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    Por que o Brasil está vivendo um “boom” da terapia?
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    Era setembro de 2019 quando decidi dar um passo que, na altura, sentia muito medo. Entrei na terapia. Havia receio, ainda não entendia bem como funcionava o processo, mas abracei a ideia com muito carinho. Fato é que não estou sozinho, milhões de brasileiros abriram mão do preconceito e entenderam que a psicoterapia é um serviço necessário para viver de forma plena e com propósito.

    Mas o número ainda é baixo. Apenas 5% dos brasileiros afirmam realizar terapia de forma contínua no Brasil, segundo uma pesquisa do Instituto Cactos em parceria com o Atlas Intel. 19% até já passaram por algum tipo de atendimento, mas se resumiu a encontros pontuais. Por outro lado, 60% das pessoas que fazem terapia afirmaram ter começado durante a pandemia, de acordo com o Instituto FSB.

    O “boom” da terapia não se explica por uma única via, mas sim um conjunto de fatores que determinam uma mudança cultural no Brasil. “Um deles pode ser a crescente conscientização sobre saúde mental e bem-estar emocional na sociedade contemporânea”, diz a psicanalista e Terapeuta Cognitivo Comportamental Patricia Strebinger. Para a especialista, as pessoas estão cada vez mais dispostas a buscarem ajuda psicológica para lidar com os desafios emocionais.

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    Segundo Patricia Strebinger, isso se dá porque boa parte da população está mais preocupada com o autocuidado e desenvolvimento pessoal. “Além disso, a diminuição do estigma associado à terapia e a ampliação do acesso a informações sobre seus benefícios também podem ter contribuído para esse aumento no interesse”, destaca.

    Já a psicóloga clínica Tatiane de Sá Manduca lembra que houve um processo histórico por meio da literatura, da virtualidade e do conhecimento que levou à uma maior democratização do acesso à saúde. Antes disso, muitas pessoas naturalizavam o sofrimento. Nossos pais, avós e familiares com maior idade costumavam “engolir o choro” e não desabafar sobre as notas mentais que se formavam ao longo do tempo.

    Outro fator relevante é o adoecimento mental em decorrência das jornadas longas de trabalho. De acordo com dados da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt), aproximadamente 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a síndrome de burnout. A doença ocupacional passou a ser reconhecida e classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022.

    Tatiane Manduca reforça ainda que há no Brasil uma supervalorização da produtividade e da busca incansável pelo sucesso. “Isso é um alerta para o aumento das patologias atuais de ansiedade e depressão que enfrentamos”, enfatiza.

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    O poder da escuta terapêutica

    A escuta ativa é um dos exercícios mais importantes para fortalecer a saúde mental. Em dias difíceis, não há problema em desabafar com um amigo, colega de trabalho ou familiar. Por outro lado, podemos ser agentes ativos e nos prestarmos a ouvir e compreender a dor do outro. Não precisa ter um conselho ou carta na manga, às vezes a escuta resolve.

    Mas por muito tempo essa prática esteve distante do cotidiano, já que demonstrar força, estabilidade emocional e esconder as fraquezas eram características buscadas. “As pessoas se acomodavam com a dor, por preconceitos arraigados à ideia de que buscar atendimento terapêutico era sinal de ‘loucura'”, explica Tatiane Manduca.

    Para a especialista, a escuta terapêutica possibilita com que as pessoas saiam de uma espécie de clausura que construíram para si mesmas. Eu, por exemplo, não tinha respostas para compreender o que acontecia na época em que busquei a terapia. Um atendimento qualificado, no entanto, me ajudou a perceber que eu sofria com Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC), bastante comum entre os brasileiros.

    A escuta possibilita ainda com que as pessoas validem suas experiências de dor e legitimem os desconfortos. “Mais do que isso, é um espaço aberto para a necessidade de falar de si, falar sobre sua forma de amar, de viver, de se relacionar”, explica.

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    Mudanças culturais também facilitam a procura por terapia

    Hoje, há um grande volume de conteúdos digitais que atuam no incentivo à psicoterapia. Existem perfis nas redes sociais dedicados a desmistificar questões sobre o tema, relatos de pacientes, programas de TV especializados em debater temáticas relacionadas à saúde mental e podcasts que agregam conhecimento sobre a questão.

    “Esse conteúdo, no entanto, nem sempre é válido para todos, porque há situações objetivas e subjetivas“, diz Tatiane de Sá Manduca. Para a especialista, há ideais imaginários, uma cultura de idealização e “lacração” para obter a saúde mental.

    “A internet e os ideais impostos, somados às 7 dicas para o sucesso, funcionam também de forma tirânica, incitando ao pertencimento pela via do consumo”, acrescenta a psicóloga. Isso ajuda a idealizar, por exemplo, os comportamentos em alta nas redes sociais, o que pode gerar frustração, esgotamento, angústia e inibição.

    Alternativas complementares

    “Ninguém passa pela vida sem dor ou sofrimento”, explica Tatiane Manduca. Segundo a especialista, isso faz parte da vida de todas as pessoas. “A idealização do passado nos leva a sermos saudosistas, mergulhando na ideia de que no passado era melhor”, diz a psicóloga. Mas há alternativas e estratégias complementares à terapia que podem contribuir para que a jornada da vida seja mais leve.

    Para Patrícia Strebinger, isso pode incluir práticas de autocuidado como meditação, mindfulness, exercícios físicos, escrita terapêutica, grupos de apoio e leitura de livros de desenvolvimento pessoal.

    “Embora essas alternativas possam não substituir completamente a orientação de um terapeuta qualificado, elas ainda podem fornecer recursos importantes para o crescimento pessoal e o enfrentamento de desafios emocionais”, afirma. 

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