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Gêmeos, cobiçada semelhança
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Acho gêmeos idênticos fascinantes e mesmo os que nasceram juntos mas são diferentes, me parecem invejáveis. Nas gestações os cobiçava, além de que gosto de imaginar como seria ter tido filhos assim. Não creio que ninguém seja capaz de níveis tão profundos de cumplicidade quanto os ditos ?vizinhos de útero?, mas igual me pergunto por que eles capturam meu olhar desse jeito. A curiosidade que suscitam diz mais sobre os que nasceram sozinhos, do que dos gêmeos. Na verdade, corresponde a fantasias que temos sobre o amor perfeito. Sempre nos chateamos quando o outro, seja amado, parente ou amigo, revela o quanto nos desconhece, assim como que não nos escuta ou nos abafa. Achamos que se tivéssemos alguém que vive tudo ao mesmo tempo e nasce com as mesmas armas, seríamos finalmente completos. Tive duas colegas de jardim de infância que eram iguais, lindas, loiras, usavam grossas tranças e a mesma roupa. Nas fotos que ainda possuo, elas aparecem como uma espécie de moldura, decorativas, equidistantes, tratadas como cenário. Poucos sabiam seus nomes próprios, tanto que não os encontro na memória. Atendiam por ?gêmea?, a denominação as rotulava de metade de alguém. Os irmãos idênticos são objeto de um anedotário específico, muito mais imaginário que real. Há histórias de travessuras clássicas, trocando-se nas provas, nos encontros amorosos, criando truques para driblar a vigilância dos pais. Eles de fato se entendem e é tocante a forma como se mimam. Acostumados a dividir colos, aniversários e olhares, gêmeos complementam com mútua atenção os eventuais descuidos que possam ter sentido. Afinal, a cria humana costuma ser única, não chegamos em ninhada. Porém, quem é pai ou irmão deles, testemunha o enorme esforço que eles fazem para construir uma identidade, quando tudo converge para a indiferenciação. A imparidade, tantas vezes interpretada como falha no amor, vem bem. Eclipsados pelo egoísmo, ignoramos isso e passamos a vida buscando uma ?alma gêmea?, alguém que nos amasse como só nós mesmos seríamos capazes de fazê-lo.

Santa ignorância: o ?duplo?, na literatura, não é uma figura romântica, é uma das representações do terror. Ver-se espelhado, mas numa imagem que se movimenta autônoma, alheia à nossa vontade, é assustador, irritante. Longe de ser belo, é sinistro e produz agressividade, tentativa de controle. Na ficção, quem encarou seu duplo não conseguiu controlar o impulso de supressão daquela cópia. Não há narrativa literária em que ambos terminem vivos. Sentimo-nos incompletos, mas não será o amor que nos curará dessa insuficiência: o outro nunca é a parte que nos falta, nem tampouco somos a dele. Não adianta parecer-se, suprimir as diferenças e a vida pessoal, fazer tudo junto. Já nascemos chorões, reclamando uma ausência de aconchego que nunca deixaremos de sentir. Pobres gêmeos, deve ser muito duro ter que arcar com esse olhar curioso, herdeiro do luto por essa metade inexistente.

DIANA CORSO é psicanalista e autora do livro Tomo Conta do Mundo ? Conficções de uma Psicanalista.

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