A criança interior ferida representa uma série de comportamentos, estímulos e tratamentos pessoais que dialogam com a identidade e a própria saúde mental de um indivíduo. As relações familiares, os ensinamentos a partir da convivência com os pais e as experiências, sejam elas boas ou ruins, contribuem para a construção do inconsciente humano. Situações como se colocar em posição de ajuda extrema ou tentar “salvar” a vida de alguém, dificuldade em dizer não e se responsabilizar pelas emoções dos outros são sintomas desse comportamento.
“Mesmo que as experiências de insegurança e rejeição da infância tenham sido reprimidas ou que o adulto as diminua para si mesmo, no dia a dia fica evidente que a confiança básica dessas pessoas foi comprometida”, explica Stefanie Stahl. Autora do livro Acolhendo sua criança interior* (Sextante), ela propõe uma série de exercícios e estímulos que buscam conectar o indivíduo à resolutividade de seus traumas da infância.
Sinais que indicam uma criança interior ferida
“Quando falamos dessas influências da infância – que, junto com os fatores hereditários, definem grande parte de nosso modo de ser e nossa autoestima –, estamos falando de um componente de nossa personalidade”, acrescenta. Na obra, a psicoterapeuta destaca alguns sinais que ajudam a identificar que sua criança interior está ferida:
- Problemas relacionados à autoestima;
- Insegurança e receio com parceiros amorosos;
- Dificuldades para se relacionar;
- Nutrir a esperança de que os outros transmitam sentimentos de segurança, proteção e pertencimento;
- Procurar um lar no parceiro, nos colegas de trabalho, em um esporte ou no consumo.
Como cuidar da sua criança interior
A “criança interior” se refere à soma de todas as experiências e memórias que acumulamos durante nossa infância, incluindo tanto momentos positivos como negativos, que foram influenciados principalmente por nossos pais e outras pessoas significativas em nossa vida naquela época. Essas lembranças moldam nossa perspectiva e emoções ao longo da vida adulta.
Para a psicanalista e especialista em psicopedagogia Thais Basile, o acolhimento exerce um papel de se entender, buscar validação e se legitimar diante do que ocorreu no passado. “Ele tem também um grande trabalho em reconhecer partes de si que são as vozes dos pais atuando no presente e os papéis a que fomos submetidas operando no agora”, destaca.
Autora de Nossa infância, nossos filhos* (Matrescência), Basile explica que o caminho não é fácil e depende das experiências individuais de cada um. “Pode ser difícil acolher a repetição destes padrões de se colocar para baixo, de se punir, de se sabotar, mas leva algum tempo para elaborar o que vivemos, pra negociar com todos os nossos sintomas”, afirma.
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Visualize os obstáculos na vida adulta
Como escreveu Drummond, há sempre uma, ou várias, pedras no meio do caminho. Pularemos algumas, tropeçaremos em outras e há aquelas tão pesadas que é preciso mudar a rota. “A pergunta ‘O que me impede de…?’ frequentemente é útil se você notar qualquer resistência. O que me impede de querer explorar? O que me impede de reconhecer a dor?”, sugere Vienna Pharaon, autora do livro Curando suas feridas de origem* (Sextante).
Para a terapeuta estadunidense, o que ocorre na infância é capaz de estabelecer quase tudo na vida adulta. “É imperativo que olhemos para os sistemas familiares em que crescemos para explorar a educação que recebemos em torno da comunicação, limites, conflitos, autoestima, intimidade e além”, explica em entrevista por e-mail à Vida Simples. Esse é o plano que estrutura a vida, por isso, coisas mal ou não resolvidas no passado guiarão os comportamentos.
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Curar a criança interior é possível?
Thais Basile lembra que a família, quem orienta e fortalece vieses, estigmas e comportamentos, não é uma instituição solta no universo. “Ela tem um contexto, repassa valores e objetivos que o caldo cultural ensina a ela. No entanto, assim como a escola, a família precisa ser um local de contraponto aos adoecimentos e não de repasse deles”, explica a psicanalista. Apesar de todas as feridas que foram provocadas, revividas ou possuem uma difícil cicatrização, alguns caminhos podem ser seguidos. Mas eles não são lineares.
“A cura não é estática, e não depende da gente ‘excluir’ nossos sintomas (isso muitas vezes nem é possível), e sim de estar mais cientes deles, talvez negociando o tamanho do protagonismo deles nas nossas vidas, inventando novas maneiras de lidar com o que fizeram de nós”, destaca Thais Basile.
Quais eram suas necessidades não atendidas na infância?
Para Vienna Pharaon, embora também não acredite em uma cura linear no estilo receita de bolo, há ideias interessantes em seu livro. Por isso, ela apresenta um processo de cura em quatro etapas na obra que guia o leitor a identificar suas feridas. Testemunhar a si mesmo e sua dor, lamentar e então fazer uma mudança de direção fazem parte da estratégia.
Ela sugere que uma pergunta simples que recebeu de um terapeuta, mas profunda, seja feita com o objetivo de investigar sua infância: “Do que você mais precisava quando criança e não recebeu?”, questiona. “Veja se consegue realmente se conectar consigo mesmo e reconhecer o que você gostaria que fosse diferente. Além disso, abra espaço para a resposta”, conclui.
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