Quando estamos imersos na rotina e a mente em muitas decisões importantes, a vida parece deixar de andar. As ideias estão lá: trocar de emprego, reformar a casa, fazer um mestrado, mudar de cidade, cuidar dos vínculos afetivos. Enfim, organizar os objetivos. No entanto, não conseguimos separar um tempo para sentar, colocar a cabeça no lugar e elencar as prioridades.
No ritmo de vida acelerado em que vivemos, tentamos abraçar o mundo todo de uma vez. Por outro lado, há dificuldade de sair da inércia ou então o hábito de começar algo e deixar pelo caminho. Quando não paramos para organizar tempo, dinheiro e disponibilidade emocional, nada sai do papel.
O cérebro é esperto
A psicóloga Tatiana Serra explica que o cérebro busca manter o bom funcionamento do organismo com o menor gasto de energia possível. Para isso, automatiza tarefas da rotina. Você pode até pensar frequentemente nas decisões importantes da vida, o que gera preocupação e adoece, mas o cérebro poupa esforço para outras tarefas.
“Entre mudar de emprego e fazer um café, limpar uma mesa ou arrumar a cama, o cérebro vai preferir focar nas tarefas simples. Isso acontece porque são ações automatizadas, que exigem praticamente zero esforço mental. Já decisões como mudar de emprego, mudar de cidade ou lidar com questões mais complexas demandam muito mais energia”, afirma.
E quando tentamos resolver tudo ao mesmo tempo, a situação só piora. Psicóloga da Santa Casa de São José dos Campos, Carmela da Silvana Silveira afirma que multitarefas aumentam o esforço cognitivo, diminuem a eficiência e elevam o nível de estresse.
“Pensar e fazer tudo ao mesmo tempo gera sobrecarga cognitiva, o que aumenta os níveis de cortisol – hormônio relacionado ao estresse. Isso pode levar à ansiedade, sensação de fracasso constante, baixa autoestima e até sintomas de burnout. O cérebro precisa de pausas e organização para funcionar bem. Quando isso não acontece, o equilíbrio emocional se desfaz”, diz Carmela.
Sinais de que algo está errado
Cada organismo se manifesta de uma maneira. Pode ser de forma física ou mental. No geral, uma cabeça sobrecarregada se reflete em um corpo cansado. Isso pode incluir dores de cabeça, constipação, dificuldade para dormir, sobrepeso ou, ao contrário, comer pouco e emagrecer muito.
Por exemplo, aquela pessoa que sempre perde a hora, que tem dificuldade para levantar ou para adormecer – quanto mais cansado, mais difícil é relaxar e conseguir dormir –, pode estar sobrecarrega. Às vezes, a dificuldade com o sono é um dos sintomas. Mas nem sempre.
Tatiana ressalta que ansiedade e agitação são outros sinais. “A pessoa pode ter dificuldade de parar. Às vezes, a gente pensa que alguém sobrecarregado está sempre lento, com sono, querendo dormir, mas não necessariamente. Dependendo do perfil, ela pode estar até mais ativa, o que gera ainda mais sobrecarga. Até o momento em que o corpo entra em colapso, manifestando doenças ou alterações como forma de proteção para sinalizar que algo não está indo bem.”
Carmela também elenca outros sinais de que a situação está fora do controle:
- Sensação constante de cansaço mental;
- Dificuldade de concentração e lapsos de memória;
- Procrastinação frequente;
- Irritabilidade ou impaciência;
- Sensação de estar sempre ocupado, mas improdutivo;
- Sentimento de culpa por não dar conta de tudo.
Organize e desacelere
Carmela afirma que organizar melhor as demandas começa com um passo simples: listar todas as tarefas e compromissos. Visualizar ajuda a organizar. “Em seguida, é fundamental estabelecer prioridades e limites claros – lembrar que dizer ‘não’ também é uma forma de autocuidado. Reservar momentos para si mesmo, com lazer e descanso, é tão importante quanto qualquer outra responsabilidade. Por fim, revisar suas metas com regularidade ajuda a manter o foco no que realmente importa.”
Inclusive, a vida frenética faz com que as pessoas não aproveitem o ócio. “Se você desacelera e faz uma tarefa por vez, pode sobrar tempo no seu dia. E, às vezes, as pessoas não sabem lidar com esse tempo livre. Tentam preencher todas as lacunas, como se parar fosse um erro. Por isso, é importante também trabalhar essa consciência: lidar com o ócio e com o tédio”, complementa Tatiana.
Quando elencamos nossas prioridades, conseguimos fugir da imersão da rotina e esvaziar um pouco mais a cabeça. Ao fazer uma tarefa por vez, o foco se mantém. E isso, inclusive, permite olhar para as atividades de forma mais ampla. Não com aquela visão estreita de “preciso acabar logo”, mas com uma atenção mais aberta, voltada para o desenvolvimento e para a solução com mais qualidade.
“Torna a vida mais leve e proporciona mais saúde. Quando você não está tentando automatizar muitas coisas ao mesmo tempo, o cérebro consegue gastar energia com o que realmente importa. Aquilo que estava em segundo plano, acumulado, em um processo inflamatório – questões que ficavam no fundo, sem tempo de prestar atenção, e que o corpo tentava, à força, dar conta – passa a ser processado de forma mais tranquila. Isso reduz processos inflamatórios, ansiedade e depressão”, diz Tatiana.
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