“4.500 habitantes, duas padarias, pouquíssimos restaurantes, nenhum semáforo, uma sorveteria e pessoas que carregam nomes e histórias!”. É assim que Fabiane Ferreira descreve o pequeno distrito de São Francisco Xavier. Com 131 anos de história, a região é parte do município de São José dos Campos e desde fevereiro conta com a sua primeira livraria, a Casa Nynho, espaço de aconchego, leitura e acolhimento.
O pequeno e charmoso chalé próximo à natureza – e com direito ao som da cachoeira na Serra da Mantiqueira – cede espaço para livros e narrativas. O ambiente, que abriga em torno de quatro pessoas simultaneamente, permite o contato com as cores, obras e as potencialidades do espaço.
“O meu desejo é que as narrativas de livros que me são tão importantes se entrelacem às narrativas de vida de quem passar pela Casa Nynho”, explica Fabiane, ou Fabi, como é conhecida entre amigos e moradores do distrito.
Mudança de ritmo e tempo
Paulista da “gema”, Fabi nasceu e cresceu na zona leste de São Paulo, estudou Pedagogia e ama trabalhar com educação. Seu sorriso e entusiamo não negam a afirmação anterior. Mãe do Pedro, 11, um filho que a vida deu à educadora, ou melhor, “ele me escolheu”, explica.
A mudança de rota na vida de Fabiane ocorreu com o início da pandemia da Covid-19, momento de isolamento físico e apreensão sobre o futuro. Viver na maior cidade da América Latina, por mais confortável que sua casa pudesse ser, trouxe inquietações sobre a vida que Fabi vinha levando.
Decidiu migrar com a família – Pedro e o marido – para São Francisco Xavier. Entre idas e vindas, deslocava-se entre a roça e a capital paulista enquanto trabalhava em home office, uma forma de ter um respiro enquanto ainda tomava decisões.
Toda a intermediação foi possível depois de alugarem uma casa no distrito e as várias insistências do Pedro. Ele defendia mais espaço para respirar, brincar e, no fim, viver a vida em tranquilidade. Fabiane percebeu naquele espaço a oportunidade de ter uma maternidade mais presente, sem a correria do trânsito e trabalho na capital.
“Eu passo a não me adequar mais à realidade de São Paulo. Olhava para aquele monte de concreto e pensava ‘gente, mas não é isso que eu quero’”, destaca Fabi.
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Gestando um projeto
As mudanças, apesar da rapidez que vivemos hoje, exigem planejamento. Tempo necessário para a decantação das ideias. Aliás, foram dois anos e meio até Fabiane fazer toda a transição de carreira. Precisou encerrar a sociedade da empresa que administrava, vendeu o apartamento que tantou sonhou, mas que não fazia mais sentido mantê-lo naquela altura. Decidiu mergulhar de vez e se estabelecer na Serra da Mantiqueira.
“As pessoas me perguntam: ‘você mudou de cidade?’ E eu respondo: ‘não gente, eu mudei de vida‘”, brinca Fabi durante a entrevista. Apesar da mudança ainda ser recente, ela explica que sua alma e coração já estavam em São Francisco Xavier desde dezembro de 2021.
“Foram dois anos e meio gestando as relações, em um outro ritmo e tempo, construindo prosas diárias com a Serra da Mantiqueira que me rodeia“, conta a educadora. Agora, é tudo novo, o sotaque, o ritmo da cidade, a oportunidade de conhecer e cumprimentar as pessoas, ouvir as histórias, se sentir viva e poder ser tocada por ela fora do piloto automático.
“Tempo para colocar o outro dentro de nós. Tempo para gestar, sem pressa, para espiar as brechas que buscam por novas possibilidades. Tempo para ter. Tempo para ser.”
Casa Nynho
Assim, com Y mesmo, e não é por acaso. O nome nasceu a partir de um sonho que a Fabi teve durante a noite, decidiu, então, batizar o espaço com essa expressão aconchegante. No entanto, o Y veio por conta da numerologia, algo importante para a educadora e que dá um toque especial ao lugar. Além disso, a ideia de montar o negócio foi impulsionada depois de ler a reportagem “Pausa nas entrelinhas” (edição 245), que conta as histórias de pequenas livrarias pelo Brasil.
“Em um ato de coragem, ousadia e honra aos sonhos que me habitam, abri a livraria Casa Nynho“, conta Fabi. No entanto, apesar de ser um negócio, ela explica que o espaço funciona como um lugar de conversas, apreciação, leitura coletiva e visitas ao ambiente. Tem escrito sobre isso em uma espécie de diário de bordo. Afinal, nem sempre as pessoas da região andam com condições financeiras para adquirir uma nova obra. Por isso, o desejo da educadora é que o dinheiro não seja uma limitação à visitação.
Para quem chega ao espaço, se depara com o “Galo leitor”, que cedo acorda para anunciar as novas atividades. Além disso, Clarice, a menina/ estátua, acompanha os transeuntes que passam pelo local. “O som da cachoeira se esparrama nas palavras lidas por mim aos visitantes e batatas doce crescem em gaiolas abertas para nos mostrar que a vida pode ser mais brincante”, conta Fabi.
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