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Fator genético é a principal causa de câncer de ovário
Silencioso, o câncer de ovário tem diagnóstico difícil; monitoramento constante é essencial para realizar tratamentos mais eficazes (Foto: Pornpak Khunatorn/iStock)
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A publicitária Luciana Furtado, de 54 anos, sempre foi uma pessoa bastante cuidadosa com sua saúde. Fazia exames anualmente, e em 2024 não foi diferente. Na primeira semana do ano, tirou um dia para ir ao laboratório. Tudo parecia certo, até a hora do ultrassom. Sem sintomas, ou nenhum tipo de aviso, Luciana descobriu que estava com câncer de ovário.

Ela conta que foi surpreendida, pois nada em seu corpo indicava que poderia estar doente. “Meus hormônios estavam normais, sem nenhuma sinalização de que eu ia entrar na menopausa, e os marcadores tumorais estavam todos dentro dos padrões. Não tinha nenhuma dor, nenhum atraso menstrual, nada”, lembra.

Luciana se recorda que, em uma postagem no Instagram sobre o Outubro Rosa – um movimento internacional de conscientização para a detecção precoce do câncer de mama, criado no início da década de 1990 –, comentou que sempre era possível saber quando algo estava acontecendo em seu organismo.

“Eu lembro que o meu texto dizia que se a gente conhece o nosso corpo, se a gente for atenta e carinhosa consigo mesma, vamos perceber se tem alguma coisa diferente. Dessa vez eu não percebi nada, e estava crescendo um tumor maligno dentro de mim”.

Câncer de ovário demora a apresentar os sintomas

O câncer de ovário é, dentre os cânceres ginecológicos, o mais grave e o mais letal. Quem explica isso é a Camila Calegari, médica ginecologista e obstetra pela Maternidade Carmela Dutra, de São Paulo (SP).

“Felizmente, ele não é o mais comum, mas é o mais difícil de se fazer o diagnóstico”, complementa a profissional. No Brasil, são diagnosticados cerca de 6 mil casos de câncer de ovário por ano, segundo dados de 2022 do Instituto Nacional de Câncer (INCA).

Isso acontece porque, nos estágios iniciais, o câncer é pouco sintomático ou assintomático. “É uma doença silenciosa, que demora para apresentar os sintomas”, explica a médica. “Nos estágios mais avançados, os sintomas surgem em decorrência do tamanho do tumor, levando a pessoa a sentir dor e perceber um aumento do volume do abdômen”.

Segundo a médica, a paciente pode sentir uma tumoração na região da pelve, dificuldade de digestão e sensação de constipação, além de desconforto na região lombar.

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As dificuldades de diagnóstico do câncer de ovário

Para Jacqueline Menezes, cirurgiã oncológica e diretora de comunicação da Regional São Paulo da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), outra grande dificuldade do diagnóstico acontece porque quando o câncer gera sintomas, estes são muito inespecíficos e facilmente confundidos com condições gastrointestinais.

“Na prática, o que acaba acontecendo é a pessoa ficar perdendo muito tempo investigando estômago e intestino. Por exemplo, ela acaba fazendo exames como endoscopia e colonoscopia, quando, na verdade, tem um câncer de ovário e necessitaria de outros exames para seu diagnóstico adequado”.

Além disso, não há exames que garantam totalmente sua detecção precoce, diferente de outros cânceres ginecológicos que são mais fáceis de rastrear.

“Não há exames de rotina para sua detecção precoce, pois exames como ultrassonografia abdominal falham, e com frequência. E grande parte das alterações encontradas em pacientes assintomáticas levam a um ‘falso positivo’. Ou seja, achamos que a paciente tem câncer, ela passa por cirurgia, e muitas vezes acaba por ser algo benigno”, explica a médica.

Por conta disso, a médica afirma que cerca de 70% das pacientes com câncer de ovário são diagnosticadas em estados avançados.

Entre os fatores de risco, a genética é o principal

Antes de Luciana ser diagnosticada, outras mulheres na família já haviam enfrentado o câncer. “Existe um histórico na minha família. Minha mãe faleceu de câncer de ovário há 33 anos. Era outra época, com outros recursos e preocupações. Minha mãe faleceu aos 52 anos, mais nova do que eu quando tive o meu diagnóstico”, compartilha.

Além disso, sua irmã também teve câncer de mama, aos 34 anos. “Ela era bastante jovem, e na época tinha sido mãe há pouco mais de um ano”, lembra. Luciana recorda que a situação serviu para deixar suas familiares alertas.

Segundo Camila, o principal fator de risco do câncer é a herança genética. “Isso vem de mutação genética dos genes BRCA1 e BRCA2. E esses são os mesmos genes que aumentam a chance do câncer de mama”, explica a ginecologista.

