das 19h30 às 22h30. Os participantes têm a opção de escolher entre aulas online ao vivo ou presenciais, permitindo flexibilidade no aprendizado. Os encontros ocorrerão nas instalações da ESPM Tech, localizada em São Paulo.


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Acolha a sua imperfeição


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