Claudia Visoni defende hortas urbanas como forma de se aproximar da natureza e valorizar o processo de produção de alimentos
Jornada até as hortas urbanas
A jornalista Claudia Visoni vive o que prega. Carrega compras de supermercado em sacola ecológica, consome alimentos orgânicos e não admite desperdícios. Quando começou sua carreira na comunicação, nos anos 1980, recolhia os papeis que não seriam mais usados na redação e levava para a reciclagem.
Como não havia cobertura específica sobre meio ambiente na imprensa, criou uma coluna na revista Capricho, onde era editora, para falar de ecologia. E nunca mais parou de trabalhar pela causa ambiental. Depois tornou-se agricultora urbana e participou da criação dos movimentos Cisterna Já, Hortelões Urbanos e União de Hortas Comunitárias de São Paulo.
Em setembro de 2012, um dos seus projetos mais conhecidos foi inaugurado: a Horta das Corujas, a primeira horta urbana comunitária da capital, que idealizou com a também jornalista Tatiana Achcar. Nesta conversa, ela mostra como as hortas podem fazer parte da nossa rotina.
Como tudo isso nasceu?
Sou envolvida com o meio ambiente desde que tinha uns oito anos. A mãe de uma colega tinha feito pós-graduação em Ecologia, na Califórnia. Quando voltou para o Brasil, nos explicou que os recursos naturais são finitos e que estamos fazendo mau uso deles. Assim entendi.
Qual é a importância das hortas urbanas?
Elas são uma oportunidade de aproximação com a natureza. As pessoas vivem longe dela, ignorando seus ciclos e funcionamento. Isso gera até problemas emocionais. Quando vivenciamos a natureza – e o contato com uma horta proporciona isso –, mudamos.
Como assim?
A gente começa a entender e fazer parte dos ciclos da natureza. Sabe quando alguém diz: “nossa… já é dezembro e parece que ainda é abril”? Mas para quem está em contato com a natureza, essa frase não faz sentido. Abril só parece dezembro se a pessoa não observa a duração do dia, a temperatura, a posição do Sol. Nessa relação de nos sentir tão próximos, ficamos, até mesmo, amigos das joaninhas e das abelhas e entendemos que ervas daninhas e pragas não existem. O que existem são sistemas desequilibrados.
Quando plantamos nosso alimento, olhamos para ele de maneira diferente?
Costumamos olhar os agricultores como pessoas ignorantes, porque muitos não tiveram uma educação formal. Tendemos a achar que somos inteligentes e os agricultores não. Mas quando plantamos, acabamos vivendo a rotina do agricultor e passamos a entender que essa atividade é muito arriscada (pode acontecer uma seca, uma inundação, chover granizo, perder toda a colheita). E, a partir de então, começamos a ter uma atitude de humildade porque descobrimos que há conhecimento ali que não é fácil adquirir.
Percebemos que é algo que demanda muito física e mentalmente e começamos a valorizar aquilo que vem da terra. Vivemos numa época em que todo mundo busca o alimento mais barato possível, mesmo que esteja cheio de agrotóxicos, tenha causado uma devastação ambiental e contaminado o agricultor.
Então não enxergamos que aquele dinheiro foi economizado na base da exploração do outro e da natureza. Essa conta quem paga somos nós mesmos, na medida em que o desmatamento provoca mudanças climáticas. E quando consumimos alimentos ultraprocessados e industrializados, a nossa saúde vai para o beleléu. O dinheiro que economizamos ao não comprar um alimento orgânico vamos gastar em remédios.
Isso traz mudanças na maneira como vivemos a cidade?
Totalmente. Porque muitas vezes as pessoas que moram principalmente em grandes cidades não conseguem enxergar a natureza ali. Elas vão acumulando tensões e ansiedades, até que um dia concluem que para encontrar a natureza precisam ir para o interior ou para a praia. Nós, que trabalhamos com agricultura urbana, não precisamos viajar para isso. Encontramos o verde todos os dias.
Como surgiu a ideia de criar hortas urbanas?
Surgiu numa conversa dentro do grupo Hortelões Urbanos, em 2011. Como havia várias pessoas que moravam na região de Pinheiros/Vila Madalena, resolvemos fazer a horta na Praça das Corujas.
A horta foi bem recebida pelos moradores?
Por alguns, sim. Por outros, não. Naquela época não existiam hortas comunitárias em São Paulo. As pessoas nem tinham um repertório para entender o que estava acontecendo. Havia gente que achava inadequado o uso do espaço público, falavam que estávamos estragando a praça. Uma pessoa veio falar comigo e disse que cidade não era lugar de plantar. Além disso, a agricultura urbana existe há dez mil anos e 20% dos alimentos do mundo são produzidos nas cidades.
Como é esse espaço?
Tem 800 metros quadrados e cerca de 200 espécies, a maioria plantas alimentícias não convencionais e plantas medicinais. Bem como um meliponário, uma coleção de colmeias com cinco espécies de abelhas sem ferrão, e uma composteira. Qualquer um pode entrar.
Como podemos trazer o verde para perto?
Plantando árvores nas calçadas, transformando o jardim de casa ou o do condomínio em uma pequena floresta urbana em vez de ter um jardim baseado em plantas ornamentais que não atraem abelhas ou passarinhos.
Os comentários são exclusivos para assinantes da Vida Simples.
Já é assinante? Faça login