The Whale e a gordofobia: o que aprender com esse filme?
Eu sou uma mulher gorda. Sim, gorda! E isso é um adjetivo, assim como magra, alta ou baixa. A palavra gorda precisa ser tirada da categoria de ofensa, urgentemente. Dito isto, vamos falar do filme The Whale (prometo evitar spoilers).
“The Whale” ou “A Baleia” em português, conta a história de um professor com mais de 270 kg com compulsão alimentar. Os 130 minutos do longa acontecem em seu apartamento, indo no máximo até a parte de fora da porta. Charlie, personagem principal, enfrenta diversas situações ao longo da vida que se refletem em trauma, dor e o levam a encontrar na comida algum conforto. Embora seja um filme emocionante, há muitos gatilhos e não é objetivo. Ou seja, quem assistir precisa estar disposto a debater, refletir e avaliar o filme para além do óbvio, para não tirar apenas discursos vazios do longa. O conteúdo é chocante, acredito que intencionalmente já que o diretor é Darren Aronofsky, mesmo de “Mãe” e “Cisne Negro”, entretanto é importante pontuar que tem gordofobia (muita), homofobia e conflitos familiares.
Um grande problema que acontece junto a decisão de assistir “A Baleia”, mas não por conta do filme é que ao me sentar no cinema já me sinto deslocada e não pertencente, porque a cadeira é apertada e desconfortável para uma pessoa gorda com o plus de ter pernas compridas. Depois que o longa começa, alguns pontos também me acionam um “alarme”. Será que em algum momento teremos personagens principais gordos, em filmes desse porte – que concorre ao Oscar – sem serem reduzidos ao seu peso? Brendan Fraser, ator que interpreta Charlie, precisou usar o que chamam de fat suit, uma roupa para transformar uma pessoa magra em gorda nas telas, digamos assim. Traje que por vezes é ofensivo e resulta na repulsa por parte de quem assiste aquele determinado personagem, como Mônica em Friends, Professor Aloprado, no filme “O Amor é Cego”.
Com a parte visual já impactando o público, o personagem começa a falar de si mesmo com autodepreciação e sim, também temos isso na obra dirigida por Aronofsky. Como disse anteriormente, o diretor sabe despertar diversos sentimentos em quem está assistindo suas produções e isso não necessariamente é ruim. O problema é que estamos em uma sociedade que pouco se aprofunda para entender a dor alheia, que pouco se preocupa em ter empatia, principalmente se tratando de peso, já que na cabeça de boa parte das pessoas, “engorda quem quer, quem é relaxado”. Digo isso, porque saindo do cinema, minha esposa e eu vimos duas senhoras conversando sobre a obra e concluindo que o filme fala sobre “o aumento da obesidade no mundo”. Um olhar raso demais para a profundidade do que é apresentado.
A gordofobia e a exclusão na vida real
Trazendo a pauta para o social e para minha profissão, que é assessora de comunicação, é preciso parar de reduzir pessoas gordas a: fracassadas, infelizes, sem saúde e repulsivas. Constantemente nos sentimos penalizadas simplesmente por existirmos, seja tentando comprar uma roupa no shopping, ter medo de sentar em determinadas cadeiras ou não passarmos na catraca do ônibus. Ser gorda não torna uma pessoa menos humana, nem faz com que o dinheiro dela valha menos.
Esses dias vi em um perfil de “fofoca”, do Instagram, o vídeo da Thaís Carla, uma influenciadora muito importante, principalmente para pessoas gordas. No vídeo postado, ela se queixava de não conseguir comprar uma poltrona, já que ela é uma mulher gorda e não cabia confortavelmente nas que provou. Nos comentários muito ódio e repulsa, com mensagens dizendo que se ela emagrecesse caberia, que ela devia comprar uma bacia ou um sofá de 3 lugares só pra ela, que onde já se viu ser daquele tamanho e ainda querer que o mundo se ajustasse a ela. Bom, se vamos comprar algo, minimamente temos que ter a opção de comprar uma coisa que funcione bem, porque nosso dinheiro tem o mesmo valor.
BECCA, VIA INSTAGRAM (@BECCASTURKI): “Eu ressignifiquei a relação com a baleia na minha vida. Eu enquanto pessoa gorda, cresci sendo chamada de baleia de forma ofensiva. Hoje tatuei esse animal lindo e poderoso na minha barriga (gorda) para dizer para todo mundo que tentou me ofender assim que: SIM, SOU GRANDE, PODEROSA, FORTE E INCRÍVEL COMO UMA BALEIA”.
Falo isso, porque senti na pele quando fui procurar minha cadeira de trabalho e também o sofá da minha sala. Pessoas gordas não podem comprar qualquer móvel sem considerar a qualidade e limite de peso. Ainda que façamos os mesmo pagamentos que as pessoas magras.
Eu poderia escrever páginas e páginas sobre gordofobia, sobre corpo gordo, mas para encerrar, quero te convidar, principalmente se você for uma pessoa magra ou padrão, a ter um olhar sem julgamentos, empatia e não sair despejando dietas, ofensas e demais coisas sem ser solicitado.
Nós, pessoas gordas, somos capazes de tudo! Não precisamos de dó, ódio ou sentimentos negativos que piorem a nossa relação (já tão prejudicada pelo padrão) com o nosso corpo. Isso serve também para produtores de campanhas, roteiros e demais ações. Incluam o corpo gordo, mas livre de seus estereótipos, em suas produções.
Somos seres humanos e queremos ser vistos como tal!
Meu nome é Becca Sturki, sou empreendedora e atuo como assessora de comunicação. Sou formada em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda, pós-graduada em Assessoria e Gestão da Comunicação. Sou uma mulher lésbica, gorda e muito orgulhosa de toda minha jornada. Levo meus valores para dentro do meu negócio e luto por uma sociedade mais humana, diversa e inclusiva. Você pode se comunicar comigo por meio do Instagram, LinkedIn ou pelo meu e-mail: becca@beccasturkirp.com.br
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