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    Diário é uma ferramenta para o autoconhecimento
    Começar um diário leva a uma jornada por memórias, emoções e conhecimento (Foto: Daria Shevtsova/Unplash)
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    Julia Nunes está sentada ao lado da avó, Elza, e lê um livro antigo, com a capa desgastada e amassada. Em letras cursivas, está registrado em suas páginas o relacionamento de um casal, desde os primeiros meses de namoro até o casamento.

    Nas mãos delas não há um livro qualquer, mas o diário de Elza. Enquanto a neta lê, a avó escuta e reconhece a história um dia esquecida em virtude da doença de Alzheimer.

    A cena, registrada em vídeo por Julia e publicada em suas redes sociais, mostra a potência de um diário como uma ferramenta para guardar lembranças. Além do registro, escrever um diário pode ser também uma ferramenta na busca do autoconhecimento, de aflorar a criatividade e de se permitir um maior contato com as emoções.

    Para a psicóloga e especialista em escrita terapêutica, Gabi Ribas, a prática de escrever — e assim, registrar pensamentos e sentimentos – é uma forma de entrar em contato com memórias, perspectivas e emoções, o que pode trazer mais entendimento sobre várias ocasiões da vida e também mais bem-estar para quem escreve.

    Escrever diário é um momento de encontro

    Gabi considera ainda esses momentos como uma “forma de autoencontro”. Isso porque o diário é uma prática cotidiana de escrita íntima. Sem a necessidade de publicação daqueles textos escritos à mão, o diário torna-se uma ferramenta para o autoconhecimento.

    “Esse momento pode fazer com que as pessoas entrem em contato com suas emoções e memórias, além de permitir ressignificar suas histórias. Ela nos ajuda também a planejar e a visualizar melhor nossos desejos. A escrita se torna um espelho da nossa mente”, afirma.

    Gabriela Ruggiero Nor, psicanalista e especialista em escrita terapêutica, destaca ainda que parar e escrever com frequência auxilia as pessoas a se organizarem mentalmente.

    Isso ocorre porque, na correria de uma sociedade capitalista e majoritariamente individualista, o fluxo de ideias e pensamentos é acelerado e, frequentemente, eles se sobrepõem.

    “No momento que paramos para escrever, fazemos uma seleção. Quando você escreve no seu diário, você é obrigada a ficar com aquele pensamento ou percepção até terminar de redigir. Quando escrevemos, conseguimos focar em um pensamento ou sentimento por vez, o que difere da concorrência de pensamentos e emoções que temos quando estamos em outras situações”, explica.

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    Diário promove livre expressão

    A psicanalista também destaca que a escrita em um diário é uma forma de se conectar íntima e verdadeiramente com o que está dentro de nós.

    “O papel não julga; ele oferece um espaço onde podemos ser sinceros sem medo de sermos mal interpretados, julgados ou criticados”.

    O diário torna-se, então, um espaço seguro que permite a livre expressão sobre experiências e emoções sem se preocupar com a opinião de outras pessoas — e sem utilizar os filtros e as autocensuras do meio social.

    Para Gabriela, isso é um elemento fundamental na jornada do autoconhecimento, porque permite que as pessoas possam ter acesso de partes de si que não tinham muito contato.

    “O saber mais sobre si vem a partir de um estranhamento. O autoconhecimento é quando começamos a nos estranhar, e com isso a nos questionar. É quando alguma coisa sai um pouco desse script que já é conhecido e cristalizado em nós. A escrita permite isso, porque a interlocução com o papel não vem com preconceitos a seu respeito”, defende.

    Identificando padrões com a escrita

    A escrita é um exercício que permite a reflexão e a identificação de sentimentos e padrões que passam despercebidos. A psicanalista explica que ao escrever livremente, é possível observar padrões de pensamento e até deslizes que revelam associações inconscientes.

    “Quando você se permite escrever sem se preocupar com a lógica, podem surgir imagens e memórias antes esquecidas, por exemplo, fragmentos de sonhos ou lembranças distantes. É aí que reside o potencial da escrita, que nos revela aspectos de nós mesmos que estavam ocultos”, explica.

    E não só ao escrever, mas ao fazer a leitura do que foi escrito, é possível descobrir novos fatos sobre si, além de perceber a evolução de sentimentos e repetições importantes.

    Como começar a escrever um diário

    Como todo hábito, escrever um diário necessita constância. Gabi Ribas recomenda começar com simplicidade e adotar métodos, formatos e frequência que façam sentido.

    Ela incentiva que as pessoas experimentem, testem diferentes formatos e horários até encontrar uma prática que funcione de forma natural.

    Isso inclui escolher o horário para a escrita e também como ela vai ser feita — de forma guiada com algum material, seguindo um fluxo de pensamentos ou temática, como um diário de gratidão ou de viagem. Também vale ponderar o que é mais confortável: escrever no papel ou digitar.

    Ela destaca, sobretudo, que a prática não substitui a terapia, mas que pode facilitar e complementar o processo.

    Como começar a escrever um diário

    Há diários de deferentes formas. Um formato é o de páginas matinais, técnica idealizada pela escritora Julia Cameron. Ela descreve o modelo em seu livro O caminho do artista.

    Basicamente, o caminho do artista consiste em escrever três páginas inteiras todas as manhãs, logo ao acordar. O objetivo é deixar os pensamentos fluírem — e a caneta também — e escrever de forma livre, sem filtro e censura.

    Segundo a autora, o exercício permite organizar ideias e liberar emoções para iniciar o dia com mais leveza e foco.

    Além dele, há outros formatos, como fazer lista de gratidão, descrever o dia ou uma viagem. Não há um formato certo ou errado, o ideal é escolher o que mais se encaixa na rotina e traz bem-estar.

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