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Idade, gravidez e menopausa também influenciam no surgimento do câncer de ovário

Outros fatores de risco, segundo Jacqueline, podem ser a nuliparidade (ou seja, o fato da pessoa nunca ter engravidado na vida), a infertilidade, a endometriose, a obesidade, e a própria idade, que é um fator de risco comum para todos os cânceres. Ou seja, quanto mais vivemos, maior é o risco de desenvolvermos alguma neoplasia maligna.

Além disso, há também fatores de proteção contra o câncer de ovário. “Os principais, que eu gosto sempre de destacar, são o uso de contraceptivos orais ou mesmo a realização de salpingectomia (a retirada das tubas uterinas, ou “trompas”) durante uma cirurgia por
outra causa”.

Segundo a médica, grande parte dos tumores de ovário começam na tuba uterina. Sendo assim, retirando estas estruturas em algum momento cirúrgico oportuno, é possível se proteger contra o câncer de ovário no futuro.

“É importante, porém, frisar que a ausência ou presença desses fatores não anula jamais a possibilidade de uma paciente ter a doença”, complementa a profissional.

Tratamento do câncer depende do grau da doença

Entre as formas de tratamento estão a cirurgia e quimioterapia. “A escolha do melhor tratamento depende de vários fatores, como tipo histológico do tumor, extensão da doença, idade, condições clínicas da paciente e se o tumor é inicial ou recorrente”, é o que explica Rayzza Griebeler, médica e pós-graduanda em predisposição hereditária ao câncer pelo Hospital Israelita Albert Einstein.

O tratamento primário ideal é a cirurgia, mas é indicada apenas quando é possível a ressecção de todo o tumor. “Nesses casos, a quimioterapia é indicada após a retirada do tumor (quimioterapia adjuvante), com a intenção de reduzir o risco de reincidência da doença”, esclarece a profissional.

A médica também complementa que se a cirurgia inicial não for indicada pela impossibilidade da retirada completa do tumor, a quimioterapia é realizada antes do procedimento cirúrgico, e tem a intenção de reduzir o volume do câncer de ovário para que em um segundo momento a cirurgia possa ser realizada.

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O diagnóstico é difícil, mas pode ser visto com leveza

Quando Luciana recebeu o diagnóstico, no dia 9 de fevereiro de 2024, era uma sexta-feira, véspera de Carnaval. “Eu sou o tipo de pessoa que recebe uma notícia triste e geralmente vou para o cantinho, fico chateada. Dessa vez, eu peguei minha bicicleta e fui andar pela cidade”, recorda. Mesmo chorando ao passear, ela sentiu que era um chamado para reavaliar sua vida.

No dia 23 do mesmo mês, Luciana operou. E começou a quimioterapia em 2 de abril. “Está sendo muito leve. É claro que não é fácil, mas eu acho que depende também da forma como a gente enxerga. Eu tento estar perto das pessoas que me dão carinho, que me dão muito amor”, explica.

“Muitas vezes, eu estou super ansiosa, tenho insônia, não quero levantar cedo e fico desfocada um pouco do trabalho. Mas são quatro meses que eu estou cuidando de mim e que eu tô aprendendo que a vida pode ser bem diferente do que eu estava vivendo no passado. Mesmo com diagnóstico, a vida pode ser mais leve”, reflete Luciana.

Luciana Furtado acredita que o câncer apareceu em sua trajetória como um chamado para viver. Foto: Arquivo pessoal.

Um recado de cuidado e esperança

Para Luciana, um recado que pode ajudar quem recebe o mesmo diagnóstico é conseguir acreditar na cura, mesmo que o momento seja assustador. “É uma combinação da sua vontade de se curar com a confiança de que tem gente que sabe exatamente o que está fazendo e que está trazendo a melhor alternativa”, explica.

“Não existe uma prevenção, não existe como tomar uma vacina e não ter um câncer de ovário, ou um câncer de mama. Mas existe um tratamento muito capaz e muito competente para colocar o tumor no tamanho que não seja maior do que a nossa vontade de viver”, aponta a publicitária.

Além disso, Luciana acredita que da mesma forma como as coisas boas da vida passam rápido, as ruins também. Para isso, é preciso tentar focar em outros aspectos do dia a dia. “O câncer fica na sua cabeça 24 horas por dia. É preciso tirar um pouco desse tempo que ele domina o pensamento. É uma luta, mas é a luta pela vida”, justifica.

Luciana diz ter certeza que no dia 30 de julho, com o fim do tratamento, estará encerrando um ciclo de muito aprendizado em sua trajetória. “Eu brinco que vai ser um outono e um inverno difíceis. Mas que, na primavera, tudo vai voltar a florescer”, finaliza.

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